O Brasil já foi um exemplo de combate ao desmatamento da Amazónia, mas a crise política está a transformar a maior floresta tropical do mundo numa moeda de troca usada pelo Governo para conseguir apoio político, alertam ambientalistas.

Os ativistas afirmam que, para aprovar reformas de austeridade e bloquear o avanço do processo judicial que o indiciava num esquema de corrupção revelado por executivos da multinacional JBS, o Presidente do Brasil, Michel Temer, negociou projetos de redução da proteção ambiental em troca de apoio.

Estes acordos foram firmados com os ruralistas, um poderoso grupo de parlamentares ligados ao agronegócio que quer ocupar áreas da Amazónia.

“Desde o início do Governo Temer, houve uma aliança com a bancada ruralista (…) o meio ambiente foi colocado como uma moeda de troca para ele conseguir fazer as reformas que gostaria”, afirmou à Lusa Cristianne Mazzetti, coordenadora da Campanha pelo Desmatamento Zero da organização não-governamental Greenpeace no Brasil.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Agora, “o meio ambiente foi também usado para Michel Temer escapar da denúncia de uma corrupção, arquivada a pouco mais de um mês no Congresso”, acusou a coordenadora do Greenpeace.

Investigador fala em floresta que é “alvo para a destruição”

Heron Martins, investigador do Imazon, uma organização que trabalha pela proteção da Amazónica, lembrou que uma das negociações feitas pelo Governo com os representantes políticos do agronegócio é um projeto de lei que pode baixar a proteção 350 mil hectares ou o equivalente a 27% da área da Floresta Nacional do Jamanxim, no Estado do Pará.

“A Floresta do Jamaxim fica no Pará, Estado brasileiro que lidera o desmatamento. Ela foi usada como moeda de troca já que esta proposta de rebaixar sua classificação de proteção que foi enviada pelo Governo e permitirá a atividade humana na área, tornando o lugar um alvo para a destruição”, afirmou.

No que respeita ao caso da Floresta do Jamanxim, a coordenadora do Greenpeace também criticou as mudanças enviadas ao Congresso.

“Temer lançou esta medida provisória para diminuir a proteção do Jamanxim e de outras florestas na região do Pará, mas depois vetou os projetos porque estava para fazer uma visita oficial à Noruega, o país que mais financia atividades de conservação na Amazónia”, disse.

“Ele vetou a proposta e semanas depois apresentou outro projeto de lei com quase o mesmo teor. Isto mostra uma desmoralização da política pública de combate ao desmatamento”, completou.

Desde que foi criado em 2008, o Fundo Amazónia já recebeu 2,8 mil milhões de reais (760 milhões de euros), 97,5% desse valor proveniente do Governo da Noruega.

Outro caso considerado alarmante pelos ambientalistas foi a recente publicação de uma lei que amnistiou ocupações de até 2 500 hectares realizadas ilegalmente até 2011 na Amazónia. Esta lei ganhou o apelido de “MP da grilagem” no Brasil.

Cristianne Mazzetti considera que a lei foi outro mau sinal dado em relação à política pública governamental de proteção da Amazónia, já que favoreceu grandes proprietários de terra que se apropriam de zonas de proteção em florestas.

“Pessoas que invadiram terras públicas vão conseguir a regularização. A área que pode ser regularizada aumentou para 2.500 hectares. Isto mostra que a amnistia é para grandes e médias propriedades, não para os pequenos produtores que sempre viveram no local e não tinham o título de propriedade como justificou o Governo”, salientou.

Já Heron Martins, do Imazon, alertou que a redução da proteção na Floresta do Jamanxim e a amnistia não são casos isolados, mas exemplos do que será a regra no que da política pública ambiental até pelo menos 2018, quando o Brasil terá novas eleições.

“Cerca de 44% do Congresso é dominado pela bancada ruralista. Estive em Brasília e ouvi de muitos políticos que qualquer projeto de lei que vise a proteção ambiental será barrado, enquanto projetos para diminuir as áreas de proteção devem passar”, concluiu.