“Fazemos o vinho que as uvas dão”, diz Artur Meleiro sentado à mesa de um restaurante lisboeta. A viagem foi longa para aqui chegar: seja pelas horas de carro que separam Melgaço, na região dos Vinhos Verdes, da capital, seja pelo tempo e vontade investidos num negócio que agora começa a dar que falar. A afirmação de quem cresceu rodeado de uvas e de lagaradas significa que este produtor dá importância máxima ao terroir. Meleiro é, em conjunto com um sócio, o nome por detrás das marcas Valados de Melgaço e Quinta de Golães.

O homem que foi consultor de gestão durante mais de 20 anos fez carreira longe das vinhas e das adegas, mas a paixão esteve sempre lá. Artur ainda se recorda dos inúmeros golpes nos dedos, em criança, de cada vez que cortava com uma tesoura os cachos das videiras. Frescas na memória estão também as muitas vezes que tirou férias, da escola e do trabalho, para participar na vindima.

Contextualizemos: Artur Meleiro nasceu na Quinta de Golães, cravada numa encosta em Melgaço, a 800 metros do rio e a 150 metros de altitude. Desde os tempos do avó que o negócio é a venda de uvas tintas e brancas a granel. De tanto ver os rebentos das videiras a abandonar a propriedade, pai e tios começaram a “conspirar” um vinho de feitura própria. Anos depois, é Artur quem, em conjunto com um primo e sócio, concretiza o desejo enraizado na família.

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“O meu pai ainda mantém o negócio. Vende uma parcela a uma adega cooperativa e o resto a mim.” Nem de propósito, Artur faz vinho com as uvas do pai, do tio e de uma dúzia de produtores na região, todos escolhidos a dedo. E das muitas castas autóctones, é o alvarinho que ocupa lugar de destaque neste coração enófilo. A Valados de Melgaço, que dá nome aos vinhos monocasta Alvarinho, é também o nome da empresa, da qual faz parte a marca Quinta de Golães (diz respeito aos vinhos que nascem da parcela de quatro hectares inserida na propriedade onde Artur nasceu). Os vinhos, diz o produtor, são “secos e minerais”.

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Ao todo existem quatro referências: Quinta de Golães branco e tinto (o rosé está por chegar) e Valados de Melgaço Alvarinho Reserva e Espumante Alvarinho (os vinhos Valados de Melgaço usam 30% das uvas da Quinta de Golães). Os vinhos — cuja enologia está a cargo da dupla José António Lourenço e Fernando Moura — estão no mercado há quatro anos, tempo suficiente para figurarem, a título de exemplo, na garrafeira do hotel The Yeatman.

“Natural é uma atitude”

Os vinhos naturais têm vindo a ganhar mais expressão, mesmo que envoltos em alguma polémica, mas é possível que ainda soe estranho falar em vinho vegan. Os rótulos assinados por Artur Meleiro — sejam eles Valados de Melgaço ou Quinta de Golães — dizem respeito a vinhos vegan por não terem, na sua composição, quaisquer produtos enológicos feitos com proteínas animais (falamos, a título de exemplo, de adubos e fertilizantes, mas também de proteínas e leveduras adicionadas em determinadas fases, como na fermentação ou na estabilização do vinho). “Em Portugal, este não é um conceito familiar. Mas não podemos dizer o mesmo nos países nórdicos ou no Canadá”, explica.

O produtor identifica-se também com o movimento dos vinhos naturais. A aproximação da agricultura biológica é clara, mas não total: as videiras continuam a ser protegidas das pragas, o que exige a utilização de pesticidas que a lei, do ponto de vista biológico, não permite.

A intenção não passa (nem passará) por assegurar uma produção a larga escala. Artur gosta de nichos e é a esse mercado que quer corresponder. Há receio de, aumentando o volume, perder o controlo da qualidade. A dedicação ao alvarinho, sobretudo, vai de encontro a essa exigência, não fosse esta “uma casta com muito potencial, gastronómica e de pouca produção”. É que, nas palavras de Artur, “é fácil fazer um bom vinho, mas é difícil fazer um bom alvarinho”.