Foram 49 minutos de discurso, meia hora deles a criticar o Governo e os partidos de esquerda que o suportam no Parlamento. Pedro Passos Coelho encerrou a Universidade de Verão do PSD a falar de um país em que “os que menos têm são muitos e os que têm muito são muito poucos” e a deixar inúmeras críticas à forma como o Governo reage aos que não pensam da mesma forma, defendendo as declarações de Cavaco Silva e de Paulo Rangel no evento dos social democratas.

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“Muitas das reações a várias intervenções aqui feitas foram intolerantes, diria incompreensíveis nos tempos que vivemos, dentro da cultura democrática que é a nossa. Como é possível que alguém possa indignar-se com o ex-Presidente da República quando resolveu dentro do seu exercício cívico analisar a situação portuguesa e europeia e apresentar a sua visão critica da política? Não tem direito a exprimir a sua opinião? Tem logo de ser o ressabiado? O que precisa de palco? Não podem tomar o que disse pelo valor do que disse e contraditá-lo? Porque se procura desqualificar a pessoa como se ela n tivesse direito a opinião, ainda para mais bem fundamentada…”, acusou Passos Coelho, dizendo que o mesmo vale para as palavras de Paulo Rangel, que ligou os cortes orçamentais às mortes do incêndio de Pedrógão Grande.

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Passos afirmou que “esta não é uma forma madura de discutir nem de viver a democracia”. “É mais fácil chamar mentiroso do que desmontar a mentira, em particular quando ela corresponde à verdade.”

Sim, um Estado salarial

O líder do PSD virou-se depois para as contas e pegou na ideia já deixada por Paulo Rangel durante a semana: a de que o Governo privilegia os salários em detrimento dos serviços públicos. “O governo escolheu dar prioridade à recuperação salarial em detrimento da necessidade de manter o mínimo de qualidade dos serviços públicos, nomeadamente a segurança interna, a proteção civil, a justiça, a defesa, mas também a saúde, a educação, a ciência, a investigação, tudo áreas onde o Governo gastou menos do que o governo anterior, que tanto criticava por gastar menos”, explicou Passos, que exorta o Executivo a assumir publicamente que fez esta escolha. Explica o líder social-democrata que não o faz porque quer manter a narrativa de que houve “enorme austeridade no período anterior” apenas e só por motivos eleitoralistas.

E acusa mesmo o Governo de António Costa de “falta de pudor” no que às mudanças no IRS diz respeito. Passos voltou a dizer que o governo PSD/ CDS devolveu mais de 400 milhões de euros em IRS às famílias, enquanto que o Governo e os seus parceiros apenas estão a pensar devolver 200 milhões.

“O nosso era péssimo, este que vai pela metade é ótimo. Não haverá ninguém que se escandalize um bocadinho com esta falta de pudor?”

“A geringonça funciona, há estabilidade política”

Explicando por que razão recusou um pacto de regime sobre as obras públicas proposto pelo PS — “só depende do PSD para o que é secundário” — Passos Coelho desafiou o Governo a ter um plano estratégico nas áreas que verdadeiramente interessam ao país: saúde, educação, justiça, segurança social. Até porque: “São tantas as condições boas para que o Governo possa preparar alguma coisa com sentido estratégico que é legítimo perguntar: porque não o faz?”, questiona o líder da oposição. Uma delas, salientou Passos, é a “estabilidade política”: “O Governo não se pode queixar de instabilidade política, a geringonça funciona, está lá a apoiar o Governo no Parlamento; [também] não se pode queixar da falta de cooperação do Presidente da República, tem sido permanente e efetiva”.

Portugal precisa dessas reformas, explicou depois Passos, porque é “dos países que representa maior disparidade de rendimentos, maior desigualdade entre aqueles que têm muito e aqueles que têm pouco, sendo que são muitos aqueles que têm muito pouco”. Deu então o exemplo da quase metade dos portugueses que estão isentos de IRS “porque não tem o suficiente”, quando “1,1% dos agregados fiscais gera praticamente 30% da receita” daquele imposto. Serve a argumentação para recusar a ideia do Governo de mexer nos escalões do imposto sobre o rendimento: “E ainda dizem que é preciso aumentar a progressividade fiscal? Estão a falar a sério?”.

A menos de um mês das eleições autárquicas, o líder do PSD não disse uma palavra sobre as eleições para os órgãos do poder local. Mas houve uma referência ao candidato André Ventura, de Loures, acusado de ter proferido declarações racistas quando afirmou que “os ciganos vivem exclusivamente de subsídios do Estado”. Passos fechou o discurso quase como o abriu. A acusar a esquerda de intolerância:

“Não respeitamos a intolerância, não aceitamos o ambiente de intolerância em que só se discute o futuro segundo a perspetiva do pensamento dominante, e segundo o qual quem não pensar como quem está no Governo não é bom português, ou é racista, ou é xenófobo ou é outra coisa qualquer, que eles são useiros e vezeiros em rotular as pessoas”

Por isso, Passos Coelho promete: “O combate que fazemos não é um combate de galos, é um combate de ideias para ajudar a transformar o país”.