A decisão da agência Standard & Poor’s (S&P) de atribuir uma notação de “investimento de qualidade” à dívida pública nacional está a fazer baixar os juros da dívida, nas transações que são feitas entre os investidores às primeiras horas desta segunda-feira. A queda dos juros, para a casa dos 2,7%, está, porém, a ser moderada, já que a saída de “lixo” era esperada — mesmo que a maior parte dos analistas não antecipasse que seria já — e boa parte da descida das taxas nos últimos meses já estava a descontar essa mesma possibilidade.

A expectativa do porta-voz do Partido Socialista João Galamba não está, para já, a confirmar-se. Os juros da dívida estão a descer, mas apenas cinco pontos-base para os 2,74%. Isto apesar de a decisão da S&P ter vindo mais cedo do que muitos analistas previam, porque a agência não chegou, sequer, a atribuir uma “perspetiva positiva” ao rating quando este ainda era de lixo. A notação passou diretamente para o primeiro nível de “investimento de qualidade”, algo que já era previsto pelos investidores, mesmo que não acontecesse já.

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As taxas de juro estão próximas dos níveis de agosto de 2016 mas continuam longe dos valores do início de 2015, em que rondavam os 1,5%.

Mais relevante do que a análise da taxa de juro absoluta, a margem de risco exigida pelos investidores para comprar dívida portuguesa (em comparação com a referência alemã) está em 224 pontos base, quando nessa altura (início de 2015) estava perto de 140 pontos base. Por outras palavras, a taxa de juro alemã é 2,24 pontos percentuais mais elevada do que a portuguesa.

Ou seja, o risco da dívida nacional ainda é 60% mais elevado do que era no início de 2015.

Em comparação com outros emitentes, Espanha tem um spread de risco de 116 pontos base e Itália 163 pontos base, segundo a Bloomberg.

A agência de rating S&P atribuiu na sexta-feira uma notação de qualidade à dívida portuguesa. Desde o início de 2012 que o investimento na dívida nacional tinha recomendação de “alto risco”. Não foi, contudo, de todo inesperado que tenha sido a S&P a primeira a tirar a dívida portuguesa de junk, ou lixo, como se convencionou traduzir em português.

S&P vê situação portuguesa mais "cor de rosa"

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Numa altura em que a Fitch, por exemplo, dizia que o Governo de esquerda estava firme mas que era incapaz de fazer reformas, a S&P escrevia que Portugal “seguia na direção certa”. Os analistas das agências de rating são independentes, mas sempre foi claro nos últimos meses que a S&P tendia a ver a situação portuguesa com maior otimismo.

Desde há vários meses que alguns analistas comentam que a S&P estava a assumir uma visão muito mais “cor de rosa” da situação portuguesa do que as outras duas agências principais, o que alguns analistas diziam não ser alheio o facto de a S&P ser a única das grandes agências a quem o Estado português já não paga (e poderá, possivelmente, voltar a pagar um dia). Em finais de 2013 o governo de Passos Coelho decidiu suspender o contrato de rating com a S&P, uma medida de contenção de custos explicado pelo facto de que, na altura, as três agências (Moody’s, Fitch e S&P) diziam basicamente o mesmo sobre Portugal e não fazia sentido estar a pagar a todas.

A S&P continuou a acompanhar a situação em Portugal, mas em base não-solicitada (tal como a DBRS) e contando com menos informação do que se fosse um rating contratado.

S&P não chega, é preciso que Moody’s também suba o rating, diz presidente do IGCP

Apesar de a decisão da S&P ser muito importante, para que haja um efeito mais claro sobre as taxas de juro, é necessário que mais agências subam a notação. Isto porque o facto de Portugal ascender a “grau de investimento” coloca o país em vários índices importantes de obrigações. Muitos investidores investem não em emitentes específicos mas em índices (da mesma forma que se compram ações de um país, ou, sobretudo, deste ou daquele setor de atividade). Os títulos são comprados seguindo a ponderação de um índice e, portanto, se a dívida portuguesa volta a constar desses índices isso leva a que vários investidores tenham obrigatoriamente de comprar os títulos, pela simples razão de terem de acompanhar o índice.

Ainda assim, neste ponto, há que referir que cada índice tem a sua metodologia: para alguns bastará haver um rating de qualidade para estar no índice (desde que seja de uma destas três principais agências) mas para outros, por exemplo, pode ser necessário duas agências, pelo menos, com rating positivo. Outras, por exemplo, podem fazer uma média ou considerar apenas o melhor ou o pior rating disponível.

Isto significa que ainda poderá ser importante que haja mais agências a subir o rating de Portugal para que este efeito positivo se faça sentir de forma mais notória. Cristina Casalinho, presidente do IGCP, disse ao Público que “para a entrada nos índices de governos é necessário que pelo menos duas agências de rating tenham Portugal em investment grade e normalmente as que contam são a S&P e a Moody’s. Vamos ter de esperar pela decisão de ambas”.

O “rating” saiu de “lixo”. E agora?