Frase feita

“Ele [Paulo Portas] está pouco pelo país, mas eu espero que consigamos articular agendas para estar um dia também comigo” (Assunção Cristas)

Fica bem à líder actual do CDS falar com simpatia do líder pretérito do CDS, especialmente tendo em conta o relevante pormenor de lhe dever a carreira política. Só que frases como esta transformaram-se num lugar-comum, costumando ser interpretadas mais como um cumprimento do que como um compromisso. E ainda bem: Assunção Cristas mostraria inteligência se decidisse não ouvir o que ela própria diz. A eventual entrada do homem de negócios Paulo Portas na campanha iria acrescentar ruído sem somar votos. Assunção Cristas, agora, vale por si — muito ou pouco, veremos no dia 1 de Outubro. Até lá, seria bom que tivesse uma agenda demasiado ocupada para articulações com o passado.

Frase desfeita

“Porque os outros vão à sombra dos abrigos/E tu vais de mãos dadas com os perigos/Porque os outros calculam mas tu não” (José Eduardo Martins)

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O antigo governador de Nova Iorque Mario Cuomo ficou célebre com a frase “Os políticos fazem campanha em poesia e governam em prosa”. Talvez José Eduardo Martins tenha feito uma interpretação excessivamente literal daquilo que foi uma liberdade retórica de Cuomo. Durante a apresentação do programa de Teresa Leal Coelho, o social-democrata leu em voz alta um poema de Sophia de Mello Breyner que supostamente se aplica à candidata do PSD.

O excerto destacado na frase é especialmente infeliz. De facto, Leal Coelho aceitou ser candidata sem fazer “cálculos” sobre os efeitos de uma derrota na sua carreira; e, de facto, tendo em conta que está praticamente sozinha, anda “de mãos dadas com os perigos”.

Mas aquela referência aos “outros” que “vão à sombra dos abrigos” é especialmente problemática tendo em conta quem a declamou. Afinal, José Eduardo Martins optou por ficar “à sombra” de um “abrigo” confortável. Crítico de Passos Coelho, colocou-se numa posição ideal: sendo apenas candidato a presidente da Assembleia Municipal, evitou dar o peito às balas na corrida à câmara e, ao mesmo tempo, ganhou espaço para mais tarde dizer que fez tudo para ajudar o partido mas que a culpa pelo desaire foi da adversária directa de Fernando Medina. Pode dizer-se que foi um bom “cálculo”.

Frase perfeita

“Estamos em condições especialmente favoráveis para promover o diálogo com o Governo” (Manuel Pizarro)

É um clássico das campanhas autárquicas. Pizarro usa uma frase embrulhada para dizer uma coisa terrivelmente simples. Tradução: “Como eu sou do PS e o Governo é do PS, vou conseguir que me dêem uma ajudinha”. Tradução alternativa: “Como Rui Moreira não é do PS e o Governo é do PS, eles vão transformar a vida da câmara num inferno”.

É um argumento interessante porque, se fosse seguido à letra, nas últimas eleições autárquicas Manuel Pizarro deveria ter apelado ao voto no candidato do PSD, tendo em conta que o Governo da época era social-democrata. Mas, nessa altura, não lhe ocorreu.

Crónica. As mulheres são melhores do que os homens e outras frases de campanha