O presidente da Comissão Nacional dos Direitos Humanos (CNDH), Custódio Duma, classifica como “pesada” a média de duas vítimas de linchamento, por semana, em Moçambique. A punição sumária provocou 27 mortes em 2016, segundo dados da Procuradoria-Geral da República.

Em entrevista à Lusa, Duma alerta para o risco de enraizamento de uma cultura de “justiça pelas próprias mãos”.

O presidente da CNDH admitiu que o recurso à violência por parte das populações em Moçambique contra alegados delinquentes pode ser causada pela perceção de que as autoridades são impotentes para travar a criminalidade, encorajando “a justiça privada”.

“Eventualmente, essa [desconfiança em relação às autoridades] pode ser a primeira razão, mas o que acontece é que, depois, transforma-se em cultura“, frisou.

As instituições do Estado e a sociedade civil devem adotar um discurso de encorajamento da população, motivando-a para o recurso às instituições de justiça, porque essa insistência popular junto das entidades estatais acabará por dar resultados, acredita Duma.

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“Penso que com a insistência do próprio cidadão em ir à procuradoria, à esquadra, as situações serão solucionadas. Temos que ter esse discurso de encorajamento para o cidadão ir ao encontro das instituições da justiça e não fazer justiça pelas próprias mãos”, frisou o presidente da CNDH.

A comissão aposta na educação cívica sobre a ilegalidade dos linchamentos e na necessidade de recurso às autoridades para a denúncia de casos criminais.

No final de agosto, o Comando Provincial da Polícia da República de Moçambique em Sofala, centro do país, divulgou que nove pessoas foram linchadas no primeiro semestre na província, anunciando ações de sensibilização da população para pararem com a prática.

Na sua informação anual sobre a atividade criminal no país, divulgada em abril no parlamento, a Procuradora-Geral da República, Beatriz Buchili, lamentou os números.

“Segundo dados estatísticos coligidos, o país registou, no ano de 2016, em média, dois linchamentos por semana. Os números demonstram, infelizmente, que se tornaram uma prática da realidade moçambicana“, afirmou Beatriz Buchili.

Na informação que prestou, a Procuradora-Geral da República indicou que foram instaurados em todo o país 87 processos-crime por linchamentos em 2016 (contra 33 em 2015), tendo sido deduzida acusação em 49 casos.

A magistrada assinalou que o linchamento é um problema social que não pode ser solucionado, primariamente, por ações repressivas, devendo dar-se primazia à prevenção – por exemplo, com a promoção de debates.

“A par da ação penal, a PGR e órgãos subordinados vêm realizando, anualmente ações de mobilização e sensibilização, no intuito de contribuir para o desenvolvimento de atitudes necessárias à prevenção e ao combate deste mal”, concluiu.