Em matéria de emissões poluentes, Bruxelas parecia ter aderido à técnica da cenoura e do pau, para levar os fabricantes de automóveis a respeitar os limites, cada vez mais restritivos, às emissões de dióxido de carbono (CO2). Só que, desta vez, pouparam na cenoura, que não existe, e reforçaram o tamanho do pau, ou pelo menos a sua capacidade de bater forte nos prevaricadores. Quem exceder o limite vai ter de pagar 95€ por cada grama de CO2 emitida acima dele, por veículo vendido. Pode não parecer muito grave para um construtor que produza um reduzido número de unidades, mas para os grandes fabricantes pode representar multas superiores aos mil milhões de euros, uma vez que, quem mais vende, mais paga.

A PA Consulting produziu um relatório que aponta as marcas que deverão ter mais dificuldade em ficar abaixo do limite de 95 g de CO2 previsto para 2021, valor consideravelmente mais baixo do que a fasquia imposta em 2016 e que se cifrava nas 118 g. E a situação está longe de ser risonha, pois dos 11 principais grupos de fabricantes, apenas 4 terão hipóteses de não exceder o limite. Apenas Volvo, Toyota, Renault-Nissan e Jaguar/Land Rover não deverão sentir dificuldades para cumprir o exigido pela União Europeia. Porém, os Grupo VW (Audi, VW, Seat, Skoda, Bugatti e Lamborghini), FCA (Fiat e Chrysler), PSA (Peugeot, Citroën, DS, Opel e Vauxhall), BMW (BMW e Mini), Ford e Daimler (Mercedes e Smart) certamente ficarão acima do valor máximo, incorrendo em penalizações milionárias.

Os grupo de construtores com mais e com menos capacidade de cumprir as metas relativas às emissões de CO2 em 2021

Guerra ao diesel aumenta as emissões de CO2

A necessidade de cumprir os limites impostos pela União Europeia às emissões de CO2 já era conhecida e, de alguma forma, os fabricantes tinham as suas contas controladas. O problema foi o mercado, que repentinamente decidiu passar a adquirir mais motores a gasolina, reduzindo a procura pelos diesel, que emitem consideravelmente menos CO2. Ao reduzir a percentagem dos motores a gasóleo nas respectivas gamas, dispararam as emissões médias da frota de gama marca, e daí à dificuldade em cumprir os limites (e consequentes multas) foi um saltinho.

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Esta redução na procura de motorizações a gasóleo tem a ver em parte com o Dieselgate e as ameaças a este tipo de motores foram sujeitos em várias cidades, mas também está intimamente ligada ao aparecimento no mercado de pequenos motores a gasolina sobrealimentados, capazes de anunciar consumos muito baixos, ainda que nada realistas. Mas sobretudo, foi motivada pela cada vez maior oferta de soluções híbridas, com ou sem capacidade plug-in, elas sim, quando associadas a motores a gasolina a funcionar segundo o ciclo Atkinson, são capazes de verdadeiros milagres no consumo, ultrapassando mesmo os próprios diesel.

Bruxelas sabe que a queda dos diesel é responsável pela parca redução das emissões verificada em 2016, em termos de CO2, tendo a média dos novos veículos sido reduzida em apenas 1,4 g/km, a menor da última década, e daí que incremente a pressão sobre os construtores. O objectivo é que estes se desdobrem em esforços e se reinventem, ou pelo menos reinventem os motores e as formas de armazenar e produzir energia.

A evolução das emissões de CO2 ao longo dos anos, para os diversos fabricantes, bem como os objectivos previstos para dentro de quatro anos e o desvio estimado ao limite máximo

Quem paga a multa maior?

O limite de 95 g de CO2, a impor dentro e quatro anos, na realidade é um valor padrão, que depois é adaptado a cada fabricante, consoante a produção e o tipo de veículos. Só isto explica que as 95 g sejam na realidade 91,1 g para o grupo FCA, mas 103,5 g para a Volvo e até mesmo 132 g para a Jaguar-Land Rover, uma vez que comercializa abaixo dos 300.000 veículos por ano.

Quem vende menos veículos está sempre exposto a multas mais pequenas, como a Ferrari, que em 2013 pagou 1 milhão de euros, penalidade que repetiu em 2015 pelos mesmos motivos, mas desta vez em companhia da Aston Martin. A Volvo é dada como um bom exemplo, pois possui uma gama pequena, mas já com uma série de híbridos, solução que vai continuar a alargar, o mesmo se passa com a Toyota, onde a profusão de motorizações híbridas e plug-in é praticamente transversal a todos os modelos, e até com a Renault-Nissan, aqui não pela vertente dos híbridos – até aqui pouco popular, mas que está condenada a ser incrementada nos próximos anos –, mas sim dos eléctricos, pois este grupo comercializa os modelos alimentados por bateria mais vendidos do mercado, respectivamente o Zoe e o Leaf.

O problema das multas existe para a VW, cuja gama de eléctricos só começa a ser comercializada em 2020 e apenas com o primeiro dos três modelos que tem programado introduzir até 2022, o que não deverá permitir aos alemães fugir a uma multa que se estima em 1,36 mil milhões de euros. É um valor elevado, como seria de esperar do grupo que mais vende na Europa, eles que foram líderes mundiais em 2016.

O grupo FCA, que vende muito menos do que todas as marcas do grupo VW, vai também pagar pela medida grande, esperando-se uma multa de 950 milhões de euros, fruto de estar muito mais atrasado na produção de veículos eléctricos e híbridos, o mesmo acontecendo com a PSA, que em 2016 foi líder nas emissões de CO2, mas que com a descontinuação dos híbridos/diesel, a falta de uma gama eléctrica e híbrida plug-in e a aquisição da Opel/Vauxhall, cujos carros são mais pesados e menos eficientes, vai obrigar a PSA a suportar uma penalização de 786,7 milhões de euros.

Continuando a analisar o top das marcas com multas mais pesadas, na 4ª posição surge a BMW, com uma multa de 430 milhões, seguida pela Ford (307,1 milhões), grupo Hyundai-Kia (283,1 milhões) e a Daimler (Mercedes e Smart) com 126,2 milhões.