Cada vez mais, as incertezas em torno da declaração unilateral da independência da Catalunha concentram-se menos na questão de se ela vai acontecer e mais na seguinte pergunta: quando? Três dias depois do referendo, que o Tribunal Constitucional espanhol considerou ilegal, o calendário começa a preencher-se com possíveis datas-chave para o processo independentista daquela região.

Esta terça-feira, naquela que foi a sua primeira entrevista após o referendo de domingo, o presidente do governo regional da Catalunha, Carles Puigdemont, garantiu: “Vamos declarar a independência 48 horas depois de todos os resultados estarem contados”. Ora, embora não encerre em si nenhuma surpresa — Carles Puigdemont limitou-se a repetir aquilo que diz a lei do referendo catalão, também ela anulada pelo Tribunal Constitucional —, mas não deixa de ser desprovido de importância. Na conferência de imprensa de segunda-feira, a primeira após a vitória do “Sim” com mais de 90% dos votos, Carles Puigdemont pediu “mediação internacional” para poder falar com o Governo de Espanha, não deixando claro se, e quando, queria fazer uma declaração unilateral da independência. Agora, Carles Puigdemont deixou isso claro: “Vamos agir no fim-de-semana ou no início da próxima semana”.

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E o que está a impedir Carles Puigdemont? Segundo o próprio adiantou à BBC, tudo depende da contagem dos votos depositados no estrangeiro. Esse processo, explicou, só deverá terminar no fim-de-semana. Porém, formalmente, e de acordo com o que está contemplado na lei do referendo catalão, a declaração unilateral de independência só pode ser feita após a votação favorável do parlamento regional.

Entretanto, esta quarta-feira, foi anunciado que Carles Puigdemont vai fazer uma comunicação às 21h00 locais (20h00 de Lisboa), onde deverá responder ao Rei Filipe VI, que esta terça-feira disse que o referendo deste domingo foi “inaceitável” e que a Generalitat tem sido de “uma deslealdade inadmissível ante os poderes do Estado”.

Entretanto, esta quarta-feira, Carles Puigdemont foi convocado para falar ao parlamento regional da Catalunha na próxima segunda-feira, 9 de outubro. O pedido foi feito pelos partidos que compõem a maioria independentista do parlamento regional da Catalunha, ou seja, a coligação Juntos Pelo Sim e o CUP, de extrema-esquerda.

Em conferência de imprensa depois da reunião de líderes das bancadas parlamentares catalãs, a deputada da CUP Mireia Boya não deixou margem para dúvidas: “A declaração [unilateral de independência] será feita pelo parlamento”, disse, apontando para que esse gesto acontecesse já na próxima segunda-feira.

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A remar contra este calendário, estão três partidos: o Partido Socialista Catalão (PSC), o Partido Popular Catalão (PPC) e o Ciudadanos.

Da parte do PSC, o presidente Miquel Iceta enviou uma carta a Carles Puigdemont onde lhe pediam que chegasse a uma “resolução democrática do conflito político e institucional em que nos encontramos”.

Mais assertivos e menos diplomáticos para o governo regional da Catalunha foram o PPC e o Ciudadanos. O PPC convocou uma manifestação contra a independência da Catalunha para este domingo, às 12h00 locais (11h00 de Lisboa), na Praça Urquinaona, no centro de Barcelona. O Ciudadanos decidiu associar-se a esta iniciativa.

Xavier García Albiol, líder do partido de Mariano Rajoy na Catalunha, colocou dúvidas sobre o número de feridos no decorrer das intervenções policiais de domingo. De acordo com a Generalitat, houve mais de 900 pessoas que precisaram de algum tipo de assistência médica. “Serão reais esses números de feridos? Claro que houve pessoas feridas, mas também houve polícias feridos e isso não aparece em lado nenhum”, disse. Depois acrescentou que os feridos “devem pedir contas aos que os enviaram para uma situação de tensão: Puigdemont e Junqueras [vice-presidente do governo regional]”.

Da parte do Ciudadanos, falou Carlos Carrizosa, que insistiu naquela que já é uma exigência recorrente do seu partido ao Presidente de Governo: “Temos de pedir a Rajoy que não hesite, que se mexa, que faça algo e esse algo deve ser o que lhe pediu o nosso presidente, Albert Rivera: que aplique o artigo 155 para convocar eleições na Catalunha”. No artigo 155 da Constituição espanhola é prevista a retirada de autonomia a uma região que não cumpra as suas “obrigações” e “ponha em risco o interesse geral de Espanha”.

Ao invocar o artigo 155 — algo que teria de ser aprovado pelo Senado —, o Governo de Mariano Rajoy terá os instrumentos necessários para “dar ordens a todas as autoridades das comunidades autónomas”. Uma dessas ordens poderia ser a convocatória de eleições autonómicas antecipadas na Catalunha.

“Queremos umas verdadeiras eleições democráticas, com garantias e com urnas de verdade”, insistiu Carlos Carrizosa.

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