Ir ver um jogo da formação a qualquer uma das academias dos principais clubes portugueses nos dias de hoje é um verdadeiro choque com aquilo que acontecia, por exemplo, há 20 anos: antigamente, tudo muito no espírito da carolice, viam-se as famílias dos miúdos, os adeptos mais ferrenhos dos clubes e os treinadores e jogadores de outras equipas nas bancadas; agora, a todos esses espectadores “cativos” acrescentam-se os olheiros que trabalham para clubes estrangeiros, num número que seria difícil de imaginar. Esta é a globalização do futebol.

Foi assim que, este verão, a Juventus contratou um miúdo de 16 anos ao Sporting: Rafael Fonseca. Contratado ao Cova da Piedade quando era ainda infantil, o lateral direito e capitão fez todo o percurso entre os Sub-11 e os Sub-16 nos leões, acabando por aceitar a oferta para uma primeira aventura no estrangeiro. E não foi caso único, acrescente-se. Antes, os transalpinos tinham recrutado outros três jovens portugueses: Ricardo Campos, João Serrão e Afonso Freitas, do Benfica, do FC Porto e do V. Guimarães, respetivamente. Mas nem sempre foi assim e aquilo que a Vecchia Signora tenta fazer é corrigir os falhanços que lhe custaram dois Bolas de Ouro.

A esse propósito, o TuttoSport, um dos maiores jornais desportivos italianos, fez manchete com uma extensa reportagem sobre a Academia Sporting, apelidada de “autêntica fábrica de talentos”. Faz referência a Aurélio Pereira, o ‘Senhor Olheiro’ que descobriu os principais talentos leoninos das últimas décadas, explica como funciona a rede com cerca de 400 observadores para detetar potenciais jogadores e ressalva o “investimento maciço em termos económicos e humanos” que se reflete, por exemplo, na presença de dez elementos da formação nos 23 elementos que se sagraram campeões europeus no último ano com Fernando Santos, em França.

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No trabalho, são também abordados dois nomes incontornáveis do clube e que funcionam como principais símbolos, Luís Figo e Cristiano Ronaldo. Dois jogadores que estiveram muito perto de reforçarem a Juventus, adversário do Sporting na Champions esta noite (19h45), mas que rumaram a outras paragens por razões distintas.

Na temporada de 1994/95, Figo, então com 22 anos, teve o seu momento de afirmação total e parecia inevitável a saída de Alvalade (até porque estava à beira de acabar contrato). José Veiga, na altura o empresário da moda na Europa que tinha como cartão de visita as transferências de Fernando Couto e Paulo Sousa para Itália, comandava a operação e, aproveitando a presença de dirigentes da Juventus na Madeira (iam defrontar o Marítimo na Taça UEFA), fica acertado o acordo entre o extremo e a Vecchia Signora de Sousa. Mais tarde, dirigentes leoninos negociaram a transferência com os transalpinos sem Figo saber, o jogador não gostou, deixou de reconhecer o primeiro contrato com a Juve e vinculou-se ao Parma de Couto. Como ambos enviaram a documentação para a Liga italiana, caiu-se num imbróglio tal que o Bola de Ouro em 2000 acabou por mudar-se para… Barcelona. E o que poucos sabem é que, nessa ponta final, a renovação com os leões esteve muito perto.

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O caso de Ronaldo foi bem menos complicado porque acabou por imperar a velocidade de execução do negócio: em outubro de 2002, um olheiro da Juventus veio a Lisboa observar Ricardo Quaresma mas acabou por ficar louco com o avançado, dizendo mesmo na missiva enviada aos dirigentes do clube que estava ali “o melhor jogador do mundo, obviamente depois de Maradona”. Os bianconeri avançaram quase de imediato para as negociações mas, além da parte financeira, queriam assegurar um jogador do conjunto transalpino (até porque Jardel tinha começado a sua curva descendente): Marcelo Salas, que não aceitou sair. As conversas encalharam e o Manchester United foi mais rápido, avançando com 15 milhões de euros em agosto de 2003 depois do encontro particular entre ambos os conjuntos na inauguração do Estádio José Alvalade.

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Curiosamente, o antigo treinador do Liverpool, Gerard Houllier, contou ao Liverpool Echo esta terça-feira que Ronaldo só não reforçou os reds porque havia um teto salarial e o jogador – ou o seu empresário – pediam valores que passavam essa barreira. “Quando o vi no Torneio de Toulon, avançámos logo mas tínhamos um limite em termos salariais. Concordei com essa decisão, porque poderia criar problemas no balneário, e virámo-nos então para outra promessa, o Harry Kewell, por quem pagámos cinco milhões de libras ao Leeds United”, recordou.