Quando chegou à entrevista no Porto Canal, em fevereiro, José Sá vinha com aquele seu estilo habitual: barba longa, braço tatuado, camisola preta, calças rasgadas nos joelhos. “Se calhar podia ter trazido outras calças”, comentou. Rui Cerqueira, o entrevistador, riu-se e disse-lhe que não havia problema porque ele era mesmo assim. E vai continuar a ser. Com uma diferença: de agora em diante, parece ter deixado de vez de ser a sombra de Iker Casillas que fazia os jogos das taças e assume-se como o número 1 do FC Porto. Que este sábado fez a estreia no Dragão.

O guarda-redes que nasceu ao lado do campo de futebol e começou como lateral direito iniciou-se no Palmeiras, quando decidiu com o grupo do bairro com quem jogava entrar numa equipa. Aos 13 anos, e porque faltava alguém para a baliza, calçou as luvas e por lá ficou, até hoje. Era alto, era ágil, podia ser que pegasse. Mas, quando levava a coisa já mais a sério, esteve seis meses sem jogar porque não o deixavam mudar-se para o Merelinense. Dali, ele como todos os outros, pensavam que iriam parar ao Sp. Braga, mas foi aí que começaram as voltas na carreira.

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Aceitou o convite do Benfica e transferiu-se para Lisboa. Acreditava que era ali que iria singrar naquela que já tinha decidido ser a sua profissão: o futebol. As coisas até começaram a correr bem, andando alguns meses a treinar nos juniores e nos juvenis para ficar ao nível dos companheiros de posição, mas a certa altura percebeu que tinha a porta fechada porque Bruno Varela e José Costa tinham contrato profissional e, como tal, estavam na frente para jogar. Aberta a porta da saída, José Sá deu outro salto na carreira e na vida e foi para o Marítimo.

Andou entre os juniores e a equipa B até se estrear na Primeira Liga em agosto de 2013 e logo contra o Benfica. Os insulares ganharam, o guarda-redes foi dos melhores, mas aquilo que parecia ser uma rampa de lançamento acabou por não confirmar-se e, por causa de uma concentração da Seleção, perdeu o lugar e não mais calçou. Ainda assim, não baixou os braços e, no Euro Sub-21 de 2015, foi vice-campeão e considerado o melhor guarda-redes.

Em 2016, chegou ao FC Porto. E logo para trabalhar com a referência Casillas.

O Iker sempre foi o meu ídolo, quando estava no Real Madrid, sempre a ganhar. E com o Helton, que também é uma pessoa excelente, gostei muito de trabalhar. São os dois super simples, humildes, acessíveis e foi assim que me encaixei bem no grupo, Lembro-me que no primeiro treino que fiz vieram uns miúdos cantar as janeiras. Outras referências? O Neuer.”

Quase dois anos depois de ter chegado ao Dragão, ganhou o lugar ao seu ídolo de juventude. Mas, agora como há dois anos, continua com um estilo muito próprio. “Tenho este estilo porque sou eu que tenho de gostar e gosto de ser diferente”, contou ao Porto Canal, antes de revelar uma faceta mais descontraída: “Depois do Europeu começaram-me a chamar António Variações. Não sei porquê, deve ser da voz”, ironizou o barbudo que teve como primeira das muitas tatuagens uma Nossa Senhora de Fátima com luvas de guarda-redes.

E qual é o avançado mais temível? “Não tenho medo de ninguém”, atirou. José Sá tem um estilo e uma maneira de ser muito própria, não se preocupando nada com o que os outros dizem ou pensam. Foi assim também que, num percurso com alguns baixos, foi continuando a evoluir e a crescer até chegar à titularidade que tanto ambicionava. E que parece ter chegado para ficar, com Casillas a somar o segundo jogo seguido no banco.

Pela forma como vive (ou vivia) os jogos no banco, pela maneira com que demonstrava o “espírito FC Porto” em entrevistas ou nas redes sociais, José Sá sempre foi um jogador muito acarinhado pelos adeptos azuis e brancos. Agora, aos 24 anos, quer começar uma nova era na baliza do clube. E não terá sido por acaso que, na conferência de imprensa antes do jogo com o P. Ferreira, Sérgio Conceição o apelidou de guarda-redes com mais qualidade para assumir a baliza da Seleção Nacional depois de Rui Patrício.