A Comissão Europeia avisa o Governo português para o risco de existir um “desvio significativo” no cumprimento dos défices de 2017 e 2018. A carta dos comissários Pierre Moscovici e Valdis Dombrovskis foi enviada esta sexta-feira ao ministro Mário Centeno, no quadro da avaliação às propostas orçamentais dos países do euro que têm de cumprir o pacto de estabilidade e crescimento.

Bruxelas pede ao ministro das Finanças que dê informações adicionais até 31 de outubro que permitam clarificar o cumprimento das regras europeias. Fonte oficial do Ministério das Finanças refere apenas que irá responder, enviando os esclarecimentos pedidos, sem fazer mais comentários.

Uma das dúvidas tem que ver com o cálculo do défice estrutural previsto na proposta de Orçamento do Estado para 2018. A proposta submetida por Mário Centeno aponta para um esforço de redução do saldo estrutural de 0,5% do Produto Interno Bruto (PIB). Mas a Comissão Europeia recalculou o número e chegou a 0,4% do PIB. “Apesar de significativo, este esforço parece estar aquém do valor que seria exigido, de 0,6% do PIB, ao abrigo do ajustamento acordado no quadro do pacto de estabilidade e como ficou estabelecido nas recomendações do Conselho Europeu de 11 de julho de 2017”.

Bruxelas exige por isso que o Governo português esclareça como é que pretende cumprir as regras europeias no próximo ano.

“Escrevemos-lhe para pedir clarificações sobre o cumprimento do esforço orçamental planeado por Portugal para 2018 em linha com as exigências do braço preventivo do Pacto de Estabilidade e Crescimento”, afirmam o vice-presidente da Comissão Europeia responsável pela Estabilidade Financeira, Valdis Dombrovskis, e o comissário europeu dos Assuntos Económicos, Pierre Moscovici, numa carta dirigida ao ministro das Finanças, Mário Centeno.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Os comissários questionam ainda a previsão para a taxa de crescimento nominal da despesa que ultrapassa o ritmo recomendado e que aponta para um gap (défice) de 1,1% do Produto Interno Bruto no próximo ano. Este ano, esse gap irá situar-se entre os 0,5% e 1% do produto. Ora de acordo com a análise preliminar da Comissão este valor “aponta para o risco de um desvio significativo face ao esforço necessário em 2017 e em 2018. Seria por isso bem vinda mais informação sobre a composição exata do esforço de consolidação estrutural previsto na proposta orçamental para o próximo ano. A carta de Bruxelas é conhecida depois de os técnicos do Parlamento terem sinalizado o mesmo risco.

Medidas do Orçamento não chegam para cumprir regras de Bruxelas

Esta não é a primeira vez que a Comissão Europeia manifesta dúvidas sobre as contas apresentadas pelo Governo. O mesmo aconteceu em 2016 e em 2017, anos em que Bruxelas previa derrapagens no défice que acabaram por não se verificar, o que resultou na saída de Portugal do procedimento de défices excessivos. Estes “erros de previsão” são sublinhados na proposta de orçamento apresentada a 13 de outubro.

“O erro nas previsões orçamentais é um fator que deve ser tido em conta na margem discricionária que a Comissão utiliza quando avalia os projetos orçamentais dos Estados-Membros. A recomendação de política que resulta da metodologia adotada pode induzir aos países um sentido e uma magnitude na tomada de medidas que se pode demonstrar prejudicial para o processo de ajustamento económico e orçamental.”

No entanto, e de acordo com os alertas de entidades independentes como a UTAO (Unidade Técnica de Apoio Orçamental) do Parlamento e o Conselho de Finanças Públicas, o cumprimento das metas do défice tem sido possível também por via de uma elevada margem de cativações da despesa e cortes no investimento, face aos valores orçamentados. Uma receita que pode ser repetida em 2018.

UTAO. Centeno volta a cativar quase 1.800 milhões de euros no Orçamento