“Qual o melhor cenário na relação entre o médico e o doente?”, perguntou Gary Edwards à audiência. “Que o doente não precise de voltar ao consultório”, ouviu-se na resposta. Sim, mas para este palhaço o melhor cenário é que o doente deseje a visita do médico, em vez de temer que ele apareça. E o médico pode conseguir isto quando diverte o doente nas suas visitas, com humor ou com magia, explicou o orador na sessão “Humor nos Cuidados de Saúde” da 9ª Conferência iMed, que decorre até domingo em Lisboa.

Vinte segundos de tempo de qualidade entre o médico e o paciente aumentam a probabilidade de o doente seguir os tratamentos”, disse Gary Edwards, citando uma investigação feita nesta área. Numa altura em que os médicos têm cada vez menos tempo para estar com o doentes e que a interação é cada vez mais mediada pela tecnologia, o papel do humor torna-se ainda mais relevante, referiu o palhaço que há mais de 20 anos trabalha em projetos de saúde. E reforçou que uma boa relação com os profissionais de saúde diminui o tempo de internamento.

Gary Edwards falou para os estudantes de Medicina e lembrou-lhes que é muito fácil usar o humor no dia-a-dia. Aliás, o humor já está presente na vida dos médicos. Exemplos? Quando o médico sorri e recebe um sorriso de volta do doente — o humor gentil. Quando os médicos e enfermeiros usam o humor negro para a aliviar a própria tensão. Quando o doente se exprime com sarcasmo e está, na verdade, a transmitir o seu desconforto. Quando se usam brincadeiras para concretizar procedimentos médicos mais desconfortáveis.

Há um elemento crucial no humor, disse o palhaço profissional: o inesperado. “Quanto melhor o entendermos, melhor podemos aplicá-lo.” Chegar ao pé do doente com uma galinha de borracha de baixo do braço, ou cumprimentá-lo ao estilo do espião mais famoso do mundo: “Boa tarde, sou o Bond. James Bond”, ou usar um frasco de bolinhas de sabão. “A primeira impressão é muito importante e não há uma segunda oportunidade para uma primeira boa impressão.”

Claro que o humor não se pode usar em todas as situações: não deve ser usado em momentos de crise ou de mudança. Mas pode perfeitamente ser usado durante um procedimento doloroso para que o doente desvie a atenção do que lhe está a acontecer em termos clínicos. Os próprios palhaços em contexto hospitalar usam batas e brincam com os procedimentos médicos para que as pessoas deixem de ter medo destas situações e também tenham uma referência positiva em relação a elas.

Gary Edwards tem desenvolvido projetos de humor em contexto hospitalar. Começou na República Checa e Eslováquia, espalhou-se pela Europa e Nova Zelândia e já chegou à Palestina e Jordânia. O palhaço, que conta com o apoio da associação Narizes Vermelhos Internacional, tem trabalhado muito em contexto pediátrico, mas também tem interesse pela comunidade mais idosa. Uma ideia um pouco egocêntrica confessou: “Já passei a idade da reforma há algum tempo e não me quero imaginar a acabar numa instituição onde não haja palhaços”.

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