A primeira década do Plano Nacional de Leitura (PNL) foi uma inspiração, mas os próximos dez anos serão desafiantes, porque ler não está na moda, afirmou a comissária do PNL, Teresa Calçada, em entrevista à agência Lusa.

Teresa Calçada, há mais de 30 anos dedicada ao livro e à leitura, foi nomeada em março comissária do PNL 2027, regressando a um projeto onde já esteve como subcomissária.

Nas vésperas da conferência anual do PNL, marcada para segunda-feira em Lisboa, subordinada ao tema “a urgência da leitura”, Teresa Calçada elencou alguns dos desafios que o Plano Nacional de Leitura enfrenta para a próxima década.

“O PNL conseguiu constituir-se como uma marca, o que não é fácil, e essa marca ajudou a um dos objetivos primeiros do Plano: Valorizar a leitura. Conseguiu-se transmitir para dentro, para as escolas, e para o exterior que a leitura era reconhecida, nas famílias, nos professores, nos miúdos, como alguma coisa que não está na nossa vida”, afirmou.

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Cumprida a primeira década do PNL, como “ferramenta para a promoção e para a prática leitora”, Teresa Calçada alerta que deve continuar a existir uma política pública para o livro e para a leitura, porque “nada está seguro” e há novas realidades a ter em conta.

Uma delas é a ideia de tempo, numa sociedade que tem uma maior relação com o digital.

“É um tempo voraz, muito rápido, que parece contrário ao tempo lento da leitura; não é fácil transmitir essa mensagem. Com ele a questão de estarmos a lidar numa sociedade que já é digital, com muitos aspetos híbridos, em que as pessoas, em particular os jovens, estão sempre conectados e dão um valor social que está acima de todos os outros valores”, lembrou.

O livro de papel e as ferramentas digitais não são inimigos nem se excluem, alertou Teresa Calçada, mas é preciso equilibrar as forças, sobretudo entre os leitores mais novos.

“Como não é tribal entre nós ler, mesmo os miúdos que leem têm tendência a ler menos, ou a dizerem que não leem, ou a acomodarem-se nisso, porque não é uma prática bem-vista. Nenhum miúdo se esconde de dizer os seus gostos musicais, mas livros, dizerem uns para os outros de livre e espontânea vontade, é muito difícil. E isto é cultural”, opinou Teresa Calçada.

De acordo com a comissária, para os próximos dez anos de PNL estão a ser preparadas várias linhas de atuação, mesmo sabendo que não há fórmulas mágicas para lembrar aos portugueses que a leitura é uma prática fundamental na vida quotidiana.

“Queremos um conjunto de estudos que provem que é possível reforçar as competências de leitura e não deixar sair as crianças da escola primária, e depois da escolaridade obrigatória, sem as devidas competências de leitura. Isso é uma missão e uma honra”, disse.

Pela primeira vez oficializa-se o PNL também para adultos, tanto para os que têm baixos níveis de alfabetização como para aqueles que investiram em formação. Teresa Calçada quer que, no âmbito do programa Qualifica, as competências de leitura sejam obrigatórias no quadro curricular dos adultos.

Muito do trabalho do PNL será feito em parceria com outros organismos e instituições, à medida das necessidades, sejam escolas, bibliotecas públicas, escolares e universitárias, museus, centros de Ciência Viva, editores e livreiros.

Sobre as listas de obras recomendadas para leitura dentro e fora da sala de aula, que são das vertentes mais identificáveis do PNL – através da colocação de um selo de qualidade nos livros -, Teresa Calçada defende um reforço de divulgação junto dos portugueses.

Dedicada à “urgência da leitura”, a conferência anual do PNL contará com a presença, entre outros, do antropólogo argentino Néstor García Canclini, da escritora Isabel Alçada, dos investigadores Gustavo Cardoso, Heitor Alvelos e Manuel Sobrinho Simões e do coreógrafo Rui Horta.

Estarão ainda presentes os ministros da Educação, Tiago Brandão Rodrigues, e da Cultura, Luís Filipe Castro Mendes, o secretário de Estado da Educação, João Costa, e a secretária de Estado da Ciência, Fernanda Rollo.