Antes de existirem Walkers, havia “Walker: O Ranger do Texas”. E antes, depois e durante Walker, o ranger, há Chuck Norris, pedaço de homem que nos habituámos a gostar por via de um apetite insaciável por acção chunga e o desejo de fazer o impossível com os pés e com as mãos. Norris foi um dos muitos responsáveis pelo bichinho das artes marciais e num tempo em que não existia internet era mais fácil enfiar a carapuça da verdade induzida pelos filmes e achar que qualquer um poderia arrumar o outro apenas com um golpe. Era só fazer como nos filmes, como o Chuck fazia.

O Chuck também era uma espécie de sonho molhado do republicano norte-americano. Mostrava como as coisas deveriam ser feitas, se não fossem os horríveis democratas: “Desaparecido Em Combate” tem o americano duro, inquebrável, mas também diz como é que as coisas deveriam ter sido feitas. Chuck nunca foi bom, nem instaurou um arquétipo de herói que se gostasse de seguir, mas aquele lado canastrão, as one-liners perfeitas de tão estúpidas e ser o branco das artes marciais que lutou contra o Bruce Lee criaram uma aura à sua volta que só aqueles que cresceram nos anos 80 e 90 com quatro canais (nos melhores dias) e videoclubes conseguem perceber.

Chuck Norris abandona carreira pela mulher, que diz ter sido “envenenada”

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Parece que a carreira de Chuck Norris chegou ao fim. Contudo, fica a questão: mas a carreira já não tinha acabado? Este século não tem sido generoso para Chuck, aliás, desde “Walker: O Ranger do Texas” que a sua carreira acabou e se enfiou em memes da internet. Fez alguns filmes entretanto, até entrou no “The Expandables 2”, que foi o seu último filme, em 2012, mas quem se lembra disso? Pronto, é oficial, Chuck já não vai partir mais narizes ao murro. Mas deixou um mundo de memórias. Vale a pena recordar algumas.

Um tipo peludo

Há muito a discutir na luta entre Bruce Lee e Chuck Norris em “A Fúria do Dragão” (1972), o primeiro filme em que surge creditado. Combate lendário? Sim, claro, Bruce Lee proporcionou imensos desses momentos e quando decidiu combater Chuck (Bruce já sabia que Chuck iria ser lendário) resolveu fazê-lo em Itália, para dar um toque de classe, romantismo e causar alguma distração para o espectador não ficar muito tempo fixado no corpo peludo de Norris. Já viram bem aquilo? Claro que há exemplos bem piores, só que o contraste evidencia como a virilidade ocidental de Norris está disposta a combater o maior. Claro que as coisas só começam depois do devido aquecimento, porque um bom combate precisa de um bom warm up. E se estiverem calados e só mandarem uns berrinhos de vez em quando, ainda melhor: vem ao de cima o ar de durão. Porque um homem quer-se é calado. A não ser quando tem de falar.

https://www.youtube.com/watch?v=p4ZNHYHubLc

Aquela festa da mangueira

Continuando nos duetos. Corria o ano de 1984 e o que estava mesmo a fazer falta era um encontro entre Chuck Norris e Jean-Claude Van Damme. Não foi bem isso que aconteceu, mas imaginem o entusiasmo de um jovem adulto quando descobre este vídeo na internet anos mais tarde. Ou saber disto na altura (e na altura era toda a década de 80 e metade da seguinte): que o Chuck e o Van Damme tinham treinado juntos. Era informação que dominava um grupo.

Chun Ku Do

Parece que é a brincar, mas isto é a sério. Há um estilo de artes marciais que foi criado por Chuck Norris. Coisa que só um campeão de karaté consegue fazer. Isso e ensinar autodefesa, porque na impossibilidade de ser Chuck Norris, nada melhor do que aprender com o mestre. E até há uma Bíblia, a conta Twitter Chuck Norris Facts, que fornece um guia exaustivo para qualquer um se sentir mais próximo da vertigem do dia-a-dia de um Norris. E se quiser mais, até pode ter lições privadas com Chuck. Mas em DVD.

Até foi um boneco

Antes de existir ironia, era possível fazer estas coisas (sem ironia). “Karate Kommandos” foi uma série de apenas cinco episódios, produzida em 1986, em que Chuck Norris dava a voz ao líder de um grupo (adivinhou o nome, Karate Kommandos) que era composto pelos mais diversos tipos de guerreiros que lutavam contra o mal. Havia um samurai, um lutador de sumo, um aprendiz de Chuck (provavelmente nos desenhos animados também se vendiam VHS de auto-defesa), um gajo da tecnologia e uma rapariga com o belíssimo nome de Too Much.

Vais a algum lado?

Não podia cá faltar “Força Delta” (1986) e aquele momento em que Chuck pega na sua mota e resolve dar umas voltas para limpar o sebo a uns quantos tipos. Há qualquer coisa de inatingível quando pergunta “going somewhere?” montado numa mota e a tratar da situação como se estivesse a cavalo, noutro tempo que não o século XX, e não existissem tipos com armas para o despachar num instante. E que entrada pela janela. Que entrada. Esqueçam lá os westerns.

Aquele jeitinho de cirurgião plástico

Há muitos momentos para picar em “Walker: O Ranger do Texas” (pudera, são mais de 200 episódios), mas há aqueles em que basta ver apenas um segundo da cena para tudo vir à memória. E que cena esta, quando Walker/Chuck pede a algumas pessoas para se afastarem e arruma todos os bandidos. No final, ainda se oferece para arranjar um nariz que acabou de partir. Um bom homem.

Como ratos como tu ao pequeno-almoço

Antes de se ouvir falar em waterboarding, Chuck Norris detinha direitos sobre a forma mais chocante de tortura. Ao ver esta cena de “Desaparecido em Combate 2” um tipo fica com a sensação que não resistia à mais mariquinhas forma de tortura: porque o segundo passo poderia ser um saco na cabeça com um rato lá dentro. Há muita coisa aqui enfiada. Primeiro, os ratos não são fixes. Ter um rato a passear-se pela boca que beija os nossos filhos não é muito agradável. Além de que pode fazer chichi para os olhos. Ou melhor, estar mesmo com muita vontade, ensopar o saco todo e começar assim uma forma de waterboarding. Segundo, imaginem que o rato só nos quer fazer cócegas. Deve ser um pesadelo. Ou pode só querer arranhar. Não há nada de bom num saco enfiado na cabeça com um rato lá dentro. Até porque só há uma forma de matá-lo. À dentada. Foi isso que Chuck Norris fez. Com a boca com que beija os filhos.