De avental e luvas a preparar refeições ou de colete, sentado no chão, a conversar com quem vive na rua, o Presidente da República vestiu, este sábado à noite, o fato de voluntário e esteve no terreno com instituições que apoiam sem-abrigo. Esparguete à bolonhesa, beringelas recheadas (para os vegetarianos) e castanhas assadas – porque estamos no São Martinho – compunham a ementa que os voluntários da CASA – Centro de Apoio aos Sem-Abrigo, em Sete Rios, em Lisboa, prepararam no sábado ao final da tarde.

Mas na cozinha de onde diariamente saem mais de 460 refeições, a agitação foi maior do que o habitual, já Marcelo Rebelo Sousa trouxe consigo, além do ‘staff’ presidencial, muitos jornalistas, tornando o trabalho de cozinheiros e voluntários um pouco mais difícil do que o habitual. “É muito sovina, põe pouca massa”, atirou o Presidente da República, no seu jeito descontraído, para uma das voluntárias.

Vestido a rigor – com avental branco da CASA e de luvas, por cima do fato e gravata azul – Marcelo serviu massa, recheou beringelas, mas foi a pôr a carne nos recipientes de alumínio que encontrou a sua vocação na cozinha da CASA. Depois da preparação das refeições, tempo de arrancar para uma cantina social localizada no Largo de Santa Bárbara.

À chegada, o avental já tinha dado o seu lugar a um colete refletor, onde se lia Comunidade Vida e Paz nas costas, e antes do jantar, Marcelo não perdeu tempo a carregar as caixas com as refeições. Após um rápido jantar, o Presidente da República seguiu para o Jardim Constantino, logo ali a 500 metros, onde se demorou a conversar com um senhor que perto dos seus 80 anos vive na rua e está sinalizado pela Comunidade Vida e Paz.

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A caminho da carrinha – lugares sentados que o próprio chefe de Estado distribuiu – Marcelo recordou que ousou dizer algo, que foi considerado “uma loucura”, que foi que até 2023 se reduzisse “drasticamente o número de sem-abrigo”. Sobre plano de ação para a integração das pessoas sem-abrigo – que o Presidente da República fez questão de sublinhar que era “para estes dois anos, para o final de 2017 e 2018” – a bola passou para o Governo, concretamente para a secretária de Estado da Segurança Social, Cláudia Joaquim, que acompanhou todo o périplo de cinco horas.

“A nossa previsão é que o plano possa estar aprovado e homologado até ao final deste mês e permita que periodicamente todas as entidades públicas e instituições possam ir dialogando, trabalhando em conjunto”, garantiu a secretária de Estado aos jornalistas.

Em Regueirão dos Anjos uma visão pouco habitual: o Presidente da República sentado no chão, com as pernas “à chinês” e uma parede cheia de grafitis atrás, de mãos dadas a um angolano que está a viver na rua. Marcelo ajudou até a que experimentasse o casaco que a Comunidade Vida e Paz lhe trouxe, dando opinião sobre o tamanho, a cor e o quão quente era o abrigo.

Quando já se tinha deslocado dois metros para o lado, voltando a sentar-se no chão para confortar um ganês que não tem os seus documentos, chegou um grupo de moradores para oferecer pão e bolos, mas que queriam sobretudo agradecer ao Presidente da República “pelo trabalho que faz”. “É o primeiro político ao longo destes mais de 40 anos de novo regime que tem a coragem de vir para a rua e se sentar no chão com as pessoas”, elogiou depois, em declarações à agência Lusa, o morador Frederico Guerreiro.

A última paragem deste longo percurso foi na Praça da Figueira, já perto da meia-noite, havendo tempo para uma demorada “audiência” com um apaixonado por História. Nelson de Jesus Ferreira até “ganhou” a promessa de uma visita ao Palácio Belém, mas o principal objetivo era que Marcelo Rebelo de Sousa fosse visitar uma antiga capela devoluta, onde chegou a viver de forma ilegal, para que o espaço seja preservado.

Vive agora num “pequeno cubículo”, que o Presidente da República ainda tentou ir visitar, mas que Nelson disse estar desarrumado e rejeitou educadamente, pedindo “imensa desculpa” a Marcelo.