Luís Miguel Flores reuniu-se com o irmão, Nuno, e o pai, Francisco, para um jogo de bilhar. Estávamos em 2002 e os dois irmãos, ambos engenheiros na casa dos trinta anos, trabalhavam desde finais dos anos oitenta numa conceituada empresa de construção de maquinaria de suporte à soldadura de automóveis sediada em Inglaterra.

Entre uma tacada e outra, Luís Miguel partilhou com a família uma ideia que vinha a maturar desde havia cinco anos: criar um robô para desminagem humanitária, isto é, uma máquina que recolhesse e desativasse minas por explodir que colocassem em perigo a vida das pessoas. Os três concordaram que essa era uma boa ideia. Quinze anos depois, Nuno Flores não se lembra de quem ganhou o jogo de bilhar: naquele dia, havia nascido a Introsys, uma empresa que é “a mente que move a matéria”. Venceu esta quarta-feira o Prémio PME Inovação.

Se a empresa sediada na Quinta dos Anjos (Setúbal) teve um nascimento “sui generis”, como o engenheiro de gestão industrial Nuno Flores descreve ao Observador, a evolução da empresa não foi menos peculiar. A ideia do robô para desminagem teve de ficar para trás: a tecnologia portuguesa ainda era pouco conhecido “porque na altura não havia Web Summit” e porque, apesar da Introsys ter sido financiada pelo Estado português, nem a Defesa nem qualquer força de segurança nacional usava os produtos da companhia: “Não tínhamos nenhum feedback da experiência por utilizadores. Tivemos de dar uma volta à ideia”, conta ao Observador.

Nuno e Luís Miguel tiveram de seguir outro caminho, um “onde pudessem encontrar dinheiro”, explica o engenheiro industrial ao Observador. Encontrou-o numa área que os dois irmãos conheciam como a palma das suas mãos: a indústria automóvel. De três engenheiros cheios de ideias num pequeno escritório da Universidade Nova, a Introsys passou a ser uma empresa com 220 quadros e 20 milhões de euros.

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Imagine que está numa fábrica de carros. Está a ver aqueles braços metálicos cor de laranja que construiram o carro que conduz todos os dias? São esses robôs que a Introsys cria e são eles que montam, soldam ou pintam os materiais com que essas fábricas trabalham. Mas o que faz dos braços metálicos da Introsys tão diferentes e inovadores em relação a todos os outros? É que, explica-nos Nuno Flores, eles sãos mais do que máquinas: “São uma geração 4.0 entre as soluções da indústria automóvel”. Com três filiais abertas (Portugal, na Índia e no México), “a filosofia da Introsys não é fazer mais máquinas que executam uma função na perfeição e nada mais. Não fazemos máquinas perfeitas: se algo está perfeito é porque está acabado. A nossa filosofia é pensar máquinas para o que está por fazer, flexíveis e pensadas para prever novas necessidades, máquinas adaptáveis. Máquinas como nós”.

A filosofia convenceu empresas com nomes tão sonantes com a Volkswagen, a Audi, a BMW, a Ford, a Skoda, a Siemens, a Ebbe, a ThyssenKrupp ou a Inpro Electrics. À conta dela, a Introsys já tem mais de mil robôs e softwares a operar em fábricas de produção na área da indústria automóvel, aeronáutica, vigilância, segurança ou ambiente espalhados pelo mundo: os sistemas Introsys podem ser encontrados em Espanha, Reino Unido, Roménia, Rússia, Bélgica ou na Índia.

Em breve, provavelmente no início do ano, será representada por duas filiais nos Estados Unidos e na China. O futuro, conta-nos Nuno Flores, continuará sorridente: “Depois de termos ganho este prémio, pretendemos manter esta continuidade na busca e na investigação. Continuaremos no caminho da inovação”, garante o diretor-geral e fundador da empresa.

Como é escolhida a empresa mais inovadora de Portugal?

O Prémio PME Inovação, uma iniciativa da COTEC, BPI e jornal Público, serve para distinguir uma pequena ou média empresa portuguesa cuja atividade seja uma lufada de ar fresco. Inicialmente criada pelas mãos de Belmiro de Azevedo, o prémio é agora decidido por um júri composto por nove figuras proeminentes do mundo empresarial português: Artur Santos Silva (BPI), António Amorim, António Portela (Bial), Carlos Moreira da Silva (BA Glass Portugal), Emílio Rui Vilar (CGD), Isabel Mota (Fundação Calouste Gulbenkian), João Silveira Lobo, José Carlos Caldeira (ANI) e Manuela Tavares de Sousa (Imperial). Mas a decisão não é feita de opiniões: é feita de matemática. E o sistema é complexo.

Estas nove pessoas viajaram pelos distritos do país para participarem em mesas redondas onde se discutiu a estrutura e a contribuição das centenas de empresas que se candidataram ao prémio. No fim, quem manda é o Innovation Scoring, um sistema matemático de avaliação por pontos que faz um diagnóstico ao desempenho de inovação das empresas. Esse sistema baseia-se num algoritmo que estuda a evolução da empresa, as boas práticas de gestão e as contas da companhia através de cinco parâmetros: estratégia (que vale 200 pontos), organização (outros 200 pontos), processos de investigação, desenvolvimento e inovação (que vale 150 pontos), potenciadores — como o financiamento, por exemplo — (mais 150 pontos) e o impacto (que vale 300 pontos). No máximo, uma empresa pode acumular 1000 pontos. Este ano, a Introsys foi a empresa que mais pontos acumulou.