Quando as luzes coloridas daquelas duas casas na encosta junto ao Convento de S. Francisco se acendiam à janela, Alexandra Roldão sabia que o Natal já tinha chegado. Criada em Alenquer, Alexandra recorda no blogue “Alenquerensis” que esse era o sinal para se preparar para a típica visita a Lisboa: acompanhada pelos pais, apanhava o autocarro muito cedo para Vila Franca de Xira e daí seguia para a capital de comboio. Assistia a uma peça de teatro, almoçava num restaurante e depois chegava a melhor parte do dia: espreitar as montras repletas de brinquedos da Casa Bénard, da Quermesse de Paris ou da Casa Pinóquio. Quando o sol se punha, as ruas ganhavam outras cores: eram as luzes de Natal que já então invadiam a cidade.

Em 1963, importando a tradição vinda do século XVII norte-americano, os homens do campo tomavam conta das ruas lisboetas onde vendiam os perus para a ceia de Natal. A Sapataria Lord, na rua Augusta, preparava um montra luxuosa a combinar com a quadra e o Coliseu dos Recreios abria portas ao Circo de Natal, um espetáculo que sobreviveu até à atualidade, celebrando este ano 123 anos. Em 1965, havia dois espetáculos à tarde — uma sessão às 14h30 e outra às 17h15 — e a entrada era gratuita para as crianças entre 6 e 10 anos. O Grandioso Espetáculo, no entanto, era a grande atração: acontecia na véspera de Natal às 21h30 e só podiam entrar pessoas com mais de 6 anos.

Como era o Natal de antigamente? Era assim

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Toda a cidade mergulhava no espírito natalício: a pastelaria Cinderela avisava os clientes para encomendarem os bolos-rei com antecedência porque as filas seriam grandes, a rua 1º de Dezembro enchia-se de brinquedos para a Quermesse de Paris e o Largo de São Roque ficava intransponível com tanta gente esperançosa de ter ganho a Lotaria de Natal. Se os brinquedos de plástico enchiam o imaginário das crianças, os prémios faziam brilhar os olhos dos adultos. E havia muitos: o Cabaz de Natal prometia televisões, aspiradores, ferros de engomar e outros eletrodomésticos ponta de gama e a Eva de Natal incluía mil presentes, desde moradias completamente mobiladas a perfumes, como recorda o site Restos de Colecção.

Para aquelas cujas carteiras não acompanhavam as grandes lojas do Chiado, os vendedores ambulantes montavam bancas na Praça da Figueira, no Largo de Camões e no Rato. Alexandra Roldão lembra-se que, a 24 de dezembro, o Diário de Lisboa publicou que “o Natal é a época dos meninos que, felizes, escolhem dentro das lojas os brinquedos que vão possuir e dos meninos que de fora, nariz esborrachado contra o frio dos vidros das montras, olham os brinquedos que nunca terão”.

Recorde como é que a capital portuguesa se transformava para o Natal no século passado nas imagens da fotogaleria.