Saiu do Governo há menos de três meses, quando o país já tinha testemunhado duas das vagas de incêndios mais fatais da sua história, que somaram mais de 100 mortais. “Passei também, com a terrível tragédia dos incêndios, pelos momentos mais difíceis da minha vida”, admite Constança Urbano de Sousa, ex-ministra da Administração Interna, em entrevista à Notícias Magazine. Para memória futura ficará o queixume que soltou, por ter ficado sem férias quando o país ardia. “Não fiz nem faço nada a pensar no soundbyte ou para o momentinho televisivo”, justifica.

A maior frustração que guarda dos dois anos em que esteve em funções foi “não ter tido capacidade de evitar as tragédias dos fogos”. Mas rejeita as responsabilidades que, de uma forma direta ou indireta, lhe foram apontadas, pela forma como as diferentes autoridades e organismos nacionais que tutelava geriram a resposta às chamas e o apoio à população. “Magoou-me que algumas pessoas, que tinha por sérias e inteligentes, tivessem embarcado na espiral de acusações fáceis, reduzindo todas as tragédias, fruto de uma série de fatores e de desinvestimentos de décadas, à minha competência ou falta dela”, admite a ex-ministra.

Constança Urbano de Sousa garante que as cenas a que assistiu como ministra da Administração Interna, em junho e outubro, vão marcá-la para sempre.

Passei também, com a terrível tragédia dos incêndios, pelos momentos mais difíceis da minha vida. Que serão para sempre extremamente duros, que irão acompanhar-me para o resto da vida, que levarei para a cova.”

E, olhando para esses meses, considera que “se tivesse sido um homem a passar pelas mesmas circunstâncias talvez tivesse merecido mais respeito”, diz na entrevista publicada este domingo na Notícias Magazine. As declarações sobre as férias que não teve são um ponto incontornável da incapacidade política da ministra para gerir a pressão a que estava exposta. O país ainda estava a tentar lidar com as imagens das chamas que, pela segunda vez em quatro meses, varriam o centro e o norte, quando, a 16 de outubro, a ex-ministra volta a ser questionada sobre as condições para se manter no cargo. Responde assim: “Acho que este não é o momento para a demissão, é o momento para a ação. Ir-me embora seria o caminho mais fácil, ia ter as férias que não tive.

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Constança Urbano de Sousa regressa agora a esse instante. “Aquele momento foi aquele momento. E, como não sou calculista, nem gostaria de ser, não fiz nem faço nada a pensar no soundbyte ou para o momentinho televisivo”, atira, justificando que o seu foco esteve sempre na população. “Não estava a trabalhar para a imprensa mas para o meu país. Trabalho para as pessoas.”

Numa reflexão mais alargada, considera que “somos um país que pensa pouco” e que “os portugueses, em regra, não pensam profunda e racionalmente na vida, na suas opções”. Também ficam críticas à comunicação social. “Em Portugal, a espuma mediática é uma coisa terrível. E leva tudo atrás, de enxurrada”.

Quando se demitiu, escreveu uma carta ao primeiro-ministro onde deixava claro que, se não saiu antes, foi porque o chefe de Governo não quis. Ou não deixou. A relação entre ambos não ficou abalada.

Tenho uma profunda relação de amizade e de admiração pelo político que é António Costa. E pelo homem também.”.