Ao longo da pré-temporada, que meteu uma digressão pelo México no meio, o FC Porto testou de forma muito clara duas formas de apresentar-se em campo em termos táticos: o 4x3x3, tão habitual em anos anteriores nos dragões, e o 4x4x2, que entretanto se tornara norma nos outros candidatos ao título (Benfica e Sporting). Com o tempo, o plano B com dois avançados foi chegando a solução A. E, mesmo ficando apenas com três dianteiros puros no plantel (Rui Pedro e Gonçalo Paciência foram emprestados), Sérgio Conceição enraizou esse sistema.

Mesmo com a lesão de Soares numa fase prematura da época, Marega entrou, fez uma parceria ainda melhor com Aboubakar do que o brasileiro e os dragões tornaram-se autênticos rolos compressores sobretudo nas competições nacionais, com maior domínio nos encontros em casa. Sempre com dois avançados e dois alas, sempre com dois homens no meio-campo um à frente do outro. E as únicas vezes em que não jogaram pelos menos dois dos três avançados foi por condicionamentos físicos (o maliano também sofreria um problema muscular no início de novembro); quando voltaram, regressou o habitual 4x4x2. E a predominância ofensiva. E os golos.

(e aqui fazemos um parênteses para refletir sobre um pormenor curioso e inverso: enquanto os dragões passaram de um 4x3x3 muito enraizado na equipa e sempre com um goleador referência para o 4x4x2, o Benfica evoluiu do 4x4x2 para um 4x3x3/4x1X4X1 com Krovinovic a jogar nas costas de Jonas e o Sporting vai variando entre o 4x4x2, o 4x1x4x1 e o 4x2x3x1 quando Bruno Fernandes atua mais perto de Dost porque deixou de ter um segundo avançado com as características de Teo Gutiérrez capaz de fazer 15 golos por época)

Ficha de jogo

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Moreirense-FC Porto, 1-2

Quartos-de-final da Taça de Portugal

Parque Desportivo Comendador Joaquim Almeida de Freitas, em Moreira de Cónegos

Árbitro: Manuel Oliveira (AF Porto)

Moreirense: Jhonatan; Koffi, André Micael, Iago, Rúben Lima; Boubacar, Rafael Costa, Neto (Edno, 46′); Zizo, Tozé (Cádiz, 88′) e Ronaldo Peña (Dramé, 85′)

Suplentes não utilizados: Felipe, Matheus, Hichem e Bruno Ramirez

Treinador: Sérgio Vieira

FC Porto: Casillas; Maxi Pereira, Felipe, Marcano, Alex Telles; Danilo, Herrera; Layún, Hernâni (Ricardo Pereira, 70′), Brahimi (André André, 45′) e Soares (Aboubakar, 87′)

Suplentes não utilizados: José Sá, Reyes, Óliver Torres e Marega

Treinador: Sérgio Conceição

Golos: Herrera (8′), Layún (20′) e Edno (73′)

Ação disciplinar: cartão amarelo a Koffi (56′) e Iago Santos (79′)

A introdução serviu para apresentar aquela que foi a grande surpresa do técnico azul e branco na vitória por 2-1 sobre o Moreirense: Soares surgiu sozinho na frente, com Aboubakar e Marega a começarem no banco. Sim, é certo que Sérgio Conceição promoveu um total de sete alterações em relação ao onze que começara o encontro com o V. Guimarães que fechou a primeira volta do Campeonato (4-2), mas foi essa nuance tática que fez toda a diferença. Na ficha e no jogo, porque o brasileiro provou que às vezes mais vale só do que bem acompanhado (afinal, os dois avançados africanos valem 50% dos golos marcados pelos dragões esta época…).

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Num campo pequeno em termos de dimensões (e contra um adversário que, apesar da derrota por 2-0 com o Benfica no domingo, mostrou uma interessante organização coletiva), o FC Porto não optou por jogar em campo grande, como tantas vezes faz, e preferiu dar mais verticalidade ao jogo pelo corredor central. E seria assim que chegaria ao primeiro golo, pelo regressado Herrera: passe do mexicano para Soares, grande trabalho individual do brasileiro a rodar, ganhar a frente e fazer a assistência e toque final do médio a enganar Jhonatan (8′).

O Moreirense foi claramente surpreendido pela abordagem dos azuis e brancos, que tinham em Herrera e Layún os principais elementos nas ações ofensivas (o último mexicano, que funciona como um homem dos sete ofícios capaz de jogar em qualquer posição, mostrou que tem na inteligência tática e na forma como percebe o que é preciso fazer em cada um dos lugares que ocupa duas características que podem fazer levar os dirigentes do FC Porto a ponderar o tão falado empréstimo em janeiro) e Soares como grande referência no ataque. E não demorou a surgir o segundo golo: aproveitando cortes deficientes dos cónegos na área, Layún rematou de primeira para o 2-0 (20′).

Estava fácil para o FC Porto. Até demasiado fácil, para aquilo que se antevia e para as dificuldades que os dragões começam sentir em Moreira de Cónegos (ainda no ano passado, na última jornada do Campeonato, tinham perdido por 3-1 no derradeiro encontro de Nuno Espírito Santo no clube). Tão fácil que, antes do intervalo, os visitantes acabaram por facilitar e permitir dois remates perigosos aos cónegos, inspirados por Tozé, um médio formado no Olival que acabou o 12.º ano antes de se matricular no curso de Medicina Veterinária no Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar da Universidade do Porto com nota 20: primeiro lançou Ronaldo Peña em profundidade que, frente a Casillas, permitiu a defesa do espanhol; depois, rematou perto do poste.

O intervalo aproximava-se, assim como a pior notícia do jogo para Sérgio Conceição: Brahimi, que já manifestara algumas queixas uns minutos antes, acabou mesmo por sair aos 45 minutos, acusando um problema na coxa direita que o deixou no banco a fazer gelo na zona afetada (no final do encontro, o treinador portista falou apenas em fadiga muscular). Entrou André André, deslocou-se Layún para a ala esquerda.

No segundo tempo, Sérgio Vieira estreou o veterano Edno, um ponta-de-lança que conheceu quando treinou no Brasil e que, apesar dos atuais 34 anos, chegou a ser campeão brasileiro pelo Corinthians, mas as características do encontro permaneceram quase inalteráveis, com o Moreirense a ter dificuldades em lançar transições que chegassem ao último terço dos azuis e brancos e o FC Porto a aproveitar as movimentações dos elementos ofensivos para criar situações de remate para os médios, neste caso Herrera ou André André.

Enquanto esteve bem, e mesmo não marcando, Soares conseguiu ter um daqueles jogos onde faz bem mais do que as estatísticas possam mostrar mas, em paralelo, ainda não tem fôlego para os 90 minutos, o que acabou por tirar poder de fogo ao ataque dos azuis e brancos. Mas, verdade seja dita, este era um período onde dava para tudo: Marega, que tinha estado no aquecimento mas que regressara ao banco após uma conversa com o staff médico, teve de levantar-se para agradecer aos adeptos que cantaram durante minutos a fio a música “Mete o Marega”…

No meio de tanta festa antecipada, um pequeno calafrio: após um cruzamento da esquerda de Tozé, Edno teve uma estreia de sonho logo a marcar a um “grande” e deixou o jogo em aberto antes do último quarto de hora (73′). Uma ameaça teórica que, na prática, acabou por nunca confirmar-se até ao final da partida.

Soares, que já tinha caído duas vezes e mostrava claros sinais de desgaste, ainda teve duas boas oportunidades para marcar o golo que mereceu ao longo do encontro, mas o jogo terminaria mesmo em 2-1 para o FC Porto, que vai agora defrontar o Sporting nas meias-finais da Taça de Portugal, com a primeira mão a realizar-se no Dragão. Se juntarmos a estes dois jogos a meia-final da Taça da Liga e o encontro do Campeonato, 2018 vai ser mesmo um ano de clássicos até abril e só nas provas europeias os dois rivais não vão poder cruzar-se.