A Procuradoria de Justiça de Nova Iorque abriu uma investigação à empresa Devumi depois de uma reportagem do The New York Times revelar que a companhia vende seguidores, alguns deles de contas falsas automatizadas, a celebridades, políticos ou entidades com vontade de se tornarem mais populares ou ganharem influência nas redes sociais. A notícia foi avançada pela BBC. De acordo com a investigação, a empresa tem 200 mil clientes e uma base de mais de 200 milhões de contas que podem ser vendidas e compradas infinitas vezes. Entre os famosos que recorreram à Devumi para ganhar mais seguidores estão o ator Joh Leguizamo, o multimilionário Michael Dell ou Martha Lane Fox, membro da direção do próprio Twitter.

Estas contas falsas, chamadas “bots”, devem compor 15% de todos os utilizadores ativos do Twitter, o que simbolizam 48 milhões de contas. No Facebook, estima-se que haja 60 milhões dessas contas que têm o propósito de imitar o comportamento online de pessoas verdadeiras: a Devumi chega mesmo a utilizar nomes, fotos de perfil e informação pessoais de utilizadores reais das redes sociais, incluindo menores. Algumas contas verdadeiras são duplicadas e a cópia é monitorizada para a Devumi para seguir ou republicar outras páginas a que o utilizador verdadeiro nunca acedeu, incluindo páginas de pornografia.

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Apesar de o Twitter proibir este tipo de negócios na rede social, a carteira de clientes da Devumi inclui estrelas de televisão, atletas profissionais, comediantes, oradores das conferências TED e modelos. Segundo apurou o The New York Times, alguns desses famosos compram os serviços da Devumi ou pedem a agentes, assessores, familiares ou amigos para contactar a empresa. Cada conta automatizada comprada para seguir um famoso pode não custar mais do que poucos cêntimos. E garantem não só seguidores no Twitter, como também visualizações no YouTube, visitas no SoundCloud ou ligações no LinkedIn.

Na política, foi descoberto que um editor da agência noticiosa do governo chinês comprou contas no Twitter (proibido pelo governo) para fazer propaganda. E um conselheiro do presidente do Equador, Lenín Moreno, utilizou os serviços da Devumi para comprar dezenas de milhares de seguidores e republicações para a conta da campanha nas últimas eleições.

Há três tipos de “bots”, diz o The New York Times: os utilizados pela conta “Big Ben”, que é programada para publicar mensagens em função das horas; os programados para a conta dos Serviços Geológicos dos EUA, que foram programados para publicar informações sempre que algo de diferente for registado; e os utilizados pela Devumi, chamados “bots de amplificação”. German Calas, fundador da Devumi, desmente as acusações de vender contas falsas replicadas de perfis verdadeiros.

As vantagens da popularidade, mesmo fictícia

Algumas destas acusações já mereceram reações no Twitter: Randy Bryce, político que está a tentar conquistar um lugar na ala republicana do Senado, admitiu ter utilizado os serviços da Devumi há três anos, com 15 dólares, para ganhar mais seguidores para o blog que tinha: “Não resultou e não usei na minha campanha”, escreveu ele. Mas a relativização que Randy Bryce deu ao assunto pode não ser a mais fiel numa altura em que as “fake news” e os receios de interferências nas eleições dos Estados Unidos a partir da Internet dominam o interesse público:

“O anseio coletivo do mundo para a conexão não só remodelou o Fortune 500 e revolucionou o setor publicitário, como também criou um novo simbolismo de estatuto: o número de pessoas que seguem ou “gostam” de si. Para alguns artistas e empresários, esse estatuto virtual é uma moeda do mundo real. Pode ser determinante para decidir quem contratar, quanto lhes pagar”, escreve o The New York Times.

Isso é ainda mais visível no YouTube, onde um youtuber ganha mais dinheiro se atrair a atenção de mais gente, porque também conquista a atenção de investidores sob a forma de publicidade, por exemplo. A Captiv8 diz que uma pessoa com 100 mil utilizadores ganha em média dois mil dólares por tweet promocional. Uma pessoa com um milhão de utilizadores pode chegar aos vinte mil dólares de lucro. Mas a Devumi não é a única a operar neste tipo de serviços: o The New York Times encontrou pelo menos mais duas, a Social Envy e DIYLikes.com. Nenhuma delas informa os clientes de que as contas que estão prestes a comprar como seguidores são, na verdade, réplicas de contas verdadeiras.

Distinguir uma e outra não é tarefa fácil. O The New York Times testou a Devumi e comprou 25 mil seguidores por 225 dólares para uma conta Twitter criada para fazer a experiência. Os primeiros 10 mil pareciam reais, mas alguns pormenores permitiram distinguir a conta verdadeira da falsa, como alterações às cores ou saturação da foto de perfil, substituição de letras maiúsculas por minúsculas ou vice-versa no nome de utilizador, o facto de o número de páginas seguidas pela conta falsa é anormalmente maior do que o número de seguidores, ou o facto de republicar páginas de línguas muito diferentes. Os outros 15 mil seguidores já pareciam evidentemente falsos: não tinham foto de perfil e o nome de utilizador é um monte de letras e números.