O ex-administrador da companhia aérea cabo-verdiana (TACV) João Pereira da Silva disse esta quarta-feira que, durante a sua gestão, a Binter Canárias lhe manifestou que só operaria em Cabo Verde sem concorrência nos voos domésticos.

O último presidente do Conselho de Administração dos governos do PAICV (2012 – 2016) foi ouvido na Comissão Parlamentar de Inquérito à gestão da empresa, tendo dado também conta da pretensão da companhia de aviação das Canárias de assumir uma posição de domínio no capital dos Transportes Aéreos de Cabo Verde (TACV).

“A posição da Binter era de que não entraria [em Cabo Verde] com uma empresa estatal em concorrência e, se entrasse no capital dessa empresa, teria que ser numa posição de domínio”, disse João Pereira da Silva.

João Pereira da Silva explicou que esta posição lhe foi transmitida pessoalmente pelos responsáveis pela Binter no contexto da negociação de uma possibilidade de cooperação entre as duas empresas.

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João Pereira da Silva respondia aos deputados quando instado a dar a sua opinião sobre a liquidação da operação TACV nos voos domésticos, que desde agosto são assegurados em exclusivo pela Binter Cabo Verde, empresa detida em 100% pela Binter Canárias.

O antigo administrador adiantou ainda que, na altura, lhe foi dito pelo então chefe do Governo, José Maria Neves, que “não aceitaria uma empresa de capitais estrangeiros em situação de monopólio no mercado doméstico”.

“Não se avançou porque a Binter colocou como condição ficar com o domínio do capital da TACV, mais de 50%”, disse.

O Partido Africano da Independência de Cabo Verde (PAICV) perdeu as eleições de março de 2016 para o Movimento para a Democracia (MpD) e a Binter CV iniciou as operações em novembro desse mesmo ano.

Em agosto, de 2017 o Governo cabo-verdiano anunciou a descontinuidade dos voos domésticos da TACV, passando a Binter a assegurar o exclusivo das ligações entre as ilhas cabo-verdianas.

O Governo assinou com a empresa um memorando de entendimento que previa a entrada no capital até junho, mas recentemente o ministro das Finanças afirmou que o Governo não vai comprar os 19% de capital da Binter Cabo Verde que, juntamente com os 30% garantidos pela concessão da linha doméstica, perfaziam os 49% da participação prevista.

Durante a audição, João Pereira da Silva adiantou ainda que, em 2012, encontrou a empresa numa “situação financeira má e que continuou a ser má”, com problemas frequentes de tesouraria, excesso de pessoal e uma “situação caótica” ao nível da gestão dos recursos humanos.

Adiantou que chegou à empresa com a missão de a reestruturar com vista à privatização e que, durante a sua gestão, foram elaborados planos de reestruturação financeira e do modelo de negócios e se conseguiu “inverter a tendência de crescimento do passivo”.

Reconheceu que a empresa tinha frequentes problemas de tesouraria e que em várias circunstâncias esteve em risco de ver aviões arrestados por atraso nos pagamentos.

Sobre o arresto do Boeing 737-800 no aeroporto de Amesterdão, em março de 2016, João Pereira da Silva considerou que foi “inesperada”, por decorrerem negociações com a empresa locadora, e mostrou-se convencido que esta quis ver-se livre de “um cliente que estava sempre a dar problemas” e que já tinha outro interessado no avião.

A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) à gestão da companhia aérea cabo-verdiana TACV retomou segunda-feira as audições com um mapa que propõe ouvir, até 02 de fevereiro, 17 personalidades, entre ex-governantes e antigos administradores da empresa.