Existe uma tendência recente nos desportistas de topo das principais modalidades de expressarem sentimentos e problemas que têm em determinados momentos da carreira, quase como se quisessem mostrar que, apesar de serem adorados por legiões de fãs um pouco por todo o mundo e tratados como extra-terrestres com o dom que milhões gostariam de ter, também atravessam fases menos boas como qualquer pessoa. Exemplo disso foi, na semana passada, o texto escrito na primeira pessoa por Kevin Love, extremo/poste dos Cleveland Cavaliers campeão em 2016, na The Players’ Tribune, onde confessava ter sofrido um ataque de pânico durante um jogo com os Alanta Hawks, em novembro. Ou Per Mertesacker, experiente central germânico campeão do mundo que admitiu que o futebol se tinha entretanto tornado um suplício.

O caso de André Gomes é diferente de Love ou Mertesacker, mas tem um ponto em comum: o jogador do Barcelona abriu o livro e admitiu que as coisas não estão a correr da melhor forma nesta altura da temporada, algo que estava à vista de todos. “Não me sinto bem em campo, não estou a desfrutar. Os primeiros seis meses correram bem, mas depois as coisas mudaram. Talvez a palavra não seja a mais correta, mas tornou-se um pouco num inferno, porque comecei a ter mais pressão. Convivo bem com a pressão, não convivo bem é com a pressão em mim mesmo”, confessou em entrevista à revista Panenka.

Com apenas 988 minutos em 25 jogos realizados entre Campeonato, Taça de Espanha, Supertaça e Liga dos Campeões, o campeão europeu de seleções tornou-se numa espécie de alvo de muitos adeptos blaugrana (e da própria imprensa catalã) e atravessa um período mais difícil onde essa cobrança se faz sentir: se a confiança já não era muita, o ruído criado à sua volta também não ajuda nada. “Até nos treinos se nota. Aí sabes que estás a sofrer. Talvez tenha jogado no dia anterior ou dois dias antes e ainda tenho aquela imagem do jogo, que não me permite seguir em frente. Nos treinos sinto-me bem com os meus colegas, mas a sensação que tenho nos jogos é má”, referiu, num dos primeiros extractos da conversa.

“Já me aconteceu, em mais do que uma ocasião, não querer sair de casa porque as pessoas podem olhar-me de lado. Ter medo de sair de casa por sentir vergonha… Incomoda-me que me digam que consigo fazer as coisas bem, porque me pergunto a mim mesmo ‘Então porque não as faço?'”, acrescentou, ainda a propósito dessa falta de confiança que atravessa, prosseguindo: “Pensar em demasia faz-me mal porque penso nas coisas más. Apesar de todo o apoio dos meus companheiros, que é muito, as coisas não me estão a sair como queriam que saíssem”. Como acaba por destacar a revista numa frase, é a própria exigência de André Gomes consigo mesmo que impede que coloque termo às suas inseguranças.

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Aos 24 anos, o internacional português que passou por FC Porto, Pasteleira, Boavista e Benfica na formação antes de ascender à principal equipa dos encarnados está desde 2014/15 em Espanha. Começou por jogar no Valência, que comprou o seu passe em 2015, e transferiu-se para o Barcelona em 2016, ano em que foi uma das primeiras opções de Fernando Santos no meio-campo da Seleção Nacional que ganhou o Campeonato da Europa em França. Este fim de semana, entrou a 16 minutos do final no trunfo dos comandados de Ernesto Valverde (sem Messi, que foi pai pela terceira vez) frente ao Málaga, por 2-0.

Depois de ter ganho um Campeonato, uma Taça de Portugal e uma Taça da Liga pelo Benfica (esteve também em duas finais perdidas da Liga Europa, diante de Chelsea e Sevilha), André Gomes ganhou uma Supertaça e uma Taça de Espanha pelo Barcelona. Agora, numa fase da temporada em que as grandes decisões estão aí à porta (no clube e até na Seleção, que estará presente na Rússia em junho/julho para o Campeonato do Mundo), o médio luta por voltar a ser o que era e poder ajudar em campo os restantes companheiros blaugrana como não tem conseguido nos últimos tempos.