Há jogadores que são assim: “amuletos”. Os treinadores colocam-nos a jogar só na segunda parte, mais lá para o quarto de hora derradeiro, quando a coisa está negra e é preciso dar a volta ao resultado com o cronómetro a aparentar avançar mais depressa do que na verdade avança. O mais conhecido “amuleto” na história do futebol é talvez o norueguês que mesmo trintão continuava a ter rosto de menino: Ole Gunnar Solskjær. E raríssimas foram as vezes em que chamado por Alex Ferguson (na tal hora negra em que se pediam bolas dentro da baliza) no Manchester United para resolver não resolvia. Solskjær ganharia um epíteto em Old Traford: baby-faced assassin.

Rui Vitória tem em Raúl Jiménez um destes jogadores talhados para resolver quando mais ninguém resolve.

É quase inacreditável saber que o Benfica desembolsou 22 milhões por ele (é mesmo a contratação mais cara na história do clube) e Jiménez é suplente. Mas é. E é possante, bom de pés, chuta tão forte com a canhota (pé “cego” dele) como com a bota direita, salta alto e, saltando, cabeceia lá do alto, é especialista na nobilíssima arte de bater (e bater bem) penalties, é esguio na área — e veloz a jogar nas costas da defesa –, tem o instinto que só os melhores goleadores têm. Mas é suplente.

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Feirense-Benfica, 0-2

Estádio Marcolino de Castro, em Santa Maria da Feira

Liga NOS 2017/18, Jornada 27

Árbitro: Manuel Mota (AF Porto)

Feirense: Caio Secco; Jean Sony, Luís Rocha, Briseño e Tiago Gomes; Crivellaro (Cris, 82’), Luís Aurélio (João Graça, 70’) e Tiago Silva; Luís Machado (Karamanos, 82’), Edson Farias e João Silva

Suplentes não utilizados: Miskiewicz, Flávio Ramos, Zé Manuel e Hugo Seco

Treinador: Nuno Manta

Benfica: Varela; André Almeida, Rúben Dias (Samaris, 90’), Jardel e Grimaldo (Raúl Jiménez, 58’); Fejsa, Pizzi e Zivkovic; Rafa, Cervi e Jonas

Suplentes não utilizados: Svilar, Luisão, Seferovic, Eliseu e João Carvalho

Treinador: Rui Vitória

Golos: Raúl Jiménez (59’) e Rafa (75’)

Ação disciplinar: Cartão amarelo para Tiago Silva (14’), Grimaldo (29’), Jean Sony (61’) e Edson Farias (72’); cartão vermelho para Tiago Silva (41’) e Briseño (86’)

A primeira parte em Santa Maria da Feira foi uma pasmaceira, jogada num batatal, perdão, relvado lamacento e habitado por uma “toupeira” qualquer, uma primeira parte sem qualquer defesa de ambos os guarda-redes.

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O único instante de perigo foi ao minuto 34. O Benfica recuperou a meio-campo, Pizzi lançou o ataque e lançou Rafa, o extremo disparou em direção à grande área, ultrapassou em velocidade os centrais do Feirense e, assim que lá chega, rematou, acertando em cheio no poste esquerdo de Caio. O instante que mudou o encontro foi ao 41. Tiago Silva derruba Rafa, vê o segundo cartão amarelo (o primeiro foi ao minuto 24) e é expulso pelo árbitro Manuel Mota. Já no tempo extra, o instante da vergonha: o guarda-redes do Feirense é atingido por uma tocha (também rebentaram alguns petardos em redor da baliza) vinda da bancada onde se encontram as claques que o Benfica diz não ter.

O recomeço tinha a mesma toada (Deus nos livre e guarde de outra toada assim!) e Vitória resolveu chamar Jiménez. Entrou ao minuto 58 e, 29 segundos volvidos, fez o que melhor sabe: resolver. Bola para a grande área do Feiriense, Jiménez disputa-a com Briseño e o central ganha-lhe a frente. Depois, estranhamente, o corte de Briseño é quase uma “passe” para Jiménez e o mexicano remata para a baliza (Caio Secco havia saído desta) e o primeiro do Benfica. Jiménez precisa em média de 75 minutos para marcar ou assistir. Ao 20.º jogo seguido como suplente utilizado marca o 5.º golo depois de saltar do banco. E sempre que marcou no Benfica como suplente utilizado, os encarnados nunca perderam: 12 vitórias e um empate.

Daqui para a frente, e mesmo sem acelerar muito, o Benfica esteve sempre próximo do segundo — e o Feirense, “curto”, muito distante do empate. Ao minuto 67 o ferro evitou-o. Cervi cruza desde a esquerda, Jiménez remata de primeira e acerta em cheio do poste esquerdo do Feirense. Na recarga, Cervi remata para defesa com os pés de Caio.

Ao 75 não havia ferro nem Caio. O Feirense atacava, cruzou para a área do Benfica, a defesa cortou, Jiménez completou o alívio defensivo e isolou Rafa ainda antes do meio-campo. Rafa correu. E correu, correu, correu. Isolado, driblou o guarda-redes do Feirense e rematou para a baliza sem ninguém.

Rafa que ainda esteve quase a matar um encontro já de si morto. Foi ao minuto 84. Surge novamente na grande área, agora pela direita, e novamente acerta onde não quer, no poste do Feirense. Dois minutos depois, Briseño vira André Almeida ao contrário com uma entrada de sola e é expulso. Agora sim: morto e bem morto.