Metade das matas nacionais do país foram afetadas pelos incêndios do ano passado, tendo os maiores impactos sido registados na faixa litoral da região Centro, conclui a comissão técnica independente que analisou os fogos de outubro. Dos cerca de 55 mil hectares de território classificado como matas nacionais, “cerca de 50% foram afetados pelos incêndios de 2017”, refere o relatório da comissão técnica, entregue esta terça-feira no parlamento.

O “elevado impacto” dos fogos nas matas nacionais “localiza-se na sua totalidade na região Centro de Portugal continental, sobretudo na faixa do litoral, correspondendo em grande parte às dunas móveis fixadas pela arborização”, pode ler-se no relatório, que sublinha o “papel fulcral” daquelas áreas em termos de “conservação de zonas especialmente vulneráveis” e no assegurar de funções de “recreio e enquadramento paisagístico”.

Entre as matas nacionais afetadas a comissão destaca a Mata Nacional de Leiria, “o icónico Pinhal do Rei”, percorrido pelo fogo “em quase 90% da sua área”, numa extensão de cerca de 9.500 hectares, “superando tudo o que até agora aí tinha ocorrido”. Os maiores incêndios ali registados anteriormente, segundo o relatório, terão sido em 1824, quando arderam cinco mil hectares, e em 2003, com cerca de 2.500 hectares ardidos.

Em termos nacionais, considerou ainda a comissão, “o único ano em que a afetação de matas nacionais tinha sido relevante, foi em 1993, com o incêndio de cerca de 50% de duas matas nacionais, a Mata Nacional do Prazo de Santa Marinha e a das Dunas de Quiaios”, sendo que esta última voltou em 2017 a ser consumida em 63% da sua área total.

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Depois de décadas de “elevadas e recorrentes perdas nos perímetros florestais, o ano de 2017 teve a particularidade de ser também extremamente grave nas matas nacionais”, sublinha o relatório, lembrando que em muito do território afeto ao regime florestal existiam, “de forma muito expressiva até meados dos anos 90”, condições “para a necessária reconversão de espécies pioneiras (pinheiro-bravo) em povoamentos de espécies mais exigentes e de menor combustibilidade”.

Porém, a reconversão não foi feita e os territórios “foram ardendo, com uma recorrência cada vez mais frequente, perdendo sucessivamente o património lenhoso, o capital equivalente de reinvestimento, a capacidade de regeneração natural do arvoredo e, finalmente, o solo que, entretanto, tinha sido produzido durante dezenas de anos”. Assim, muitas daquelas áreas passaram a “ser território sem interesse produtivo”, que “continuariam a arder cada vez com mais frequência”.

Em muitas destas áreas as formações que sucederam aos povoamentos florestais “foram vastas áreas contínuas, equiénias e monoespecíficas, de invasoras lenhosas”. A maior expressão da sua ocupação em território nacional encontra-se provavelmente nestes espaços de responsabilidade pública, acrescenta o documento.

Estes dados levam a comissão a considerar os resultados agora apurados “ainda mais graves” e “razão mais do que suficiente para a tomada de consciência e a implementação de medidas adequadas”, por estarem em causa milhares de hectares “que tinham sido devidamente estruturados, com um capital (material lenhoso) deveras relevante e onde um organismo público com um passado de bons serviços ao país tinha, e tem, a responsabilidade da gestão e a supremacia das decisões”.

O relatório relativo a outubro e que envolve oito distritos das regiões Centro e Norte conclui que falhou a capacidade de “previsão e programação” para “minimizar a extensão” do fogo na região Centro (onde ocorreram as mortes), perante as previsões meteorológicas de temperaturas elevadas e vento.

A junção de vários fatores meteorológicos, descreve, constituiu “o maior fenómeno piro-convectivo registado na Europa até ao momento e o maior do mundo em 2017, com uma média de 10 mil hectares ardidos por hora entre as 16h00 do dia 15 de outubro e as 05h00 do dia 16”.

Contudo, acrescenta, a Autoridade Nacional de Proteção Civil pediu um reforço de meios para combater estes incêndios devido às condições meteorológicas, mas não obteve “plena autorização a nível superior”, e a atuação do Instituto Nacional de Emergência Médica (INEM) foi “limitada” por falhas na rede de comunicações.

Reforço de meios para fogos não obteve “plena autorização superior” (e mais cinco falhas nos incêndios de outubro)