Sim, os obesos têm tendência a comer mais e a comer mais por prazer do que por necessidades energéticas. Mas a a vontade de comer não é justificação suficiente para o peso das pessoas, segundo conclui uma equipa de investigadores portugueses. Os resultados foram publicados esta quarta-feira na Scientific Reports, da Nature.

É verdade que existe uma relação, a forma como as pessoas encaram os alimentos e a alimentação pode ter impacto na variação do peso. Aliás, isso explica 10% dessa variação, como disse ao Observador Albino Oliveira-Maia, investigador na Fundação Champalimaud. A fatia é ainda mais importante se se considerar, que no presente estudo, a idade, género e educação só explicavam 6% da variação do peso, nota o investigador.

O prazer de ingerir alimentos é um comportamento natural e saudável que, na obesidade, adquire contornos particulares”, disse em comunicado de imprensa Gabriela Ribeiro, nutricionista clínica e primeira autora do artigo.

Os investigadores pegaram em dois grupos: um de obesos clínicos com recomendação de intervenção médica (123 pessoas) e outro de estudantes do ensino profissional e superior com uma ampla distribuição de pesos (278), incluindo pessoas com excesso de peso e obesos. Para cada uma destas pessoas avaliaram o impacto psicológico de viver num ambiente rodeado de comida, usando a Escala do Poder da Comida (PFS, Power of Food Scale) ajustada à realidade portuguesa — segundo Albino Maia, esta foi a primeira vez que a escala PFS foi usada em Portugal. Depois a pontuação da escala foi comparada com o índice de massa corporal (IMC), que relaciona peso e altura.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Para valores mais baixos de PFS, a probabilidade de ser obeso era menor. E a cada ponto adicional na Escala do Poder da Comida, a probabilidade de ser obeso duplicava. Ainda assim, os investigadores reforçam que o prazer de comer não explica tudo.

A escala, quando dividida nas suas três componentes, mostra mais pormenores. Quando a comida já foi provada ou quando está presente (mesmo que ainda não tenha sido provada) a escala não mostra grande diferenças entre obesos e não obesos. Na presença de comida, parece ser difícil resistir, comentou Albino Maia. Já uma situação diferente é quando a comida não está presente. Os obesos têm valores mais altos na escala, o que significa que a comida está presente no pensamento mesmo quando não o está fisicamente. A hipótese é que esta realidade possa levar a outros comportamentos nos obesos como comer compulsivamente.

Será que estas conclusões podem ser um espelho do que se passa na população portuguesa? Os autores consideram que sim, baseados nos resultados obtidos com um grupo de 865 pessoas (globalmente representativas da população portuguesa). Com este grupo não só confirmaram a relação entre a PFS e o IMC, como descartaram que a idade, género e educação tivessem qualquer influência na Escala do Poder da Comida.

Para Albino Oliveira-Maia estes resultados são muito interessantes, visto o grupo que coordena se dedicar a estudar o prazer alimentar. Com esta comparação, os investigadores conseguiram uma medida do fenómeno psicológico (comer por prazer) e da sua distribuição na população. A equipa mostrou também, que os estudos anteriores que se mostraram inconclusivos ou sem relação consideravam obesos e não obesos em separado em vez de os agruparem.