O escritor português João Pinto Coelho, vencedor do Prémio LeYa, no ano passado, com o romance “Os loucos da Rua Mazur”, participa, em maio, no Flipoços, Festival Literário de Poços de Caldas, em Minas Gerais, Brasil, divulgou a organização. A participação no Festival Literário de Poços de Caldas, que se realiza de 28 de abril a 06 de maio, centrado no Espaço Cultural da Urca, marca a estreia do escritor João Pinto Coelho, no Brasil.
“É a minha primeira vez no Brasil e num festival literário. A expectativa é muito grande, conheço o prestígio do festival, e poder estar presente num lugar tão distante, mas, simultaneamente, tão próximo, onde se fala de livros e se discute uma língua comum, tem de ser entusiasmante”, afirmou João Pinto Coelho, segundo comunicado da organização. O romance “Os loucos da Rua Mazur” vai ser editado, por esta ocasião, no Brasil, pela LeYa Brasil, e o escritor participa numa sessão de apresentação no âmbito do Flipoços. No comunicado da organização, sobre a escolha do autor português, a curadora do Flipoços, Gisele Ferreira, escreve:
Quando estava pensando em que autor português trazer ao festival este ano, busquei exatamente por algo inédito. Quando soube de João Pinto Coelho e vi que ele já tinha um livro editado no Brasil, de um assunto que inclusive me interessa muito, comecei a pesquisar sobre ele. Vi que havia ganhado o Prémio LeYa em 2017, com o ‘Os loucos da Rua Mazur’ na mesma temática, e imediatamente falei com a editora LeYa, no Brasil. Coincidência ou não, a editora estava com o livro no cronograma para lançar apenas em julho, mas quando percebeu que poderia aproveitar o Flipoços para isso, ela colocou o livro no prelo rapidinho”.
“O livro chegará aqui, em Poços de Caldas, com cheirinho de tinta fresca”, afirma a curadora, no mesmo comunicado. Antes deste título, João Pinto Coelho publicou, também pela LeYa, a obra “Perguntem a Sarah Gross”, que trata de uma pequena cidade no sul da Polónia, Oswiécim, e da forma como, em 1939, se transforma em Auschwitz, um dos símbolos do horror do holocausto do nazismo.
Pinto Coelho participa, no dia 05 de maio, na sessão de “Homenagem ao Dia Internacional da Língua Portuguesa – Mesa Lusofonia”, intitulada “Línguas e literaturas em diálogo”, no Teatro Benigno Gaiga, em Poços de Caldas, com os escritores moçambicanos Dany Wambire e Manuel Mutimucuio, e com a escritora brasileira Andrea Del Fuego, vencedora do Prémio José Saramago, em 2011, sendo moderadora Susana Ventura. Numa entrevista à agência Lusa, no início do ano, o autor referiu-se ao livro “Os loucos da Rua Mazur”, como de “grande atualidade”, o que é “trágico”.
O escritor vê atualidade “naquilo que a história, que não se repete mas rima, nos vai mostrando”. A obra de ficção alude a um episódio histórico ocorrido numa pequena localidade, no nordeste da Polónia, a 10 de julho de 1941, durante a II Guerra Mundial, quando “um grupo de cidadãos, na sua maioria cristãos, reuniram à força os seus vizinhos judeus na praça principal e, num festim de violência, conduziram-nos até um celeiro que incendiaram, queimando vivas centenas de pessoas, incluindo muitas crianças”.
O ‘arquiteto-escritor’ refere que “se consegue identificar, nos dias de hoje, muitos dos sinais que são apresentados em parte da narrativa dos [seus] dois romances” (“Perguntem a Sarah Gross” e “Os Loucos da Rua Mazur”), apesar de salvaguardar que “não exatamente com as mesmas características”, mas “provavelmente com razões idênticas”.
Sobre a sua participação no festival brasileiro, o autor afirmou: “Nestes tempos tão conturbados, onde os ataques à liberdade de expressão se sucedem, muitas vezes a par com a instrumentalização da cultura, gostava de sublinhar o papel crucial da literatura, o seu imenso poder de contrariar os maus ventos que nos sopram de todo o lado”, cita a organização no mesmo comunicado.
“Poucos dias antes de o meu livro ‘Os Loucos da Rua Mazur’ sair para as livrarias, fui atacado de forma surpreendente por uma parte significativa da imprensa polaca, que me acusava de sujar a imagem e a história do país, ao recordar a participação de muitos polacos na perseguição aos judeus durante e após o holocausto. Poucas semanas depois, foi aprovada na Polónia uma lei infame que criminaliza a simples sugestão de que essa colaboração existiu – e existiu, os historiadores provaram-no há muito”, prossegue Pinto Coelho.
O autor refere ainda que “essa tentativa de escrever uma história oficial e mandar prender aqueles que a ponham em causa mostra bem como pode ser importante o papel resistente dos artistas e dos criadores um pouco por todo o mundo”. “Havendo oportunidade, esse é um dos temas que não gostaria de deixar de abordar na minha visita ao Brasil”, destacou.
João Pinto Coelho nasceu em Londres, em 1967, licenciou-se em arquitetura, em 1992, e viveu a maior parte da sua vida em Lisboa, tendo passado diversas temporadas nos Estados Unidos, onde chegou a trabalhar num teatro profissional, perto de Nova Iorque. Em 2009 e 2011, fez parte de duas ações do Conselho da Europa que tiveram lugar em Auschwitz (Oswiécim), na Polónia, trabalhando de perto com diversos investigadores sobre o holocausto.
Foi nesta fase que concebeu e desenvolveu o projeto “Auschwitz in 1st Per-son/A Letter to Meir Berkovich”, que juntou jovens portugueses e polacos, e que o levou uma vez mais à Polónia, às ruas de Oswiécim e aos campos de concentração e extermínio nazi. O escritor tem realizado diversas intervenções públicas, uma das quais, como orador, na conferência internacional “Portugal e o Holocausto”, que teve lugar na Fundação Calouste Gulbenkian, em 2012.