O FC Porto é campeão nacional. Ou, caso se olhe para a história recente do futebol português, é possível dizer que o FC Porto é novamente campeão nacional. Os azuis e brancos enterraram um jejum de quatro anos que coincidiu com o tetracampeonato do Benfica e sagraram-se este sábado campeões nacionais pela 28.ª vez.

As vozes ouviam-se ainda no Saldanha. “O campeão voltou”, gritavam as centenas de adeptos que se juntaram ao número 48 da Avenida da República, morada da Casa do FC Porto em Lisboa. Em poucos minutos, enquanto a multidão engrossou, os adeptos – todos eles vestidos a rigor, de cachecol, camisola, gorro ou casaco – invadiram a estrada e tornaram impossível a travessia de carros. Os agentes da polícia presentes no local ainda tentaram dispersar o aglomerado mais do que uma vez e retomar a circulação, mas o esforço foi em vão: os adeptos azuis e brancos voltaram a ocupar a via e mais nenhum carro voltou a passar.

E era ali, no meio de todo o azul, que Mafalda sobressaía. Não por ter os festejos mais exuberantes ou por gritar mais alto do que todos os outros – bem pelo contrário. Mafalda sobressaía porque tinha ao pescoço um cachecol do Sporting. A explicação até era bastante simples. “Fui ver o jogo do Sporting com o meu namorado. Ele é do FC Porto e quando acabou o jogo quis vir para aqui festejar”, explicou. E não há mau perder? “Não! Mau perder? Nada disso”.

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Entre os cânticos de louvor a Sérgio Conceição e a Marega – e uns menos educados dedicados ao rival Benfica – surgia um que visava aquele que é provavelmente a cara, alma e coração do FC Porto. Jorge Nuno Pinto da Costa, presidente do clube desde 1982. Enquanto isso, Diogo estava afastado da confusão, de braços cruzados, a sorrir. Os cabelos brancos deixavam transparecer que celebrar um título não é nada de novo e a falta de sotaque quando começou a falar contava que é um portista lisboeta.

“Lá em casa somos dez irmãos. São nove do Benfica e eu do FC Porto. Estes últimos anos foram complicados mas agora estou a desforrar-me”, disse, entre sorrisos. Os filhos também torcem pelos azuis e brancos e conta com alegria que é emocionante ver um neto já a celebrar as vitórias do clube do coração. Quanto a comemorar em Lisboa, Diogo não tem dúvidas: “É especialíssimo”. Atribui muita da responsabilidade pelo campeonato a Sérgio Conceição, que diz ter “recuperado a mística” que faltava ao FC Porto nos últimos anos. E agora, no futuro? “Esta mola humana é muito difícil de parar”.

Os agentes da polícia circulavam com passos apressados quando começaram a surgir os spotters. A certa altura, a massa azul e branca passou de um lado para o outro da estrada, colocando-se no sentido da Avenida da República que vai para o Saldanha. O destino era apenas um: o Marquês de Pombal. As centenas de adeptos que se concentraram junto à Casa do Porto deslocaram-se para uma caminhada ordenada e sem distúrbios; afinal, festa era a palavra de ordem.

Além da alegria, parecia existir um sentimento que todos os adeptos do FC Porto partilhavam: a incredulidade com o facto de estarem tantas pessoas a dirigirem-se para o Marquês de Pombal. Um atrás do outro, os adeptos olhavam para trás e viam a massa humana que os precedia para depois soltarem exclamações como “Somos bués!” ou “Ainda dizem que o Porto é só lá em cima”.

Miguel fez todo o percurso com o telemóvel na mão, enquanto fazia uma videochamada com a mãe, que está no Porto. À frente, o timoneiro da família liderava a mulher e as três filhas. O entusiasmo era visível: parecia um adulto que virou miúdo, a olhar para todo o lado, a responder às buzinas dos carros com o braço erguido no ar e com a mãe sempre no ecrã no telemóvel.

Chegados ao Marquês, alguns adeptos subiram à estátua e lideraram os festejos. Cá em baixo, centenas de pessoas gritavam palavras de ordem e uniam-se em abraços de felicidade. Ainda que ocupassem menos espaço do que as celebrações que temos visto nos últimos anos – com o Marquês de Pombal inundado de adeptos do Benfica -, os portistas faziam-se ouvir e obrigaram ao corte da rotunda do centro de Lisboa. A certa altura, são acendidas tochas vermelhas. O incómodo é ultrapassado com o cântico “penta ciao”, em alusão ao pentacampeonato que o Benfica não conseguiu carimbar, cantado em uníssono.

André Rodrigues olha algo maravilhado para as bandeiras que esvoaçam. Apesar de estar feliz, garante que “todos os portistas queriam que fosse só amanhã [domingo]”. Elogia Sérgio Conceição mas não esquece Marega, Brahimi e claro, como sempre, Pinto da Costa. Ao contrário de Diogo, o sotaque revela que é um portista deslocado da terra natal.

“Vim para Lisboa em 2013, como campeão. Desde que estou cá, foi sempre o Benfica. Achei que era uma maldição minha! Mas agora acabou”, conta, entre gargalhadas.

O FC Porto beneficiou do empate entre Sporting e Benfica e sagrou-se campeão nacional ainda este sábado. Mas os já consagrados detentores do título ainda jogam este domingo, frente ao Feirense, no Estádio do Dragão, naquele que promete ser o jogo da derradeira festa portista. Antes disso, Lisboa foi azul a branca por uma noite.