A anunciada intenção do CaixaBank de retirar o BPI de bolsa é “o corolário lógico” do “declínio do setor financeiro português” e da estratégia do banco espanhol com vista a uma “unidade ibérica”, segundo analistas ouvidos esta segunda-feira pela Lusa.

Para Eduardo Silva, da corretora XTB Portugal, a retirada de bolsa do BPI “significa [que os espanhóis do CaixaBank] procuram maior flexibilidade e sair da ribalta para fazer crescer a empresa”. “Com fontes privadas de financiamento é menos atrativo e flexível estar cotado”, sustenta o analista, explicando que “o custo de financiamento ao aumentar a dívida tem um custo na cotação e torna o financiamento menos atrativo”.

Na opinião de Eduardo Silva, esta decisão do CaixaBank “não é uma surpresa”, desde logo porque, “considerando a percentagem de controlo e o nível de ações simbólico que restava em ‘free float’ [dispersão no mercado], a saída de bolsa era sempre uma opção”. “Poderiam ter optado por ceder controlo, mas esta estratégia parece lógica nesta fase”, sustenta.

Também para João Lampreia, do BIG, a retirada de bolsa do BPI “acaba por ser uma consequência natural”, tendo em conta a compra pelo CaixaBank da participação de 8% da Allianz (elevando para 92% a sua percentagem no BPI) e o prémio de 27,9% oferecido pelo restante capital face à cotação da Oferta Pública de Aquisição (OPA) realizada no ano passado.

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“O CaixaBank já tinha sugerido que a ideia era mesmo retirar o título de bolsa”, recorda João Lampreia, para quem esta é “mais uma última notícia de uma história mais comprida” e “o corolário de tudo o que tem acontecido na banca portuguesa”, nomeadamente em termos de fusões de aquisições, restando agora o BCP como único banco privado cotado.

Na opinião do analista do BIG, para os acionistas do BPI esta oferta do CaixaBank “acaba por ser um prémio implícito interessante, que de outra forma dificilmente poderiam obter com uma liquidez já muito reduzida do título”. “Acaba por se iluminar um título que estava com muito pouca liquidez e com muito fraca visibilidade”, sustenta João Lampreia, considerando que “o quase fantasma do BPI” que estava atualmente cotado “já não acarretava nenhuma diversificação na bolsa portuguesa”.

Também contactado pela Lusa, o diretor de negociação do Banco Carregosa, João Queirós, encara a saída de bolsa do BPI como “o corolário lógico de um conjunto de passos que têm alguma lógica e devem obedecer a uma determinada estratégia” do CaixaBank, muito provavelmente no sentido da “constituição de uma unidade mais ibérica”.

“Provavelmente, o CaixaBank fará depois uma integração de sistemas e do ‘backoffice’ no âmbito da perspetiva de digitalização do setor bancário que se está a verificar nas economias mais ocidentalizadas”, sustentou, considerando “lógico” que o banco espanhol “queira agora ir buscar economias de escala e fazer a integração de alguns temas, até porque em termos de ‘marketing’ pode fazer algum sentido começar uma campanha em Espanha e prolongá-la na Península Ibérica”.

No que se refere ao impacto desta operação no mercado bolsista português, os três analistas são unânimes em afirmar que será muito reduzido. “A dimensão do mercado bolsista não é muito afetada, uma vez que a percentagem em ‘free float’ neste momento era simbólica”, sustenta a XTB Portugal, acrescentando que, “em termos futuros, esta decisão é sempre reversível e pode ser um período de consolidação”.

Ainda assim, segundo Eduardo Silva, “obviamente que ter empresas de primeira linha com forte ‘market cap’ e liquidez é importante para o PSI20 [principal índice da bolsa de Lisboa] no que diz respeito a visibilidade”, pelo que “são sempre negativas fases como as atuais, em que o índice está desfalcado”.

João Lampreia, do BIG, considera até “positiva” para o mercado a saída de “um título que tinha muito pouca liquidez e não tinha visibilidade nenhuma”: “Acho que elimina alguma incerteza e um título para o qual já ninguém olhava”, sustenta o analista, para quem “o problema no mercado português é que tem ainda muitos títulos que são esqueletos”.

João Queirós, do Banco Carregosa, recorda que as reduzidas liquidez e frequência de negociação dos títulos do BPI representavam já “um risco para os investidores”. “Para um investidor de médio/longo prazo ter um título que não varia e que não paga dividendos, que é o que acontece em muita da banca, é um maior risco, é um investimento estacionado que não produz rendimento”, refere.

Em 10 de fevereiro de 2017, o BPI deixou de integrar o principal índice da bolsa portuguesa (PSI20), depois de o CaixaBank ter ficado com 84,5% no capital do banco no âmbito de uma Oferta Pública de Aquisição (OPA), tendo-se mantido no índice geral. O CaixaBank anunciou no domingo que vai requerer a retirada do Banco BPI de bolsa, depois de ter acordado comprar ao grupo Allianz mais 8,425% do capital social, ficando assim com 92,935% do capital da instituição.

Em comunicado enviado ao regulador do mercado acionista, o grupo espanhol que “é intenção do CaixaBank requerer, nas próximas semanas, ao presidente da Mesa da Assembleia Geral do Banco BPI, uma reunião para aprovar a perda de qualidade de sociedade aberta do Banco BPI”. Pelas 13h24, as ações do BPI seguiam a subir 21,15% para 1,43 euros, aproximando-se dos 1,45 euros que o CaixaBank oferece para comprar o restante capital disperso em bolsa.