A Coca-Cola e a McDonald’s estão entre as empresas patrocinadoras do XVII Congresso de Nutrição e Alimentação, organizado pela Associação Portuguesa de Nutrição (APN). O apoio destas marcas está a gerar controvérsia no interior da própria associação, com alguns nutricionistas a dizerem-se chocados com este tipo de parcerias. Responsáveis desvalorizam e justificam: sem estas parcerias não era possível fazer um congresso internacional.

A informação é avançada pelo jornal Público, que ouviu pelo menos um nutricionista descontente, sob anonimato. “Existe uma guerra dos nutricionistas contra os alimentos processados, foi, aliás, aplicada uma taxa ao açúcar, e, ao mesmo tempo, estabelecem-se parcerias com marcas que produzem alimentos prejudiciais à população, dando-lhes palco para que propagandeiam os seus produtos que são responsáveis por muitas doenças crónicas?”, questiona.

Este mesmo nutricionista contou ao Público que o congresso de nutricionistas chega a parecer “uma feira alimentar, mais do que um congresso de nutrição”. “As pessoas saem de lá com sacos cheios de sopas instantâneas, iogurtes, refrigerantes, gelados. É uma espécie de hipermercado”, criticou.

Mesmo dizendo acreditar que o congresso da Associação de Nutrição terá toda a “isenção e rigor”, Alexandra Bento, bastonária da Ordem dos Nutricionistas, reconheceu que, num cenário ideal, não deviam existir este tipo de parcerias. “O congresso da Ordem dos Nutricionistas reuniu para cima de mil congressistas, no ano passado, e foi isento de patrocínios, isto é, viveu apenas do valor de inscrição de cada participante. Entendemos que não podia ser de outra maneira, mas cabe a cada um criar as suas regras de conduta”, afirmou, em declarações ao Público.

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Célia Craveiro, presidente da APN, desvalorizou a questão, garantindo que não existe qualquer conflito de interesses. “São essas parcerias que permitem fazer um congresso internacional que facilita o acesso à ciência”, explica. Questionada pelo mesmo jornal, a presidente da APN ainda junta outro argumento: “Os profissionais de saúde e a indústria alimentar devem trabalhar em conjunto, numa lógica de procura de consensos e não numa lógica de exclusão. Mais do que questionar o que as pessoas levam para casa nos sacos, deviam ver a dinâmica do congresso”.

Também Pedro Graça, director do programa alimentar da Direção-Geral de Saúde e membro da comissão científica do congresso, garante que existe uma total “transparência” e “blindagem da gestão científica do congresso à intromissão da indústria alimentar”.

Esta não é a primeira vez que as parcerias assumidas entre a APN e marcas como a Coca-Cola geram controvérsia. Já no ano passado, esta associação entre nutricionistas e indústria alimentar mereceu críticas idênticas, com Célia Craveiro a usar os mesmos argumentos para rematar a questão: “A comissão científica/organizadora actua com total independência, não havendo, assim, qualquer conflito de interesses.”