Há nove séculos, o Mosteiro de Leça do Balio, em Matosinhos, era uma das paragens obrigatórias na peregrinação até Santiago de Compostela. Lá, os caminhantes encontravam apoio e acolhimento. Entretanto, o monumento fechou as portas e esteve durante anos ao abandono. Agora vai voltar a abri-las –- tanto aos peregrinos como a qualquer visitante. E a inauguração é já no próximo sábado, dia 19 de maio.

No entanto, só daqui a cerca de três anos é que os jardins do mosteiro vão ganhar uma nova cara, depois de uma intervenção que vai custar mais de 10 milhões de euros à Lionesa, a empresa responsável pelo investimento, e que vai juntar os arquitetos Sidónio Pardal e Siza Vieira.

Um “templo” no meio de um jardim

“Visionário” -– é esta a palavra que o arquiteto paisagista Sidónio Pardal escolhe para classificar o projeto que junta, pela primeira vez, os dois arquitetos e amigos de longa data.

Enquanto Sidónio Pardal ficará responsável por intervencionar os 3,8 hectares do jardim, que ligam o mosteiro ao complexo empresarial da Lionesa, Siza Vieira vai dar vida à obra a que apelidou de “templo” –- uma estrutura de 400 metros quadrados de várias alturas, feita de betão pintado de branco. Nas paredes, serão impressos esquissos em baixo relevo e, no interior, levantar-se-á uma estátua de mármore com dois metros de altura –- o peregrino de Siza Vieira.

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“O edifício do Siza tem uma espiritualidade, uma elevação civilizacional altamente emocionante. Ainda não está construído, mas já me posso imaginar a estar lá e é emocionante”, comentou Sidónio Pardal na visita de imprensa ao mosteiro. O arquiteto paisagístico revelou, ainda, que o jardim será constituído por “14 estâncias muito singulares”, “pontos de pausa para o silêncio, para a vigília, para a espera, para a contemplação e para o encontro”.

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As obras iniciam-se na altura da Páscoa e 2020 é a data avançada por Pedro Pinto, administrador da Lionesa, para a conclusão. Já Sidónio Pardal é mais cauteloso com o prazo final e diz acreditar que “dentro de três ou quatro anos”, o espaço já “terá uma maturidade muito interessante”.

Quanto ao investimento, não há ainda um teto definido. Pedro Pinto explica que o orçamento “não está fechado” e que a empresa pretende investir consoante o interesse que o monumento despertar no público.

Voltar a ser paragem na peregrinação

Um dos objetivos da empreitada é que o mosteiro, classificado como Monumento Nacional desde 1910, volte a ser um ponto de paragem dos peregrinos que percorrem o Caminho Português da Costa. Joel Cleto, arqueólogo que está envolvido no projeto, explica que, naquele local, “o peregrino pode decidir se quer seguir pelo caminho antigo –- o caminho primitivo em direção a Braga -–, se quer seguir pelo caminho da costa ou pelo caminho central.” Para além disso, à entrada do mosteiro já se encontra uma esplanada e “uma área com medicamentos, pensos e uma série de coisas práticas para apoiar os peregrinos”, adianta.

Já Pedro Pinto, da Lionesa, explica que, com este investimento no património, a empresa quer criar uma “nova centralidade turística”. É por essa razão que se prevê a criação da “Plataforma 234” que “vai funcionar, na Internet, como um pólo de divulgação e captação de turistas que estejam interessados em ser caminheiros”, revelou.

Para já, tanto os visitantes como os turistas vão poder ver a exposição gratuita “Monasterium km234”, que se estreia no próximo sábado e abandona as paredes do interior do mosteiro a 16 de dezembro. E não é à toa que o número 234 é escolhido – são 234 os quilómetros que separam o Mosteiro de Leça do Balio de Santiago de Compostela.

A exposição, que se expande por meia dúzia de coloridas salas, aposta em grande imagens e ilustrações, acompanhados de pequenos textos. Já a visita guiada, um formato que estará disponível (e será adaptado) para várias idades, dura cerca de uma hora.

Nesse espaço de tempo, o visitante conhece a história e a simbologia em volta do apóstolo São Tiago e descobre os trilhos e as curiosidades dos caminhos percorridos por centenas de milhares de peregrinos a cada ano até Santiago de Compostela. Mas também relembra o passado daquele mosteiro, doado por D. Afonso Henriques à Ordem dos Hospitalários no século XII e onde, dois séculos depois, se realizou o primeiro casamento por amor da monarquia portuguesa, o de D. Fernando e Dona Leonor Telles.

Já em setembro, o Mosteiro de Leça do Balio regressa à época medieval num dos maiores eventos do concelho -– a feira “Os Hospitaleiros no Caminho de Santiago”. E, neste ano, os visitantes vão poder, pela primeira vez, entrar e circular dentro do mosteiro e ver a exposição. “É um feliz casamento”, remata Joel Cleto.