O futebol espanhol é característico e inconfundível: circulação de bola como ninguém, controlo do espaço e do ritmo de jogo exímio e uma noção quase perfeita de todos os momentos de uma partida. Tudo isto alicerçado em onze jogadores donos de uma técnica irrepreensível. Perante um teoricamente frágil Irão, esperava-se que isso chegasse e sobrasse para uma vitória folgada, mas não foi bem assim. Chegar, até chegou, mas o futebol espanhol demorou a fazer efeito e quase não bastava para derrubar a muralha defensiva iraniana. 

O primeiro tempo começou como todo o jogo viria a ser, na realidade — posse de bola espanhola, largura a todo o campo e aproximações à baliza adversária. Mas, na primeira parte, foi só isso que aconteceu: aproximações. Passe para a direita, passe para a esquerda, toque em habilidade para a frente e… nada. Geralmente, era este o resultado dos ataques espanhóis. No total, foram 399 passes ao longo dos 45 minutos iniciais, traduzidos na espetacular quantia de um remate à baliza. Ao intervalo, 71% de posse de bola e um muro de betão pela frente.

Com o apito para o início do segundo tempo, começou a mudança de atitude espanhola. La Roja, que até equipava de branco, cedo perdeu a inocência revelada no primeiro tempo e começou a abrir espaços na defesa iraniana. Estava percebido o segredo: para entrar na muralha do Irão, bastava tirar um adversário da frente antes de soltar o esférico. Parece óbvio, mas não foi para a Espanha, durante metade do jogo. Os iranianos defendiam com dez homens dentro da área (ou nas suas imediações) e, frequentemente, os remates espanhóis tinham como destino as pernas adversárias.

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No segundo tempo, a história era diferente e a Espanha começava a fazer buracos num muro que nunca se desmoronou, mas que não se livrou de uma grande nódoa negra: ironia das ironias, depois de os espanhóis verem os remates bloqueados pelas pernas opositoras, foi a vez da defesa iraniana tentar cortar a bola e ver o esférico embater nas pernas de Diego Costa, terminando no fundo das redes iranianas.

Estava desfeita uma igualdade que parecia poder durar até ao fim, tamanha era a consistência defensiva do conjunto de Carlos Queiroz (e, se nem sempre quantidade é sinónimo de qualidade, neste caso, o elevado número de iranianos perto da sua baliza quase funcionou na perfeição) e carimbada a primeira vitória espanhola no Mundial.

No total, 825 passes foram trocados pela seleção espanhola, com 90% de eficácia nos mesmos. O número de remates à baliza aumentou no segundo tempo e a Espanha juntou-se a Portugal na liderança do grupo B. O segredo esteve sempre lá; bastava aos espanhóis perderem a inocência.