Enviado especial do Observador à Rússia (em Moscovo)

A escolha do Homem do Jogo no Polónia-Senegal foi das mais duvidosas nestes primeiros dias do Campeonato do Mundo, mas também não era fácil fazer uma avaliação ao prémio porque, entre os senegaleses, houve mais do que uma individualidade a destacar-se entre um coletivo forte montado por Aliou Cissé. A honra acabou por ir parar a M’Baye Niang, avançado do Torino que beneficiou de um erro inexplicável a meias entre Krychowiak, Szczesny e a defesa polaca para apontar aos 60 minutos o segundo golo dos africanos, que seria vital para o triunfo a abrir o Mundial após 16 anos de ausência da prova. Como tal, e como tem acontecido com Cristiano Ronaldo, foi à sala de imprensa. Na nossa lista top-5 de tentativas na zona mista entre os senegaleses, percebemos que seria a mais complicada. Afinal, acabou por ser ao contrário.

A surpresa que começou a ser escrita por um central de Curitiba que jogou no Bragança (a crónica do Polónia-Senegal)

Olhemos para as notas no caderno e vejamos: temos Gueye, que por acaso até fez um jogão no meio-campo, que esteve nos Jogos Olímpicos de 2012 e vai ser treinado no Everton na próxima temporada pelo português Marco Silva; temos Kouyaté, que além de fazer também parte dessa geração que foi aos Jogos foi companheiro de João Mário no West Ham; temos Alfred N’Diaye, que passou pelo Betis e esteve na última temporada emprestado pelo Villarreal ao Wolverhampton de Nuno Espírito Santo, Rúben Neves, Diogo Jota e companhia; temos Niang, que jogou no AC Milan e no Torino tendo como técnico Mihajlovic; temos Keita Baldé, formado no Barcelona e que se transferiu da Lazio para o Mónaco de Leonardo Jardim, João Moutinho e Rony Lopes na última temporada. E ainda havia Birou Diouf e Moussa Sow, que também têm as suas histórias que merecem ser contadas, como no caso do último, que é um dos proprietários da nova equipa San Diego 1904, nos Estados Unidos (tem menos de um ano de existência), a par de Demba Ba, Hazard e Cabaye. No final, acabamos por apanhar o avançado que marcou o segundo golo da equipa. E que também tem a sua história, com passagens por França, Itália e Inglaterra.

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Niang foi assistido, voltou ao campo e aproveitou um erro dos polacos para marcar pelo Senegal (FRANCISCO LEONG/AFP/Getty Images)

Nascido em Meulan-en-Yvelines, Niang é um nome familiar há algum tempo mas que tem apenas 23 anos. Logo aqui, percebe-se que foi um fenómeno precoce. E confirma-se: aos 16 anos já se tinha estreado nos seniores do Caen, após passagens na formação pelos modestos Basse-Seine Les Mureaux e Poissy. Em 2012, e já depois de ter feito testes em alguns clubes ingleses como o Arsenal, o Everton ou o Tottenham, surge de forma surpreendente no AC Milan, que depositava grandes esperanças no miúdo das camadas jovens de França. Até 2017, fez um total de 79 jogos em todas as provas pelo histórico clube italiano, sendo nesse período também emprestado a Montpellier, Génova, Watford e Torino, clube que garantiu opção de compra.

Foi também nesse ano que tomou a polémica decisão de passar a representar o Senegal, depois de ter assegurado que, a nível de seleções, queria jogar pelo conjunto principal da França. Como a oportunidade nunca surgiu, acabou por aceitar o convite do conjunto africano, o que lhe valeu a presença neste Campeonato do Mundo. A seu favor nesse sonho também jogou contra uma suspensão que teve entre 2012 e 2013 das camadas jovens gaulesas, após ter desrespeitado o regulamento interno e a hora de chegada num estágio onde foi apanhado numa discoteca. Antes e depois, esse lado de enfant terrible foi sempre uma presença constante e teve dois grandes acidentes de Ferrari, o primeiro dos quais quando ainda não tinha carta de condução e que envolveu outras viaturas (antes tinha sido apanhado também sem o título e tentou passar como se fosse Bakaye Traoré, o que não conseguiu e acabou por ser detido). Como jogador, é um talento com um enorme potencial por explorar.

Niang numa imagem com Kondogbia no dérbi de Milão entre Inter e AC Milan, em novembro de 2016 (Valerio Pennicino/Getty Images)

Enquanto a equipa polaca vai variando na zona mista entre os que falam muito e abertamente à imprensa nacional (como Krychowiak, Piszcek, Thiago Cionek ou Szczesny, o que é mau porque acabam por ficar ali demasiado tempo e fazem sinal de que têm de seguir para o autocarro quando chegam ao local onde estão concentrados mais jornalistas estrangeiros) e os que quase “matam” com os olhos ao serem abordados, como Milik ou Blaszczikowski, no conjunto africano, que tem vários jornalistas todos com o mesmo polo azul escuro com “Presse Senegal” nas costas, a divisão é feita sobretudo por titulares e suplentes. Como Keita Baldé, que não jogou e puxa do velho truque do telemóvel para se fazer despercebido e não falar. Depois, há outros casos como Niang, que parou em cinco locais diferentes sempre a ajeitar com orgulho o prémio de Homem do Jogo que carrega. E são só elogios para Sinisa Mihajlovic, o novo técnico do Sporting que já foi descrito como “fascista” e “machista”.

Pardon, pardon, Niang. Duas perguntas?
Sim, vai.

Como é que viu o jogo?
Correu muito bem, cumprimos a estratégia que preparámos a semana toda para este jogo com a Polónia e ganhámos, estou muito contente e orgulho. Dei o meu máximo em prol da equipa e correu bem.

E o golo?
Percebi que a bola ia parar ali, acreditei que podia lá chegar e tive a felicidade de marcar.

O Mihajlovic foi apresentado como treinador do Sporting, em Portugal….
Ah foi?

Sim, foi ontem. Que opinião tem dele?
Fizeram uma boa escolha, boa escolha. É um grande treinador e tem muito para dar ao Sporting.

E como foi a vossa relação?
Comigo foi alguém que me fez evoluir e por isso só lhe peço desejar boa sorte.

Mas tem fama de ser também um pouco excêntrico…
Não, podem achar isso e pode ter essa fama mas para mim é carácter, tem um grande carácter e é um grande treinador.

E o Portugal-Espanha, o que achaste?
Bom, bom!