Este Campeonato do Mundo tinha tudo para correr mal a Samuel Umtiti, um dos rostos de uma nova geração francesa que foi vice-campeã europeia e está agora na final do Mundial. E podia correr mal de várias formas, do penálti desnecessário cometido frente à Austrália aos problemas no joelho que o foram colocando sempre em risco nos jogos a eliminar. Chegados às “meias”, o central está calçado em relação à presença na Rússia e o golo decisivo com a Bélgica foi o coroar disso mesmo, curiosamente no dia em que, há dois anos, teve uma das maiores desilusões ao perder o jogo decisivo do Europeu.

Umtiti começou Mundial com pé esquerdo (ou mão esquerda), fazendo um penálti frente à Austrália (LUIS ACOSTA/AFP/Getty Images)

Nascido nos Camarões, o jogador de 24 anos chegou com apenas dois anos a França e fez praticamente toda a formação no Lyon, uma das escolas com maior reputação no país. Nessa altura ainda era avançado, depois pela rapidez acabou por ser um pouco mais encostado a extremo, desceu depois para lateral esquerdo e gostou. Por ali ficou, sempre com aquela obrigatoriedade de fazer os trabalhos de casa para poder ir aos treinos, até às primeiras experiências no eixo central da defesa, com aquele pormenor de ser raro encontrar elementos com o seu perfil e esquerdinos para a posição. Com apenas 17 anos, tinha chegado à equipa sénior e marcou presença em cerca de 97% dos encontros até ser vendido ao Barcelona, em 2016.

Fez também trajeto nas seleções mais jovens gaulesas, recusando o convite da antiga glória Roger Milla para passar nos seniores para os Camarões, país que visitou apenas duas vezes e do qual pouco ou nada se recorda. Esperou pela sua oportunidades, foi aprendendo com alguns erros e chegou não só à seleção francesa no Europeu de 2016 mas também aos blaugrana, a quem se apresentou de forma original no canal do clube ao assumir que sempre gostou de fazer a sesta a seguir ao almoço, em casa ou na praia, mas que, como a namorada conhecia a Cidade Condal, era muito provável que andasse a dar algumas voltas.

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Hoje, dois anos e quatro títulos depois (um Campeonato, duas Taças e uma Supertaça de Espanha), é elogiado por todos, dos dirigentes à grande figura da equipa, Messi. “Treina como joga, não se poupa em nada. Fora de campo é uma excelente pessoa, um grande rapaz. Honestamente não conhecia assim muito dele quando chegou mas ao ver os treinos não me surpreende em nada o destaque que tem nos jogos, vejo bem a qualidade que tem”, comentou ao jornal Marca. Umtiti é isso tudo e alguém sempre divertido. A forma como dançou a festejar o único golo do França-Bélgica é uma boa amostra, mas este é o jogador que, já no Mundial, gozou consigo mesmo colocando nas suas páginas oficiais um meme sobre o penálti com a Austrália, e que está sempre presente nas brincadeiras do animador de serviço do grupo de Deschamps, Paul Pogba.

Central defrontou o companheiro Messi nos oitavos do Mundial, vencendo por 4-3 (ROMAN KRUCHININ/AFP/Getty Images)

No entanto, neste ano de 2018 esteve para ser notícia mas fora dos relvados: apesar de ter um contrato de longa duração com o Barcelona, o francês e o seu empresário terão sido contactados por intermediários do Real Madrid para saberem a vontade que teria em mudar-se para o Santiago Bernabéu, com os merengues a pagarem a cláusula de rescisão de 60 milhões de euros além de reverem as condições financeiras para poder garantir o futuro do clube na posição ao lado do companheiro de equipa e seleção Varane. Logo ele que, quando era miúdo, jogava sempre com o Real no computador e nas consolas, como chegou a admitir. No meio de várias notícias, Bartomeu antecipou-se e fechou um novo vínculo até 2023, acabando com a especulação que começava a aumentar na imprensa da capital espanhola.

Agora, Umtiti é o herói gaulês da passagem do conjunto comandado de Deschamps à final do Campeonato do Mundo, onde irá defrontar Inglaterra ou Croácia. Logo ele que tem nas quatro grandes referências do futebol antigos campeões ou vice-campeões mundial: o guarda-redes alemão Oliver Kahn, finalista vencido em 2002, “porque era imperial e muito complicado de sofrer golos”; o defesa italiano Paolo Maldini, derrotado na final de 1994, “por ver vários vídeos e ter nele um líder”; o médio ofensivo brasileiro Ronaldinho, campeão em 2002, “pela capacidade de fintar e ter sido um dos melhores jogadores do mundo”; e o avançado brasileiro Ronaldo, bicampeão em 1994 e 2002, “porque fintava qualquer e marcava muitos golos”. Daqui a alguns anos, um qualquer Umtiti poderá referir-se da mesma forma ao defesa de 24 anos que voltou a ser decisivo.