Os números farão sempre parte do lado racional de um jogo que tem como base as emoções. No futebol, eles servem para tudo: para os treinadores relativizarem no exterior colocando essa motivação extra no balneário; para os jogadores ganharem objetivos individuais entre o sucesso coletivo; para os jornalistas perceberem melhor a linguagem inaudível que vem dos bancos ao longo da partida; para os adeptos em geral acrescentarem algo às suas conversas e conhecimentos. Desses números nascem recordes que podem perdurar no tempo; desses números criam-se maldições que se arrastam com o tempo.

Danijel Subasic, o experiente guarda-redes que surgia no Campeonato do Mundo da Rússia como um dos possíveis elos fracos de uma Croácia que tem uma constelação de estrelas do meio-campo para a frente, está no centro de mais um desses factos recordados antes dos jogos, neste caso uma final da maior prova de seleções: nas últimas edições da competição, o guardião do conjunto derrotado ou era ou passou pelo Mónaco agora comandado por Leonardo Jardim. Foi assim com Barthez, que perdeu pela França a final diante da Itália em 2006 (esteve no clube entre 1995 e 2000); foi assim com Stekelenburg, derrotado ao serviço da Holanda pela Espanha em 2010 (e que passaria pelo conjunto em 2014/15); foi assim com Sergio Romero, argentino que caiu perante a Alemanha no prolongamento em 2014 num ano em que esteve cedido pela Sampdória aos monegascos. Agora, no outro lado da “magia” dos números, não haverá três sem quatro ou à quarta será de vez?

A base da solidez defensiva croata: o guarda-redes Subasic e os centrais Vida e Lovren (JOHANNES EISELE/AFP/Getty Images)

Qualquer que seja a resposta no final do encontro, confiança parece não faltar ao guarda-redes de 33 anos do Mónaco desde 2012, que teve apenas mais dois clubes na carreira (Zadar e Hajduk Split). E depois de uma primeira fase em que revelou sempre segurança nos triunfos da formação de Dalic diante de Nigéria, Argentina e Islândia, Subasic foi o herói na passagem aos quartos ao travar três grandes penalidades da Dinamarca – repetindo o feito do português Ricardo, em 2006, com a Inglaterra – e voltou a ter um papel determinante no desempate com a Rússia, num encontro onde se lesionou no final do tempo regulamentar mas aguentou por não haver mais alterações possíveis. Depois da Inglaterra, segue-se a França.

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E existe um outro motivo “paralelo” a alimentar o sonho de vencer pela primeira vez o Campeonato do Mundo, num epílogo de uma campanha que já é histórica para o conjunto balcânico: faz em 2018 dez anos certos que Subasic perdeu o melhor amigo de infância, o também jogador Hrvoje Custic, que alinhava também no Zadar quando, no final de março de 2008 num encontro frente ao HNK Cibalia, colidiu com violência com a cabeça contra um muro, acabando por morrer uns dias em virtude de uma infeção quando estava em coma induzido. Um dia que o guarda-redes não mais esqueceu.

A falta de angústia do guarda-redes antes do penálti, por Subasic e Schmeichel (a crónica do Croácia-Dinamarca)

É por isso que, em todos os jogos, Subasic utiliza por baixo uma camisola com a fotografia do amigo e a frase “Forever 24”, idade com que o médio ofensivo acabou por falecer. Depois do encontro com a Dinamarca, o guarda-redes tirou a camisola principal e mostrou a imagem de Custic, o que lhe valeria uma repreensão da FIFA devido às proibições existentes nos regulamentos para esse tipo de ações. Diante da Rússia, ia repetir o gesto mas acabou por “aguentar-se” no limite, também devido à célere intervenção da manager da equipa, Iva Olivari. Contra a Inglaterra, não evitou as lágrimas enquanto apontava para o céu, recordando o melhor amigo desaparecido há uma década.

A camisola com a imagem de Custic, que chegou a merecer uma repreensão devido aos regulamentos (Alex Livesey/Getty Images)

“Segredo para defender os penáltis? Já sou um pouco velho, tenho quase 34 anos e isso ajuda!”, respondeu após o encontro com os escandinavos, antes de explicar a homenagem ao amigo: “Hrvoje está sempre comigo, não só na minha camisola mas também no meu coração. Vocês sabem a história do que aconteceu com ele, da minha parte acho que não tenho de dar muitas mais explicações em relação a isso…”. “Ele tem uma energia positiva muito grande por ele e está sempre a mostrar as suas emoções, incluindo hoje”, referiu Vida, defesa que andou com o guarda-redes ao colo antes de… caírem nas celebrações.