Há um documento a dar que falar no Sporting. Mais a favor ou totalmente contra, mas está a dar que falar esta terça-feira na blogosfera leonina. Um texto com 24 parágrafos, assinado por um grupo de sócios do clube onde se incluem Miguel Poiares Maduro, Samuel Almeida, Rodrigo Roquette, Jaime Mourão Ferreira (todos presentes na convenção Sporting Talks, que se realizou há cerca de duas semanas na Universidade Católica, em Lisboa), Nuno Wahnon Martins e Philippe Mendonça, onde não são utilizados exemplos práticos do passado mas onde os mesmos ficam nas entrelinhas como alerta para o futuro a breve e médio prazo. Um conjunto de ideias que visa “obrigar” o universo verde e branco a parar e refletir sobre o momento atual.

Recuemos, por exemplo, a 2011. O Sporting atravessava um período particularmente conturbado após a saída de José Eduardo Bettencourt com menos de dois anos de mandato cumpridos (e que tinha sido sufragado com 90% dos votos, na corrida contra Paulo Pereira Cristóvão) e houve uma multiplicação de listas à presidência do clube, algumas tentando juntar o máximo de sensibilidades possível para alcançar o maior número de franjas do eleitorado verde e branco. Estiveram para ser sete, ficaram pelas cinco. E o vencedor de então, Luís Godinho Lopes, começou a perder no dia em que ganhou: menos de metade dos sócios tinha votado em si (36,55%, contra 36,15% de Bruno de Carvalho, que até teve um número de votantes maior) e não tinha o elenco homogéneo que necessitava para superar essa barreira. Menos de dois anos depois, também caiu.

Essa é apenas uma das ideias que ressalta do texto assinado pelo grupo de sócios supracitado, que coloca também o enfoque num assunto muitas vezes abordado mas que ainda carece de decisão: a possibilidade ou não de Bruno de Carvalho, antigo presidente do Sporting, e Carlos Vieira, ex-número 2 do mesmo elenco diretivo, poderem concorrer. “É importante atender seriamente à conjuntura particular em que estas eleições arriscam ter lugar. Todos os subscritores deste apelo foram profundamente críticos do comportamento gravemente anti-estatutário do presidente recentemente destituído. É nossa opinião, no respeito da autonomia do órgão social competente, que tal comportamento merece censura em termos disciplinares. Não podemos, no entanto, ignorar que a incerteza quanto às consequências disciplinares dos atos do anterior presidente e membros do CD, arrisca colocar debaixo de uma sombra e forte contestação o processo eleitoral em curso e os seus resultados”, defende. “Mesmo que a Comissão de Fiscalização, no uso pleno das suas competências, venha a proferir em breve as suas decisões, estas estão sujeitas a recurso perante a Assembleia Geral. Hipoteticamente, poderia até vir a acontecer que, após as eleições, o anterior presidente conseguisse reverter essa sanção disciplinar numa Assembleia Geral, colocando assim em causa a legitimidade política (embora não legal) dos órgãos entretanto eleitos. O ideal seria que qualquer futura liderança beneficiasse da convergência que defendemos e as eleições se processassem depois de clarificada a situação disciplinar dos membros do anterior CD”, acrescenta.

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É aqui que entroncam duas das medidas apresentadas para contornar os problemas que poderão advir de uma corrida eleitoral com nove candidatos pré-anunciados (apenas um formalizado, Frederico Varandas):

  1. “Procura de uma convergência ainda dentro do atual calendário eleitoral. Repetimos, uma convergência que satisfaça as condições atrás enunciadas parece-nos extraordinariamente importante e, cremos, poderia ter um amplo apoio da massa associativa. Nas atuais condições (com os membros do anterior CD suspensos e sem AG até à data das eleições) esta solução deixaria, no entanto, a pairar no ar a dúvida quanto a um eventual recurso para a AG e às consequências políticas que deveriam ser retiradas de uma hipotética reversão pela AG das sanções disciplinares”;
  2. Adiamento das eleições, usufruindo, por exemplo, do prazo máximo de seis meses em que pode funcionar a Comissão de Gestão. Tal período ofereceria uma janela temporal suficiente para, pelo menos algumas das diferentes candidaturas atuais, poderem conseguir uma convergência. Seria também suficiente para clarificar a situação disciplinar dos membros do anterior CD. Ainda que nos pareça estatutariamente possível, salvaguardadas certas condições, entendemos que a viabilidade política desta solução exige o acordo de uma maioria dos atuais candidatos às eleições. Obriga também à disponibilidade dos membros da Comissão de Gestão para permanecerem em funções mais alguns meses”.

“Não cremos, sinceramente, que qualquer liderança resista a um processo eleitoral que acentue as graves fraturas sociais e geracionais que são visíveis neste momento; bem como ao permanente questionar da sua legitimidade, em resultado da incerteza que paira sobre o estatuto dos anteriores membros do CD. Temos consciência de que o nosso apelo será acolhido por muitos com reservas, em particular a alternativa que contempla, na prática, o prolongamento do período eleitoral. É por esta razão precisamente que o fazemos na forma de um apelo. Um apelo à convergência de sportinguistas, com diferentes competências e sensibilidades. Uma convergência assente num projeto mobilizador e inovador que atravesse gerações e classes sociais. Todos somos necessários ao Sporting no atual contexto”, salienta o documento revelado esta terça-feira.

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Em paralelo, os subscritores advogam que “a solução pode e deve assentar em três pilares que parecem ser fundamentais para eliminar quaisquer suspeitas e teorias de conspiração relativamente a quem quer que venha a exercer a liderança futura”:

1) “Um compromisso claro com a manutenção por parte do clube do controle acionista sobre a SAD e com a conclusão do processo de reestruturação da dívida, bem como a adoção de um modelo de governo que reintroduza e reforce os mecanismos de separação de poderes no clube e entre clube e SAD (incluindo através de uma revisão urgente dos estatutos)”;
2) “A implementação imediata de um conjunto de regras que promovam a transparência e previnam os conflitos de interesse, nomeadamente o cumprimento de um código de transparência que tenha, por exemplo, como ponto de partida o respeito integral dos 60 indicadores do Índice de Transparência para os clubes de futebol criado pela “Transparência Espanha” e um controle independente que garanta a inexistência de conflitos de interesse”;
3) “Criação de um genuíno e inclusivo Conselho Estratégico, capaz de agregar diferentes competências, sensibilidades e stakeholders e permita um espaço de diálogo eficaz e transparente com os órgãos sociais e de gestão”.

“Seria de esperar que, neste panorama muito especial da vida do nosso clube, o atual período de eleições fosse aproveitado para promover uma convergência de vontades e competências ao serviço do Sporting. Em vez disso, temos assistido a uma profunda fragmentação. São hoje públicas, e exploradas, de forma perigosa para o clube, clivagens sociais e geracionais preocupantes (…) É importante que diferentes ideias e projetos possam ser livremente discutidos. Contudo, é fundamental que esse debate não seja substituído por uma competição entre personalidades assente em preconceitos geracionais ou sociais que arrisca agravar ainda mais o clima de profunda divisão e prolongar-se no tempo, para além das eleições. (…) Torna-se incompreensível para os subscritores deste manifesto, e cremos que para uma parte substancial da massa associativa, a multiplicação de candidaturas”, frisa o documento na sua fase introdutória, para balizar as principais ideias defendidas.

O documento assinado por Miguel Poiares Maduro, Samuel Almeida, Rodrigo Roquette, Jaime Mourão Ferreira, Nuno Wahnon Martins e Philippe Mendonça na íntegra é o seguinte:

“Acima de todos nós está o Sporting.

O Sporting Clube de Portugal vive um dos momentos mais traumáticos e difíceis da sua história. O clube atravessa um período conturbado, em que princípios fundamentais da sua organização democrática foram colocados em crise e profundas clivagens têm emergido entre os sócios. A isto acresce, hoje, a certeza de uma situação financeira complexa, cujos exatos contornos apenas saberemos depois de concluída a auditoria em curso.

O contexto acima descrito não permite antecipar facilidades na criação de condições ótimas para a obtenção de sucesso desportivo, o que amplia de forma significativa os riscos de instabilidade e mesmo contestação por parte de uma massa associativa profundamente dividida.

Seria de esperar que, neste panorama muito especial da vida do nosso clube, o atual período de eleições fosse aproveitado para promover uma convergência de vontades e competências ao serviço do Sporting. Em vez disso, temos assistido a uma profunda fragmentação. São hoje públicas, e exploradas, de forma perigosa para o clube, clivagens sociais e geracionais preocupantes.

Não defendemos consensos artificiais, e muito menos plebiscitos ou unanimismos. É importante que diferentes ideias e projetos possam ser livremente discutidos. Contudo, é fundamental que esse debate não seja substituído por uma competição entre personalidades assente em preconceitos geracionais ou sociais que arrisca agravar ainda mais o clima de profunda divisão e prolongar-se no tempo, para além das eleições. Todos somos do Sporting e a todos nos une a mesma paixão pelo nosso clube, sem distinções de idade, género ou classe social.

E nunca, como hoje, esta paixão exigiu tanto colocar os interesses do Sporting acima dos interesses de cada um de nós.

No atual contexto, torna-se incompreensível para os subscritores deste manifesto, e cremos que para uma parte substancial da massa associativa, a multiplicação de candidaturas, e a fragmentação consequente, correndo o risco de agravar o clima de divisão que grassa no clube e tornar permanentes fraturas sociais ou geracionais. Tal circunstância produzirá um resultado eleitoral incapaz de legitimar de forma inequívoca os próximos órgãos sociais, algo que entendemos ser fundamental face aos desafios que o clube enfrenta.

É, pois, por imperativo de consciência e de defesa intransigente do que cremos serem os superiores interesses do Sporting, que fazemos um apelo claro e inequívoco a um esforço genuíno de convergência entre os diversos potenciais candidatos, de modo a colocar de pé um projeto que seja mobilizador e reflita a diversidade do clube, promovendo a coesão e uma forte legitimação da solução de liderança resultante das próximas eleições.

Todos os subscritores do presente apelo, não apoiam, nem participam em nenhuma das anunciadas listas por entenderem que, até agora, nenhuma representa a solução agregadora necessária. É nosso desejo que uma convergência entre listas ainda seja possível e produza a solução integrada e sustentável que gostaríamos de poder apoiar.

Entendemos, igualmente, que tal solução pode e deve assentar em três pilares que nos parecem ser fundamentais para eliminar quaisquer suspeitas e teorias de conspiração relativamente a quem quer que venha a exercer a liderança futura do Sporting:

1º – Um compromisso claro com a manutenção por parte do clube do controle acionista sobre a SAD e com a conclusão do processo de reestruturação da dívida, bem como a adoção de um modelo de governo que reintroduza e reforce os mecanismos de separação de poderes no clube e entre clube e SAD (incluindo através de uma revisão urgente dos estatutos).

2º – A implementação imediata de um conjunto de regras que promovam a transparência e previnam os conflitos de interesse, nomeadamente:

” O cumprimento de um código de transparência que tenha, por exemplo, como ponto de partida o respeito integral dos 60 indicadores do Índice de Transparência para os clubes de futebol criado pela “Transparência Espanha”;

” Um controle independente que garanta a inexistência de conflitos de interesse, designadamente: 1) Que ninguém possa exercer um cargo social no clube ou SAD se o próprio ou um seu familiar (ou similar) detiver um outro interesse económico relevante na SAD ou clube (ou em pessoa jurídica que o tenha) ou tiver uma relação profissional ou materialmente relevante com quem o tenha; 2) Que ninguém possa praticar ato ou participar numa deliberação que envolva um possível beneficio para si, um seu familiar, ou pessoa jurídica com quem tenha relação profissional ou materialmente relevante;

3º – Criação de um genuíno e inclusivo Conselho Estratégico, capaz de agregar diferentes competências, sensibilidades e stakeholders e permita um espaço de diálogo eficaz e transparente com os órgãos sociais e de gestão.

É importante, igualmente, atender seriamente à conjuntura particular em que estas eleições arriscam ter lugar. Todos os subscritores deste apelo foram profundamente críticos do comportamento gravemente anti-estatutário do presidente recentemente destituído. É nossa opinião, no respeito da autonomia do órgão social competente, que tal comportamento merece censura em termos disciplinares. Não podemos, no entanto, ignorar que a incerteza quanto às consequências disciplinares dos atos do anterior presidente e membros do CD, arrisca colocar debaixo de uma sombra e forte contestação o processo eleitoral em curso e os seus resultados.

Mesmo que a Comissão de Fiscalização, no uso pleno das suas competências, venha a proferir em breve as suas decisões, estas estão sujeitas a recurso perante a Assembleia Geral. Hipoteticamente, poderia até vir a acontecer que, após as eleições, o anterior Presidente conseguisse reverter essa sanção disciplinar numa Assembleia Geral, colocando assim em causa a legitimidade política (embora não legal) dos órgãos entretanto eleitos. O ideal, por esta razão, seria que qualquer futura liderança beneficiasse da convergência que defendemos e as eleições se processassem depois de clarificada a situação disciplinar dos membros do anterior CD.

Neste cenário tão complexo, ocorrem-nos duas alternativas aptas a oferecer o espaço e tempo necessários à solução de convergência que defendemos e, ao mesmo tempo, garantir que o resultado eleitoral não será politicamente contaminado pela incerteza decorrente do processo disciplinar em curso relativo aos anteriores membros do CD.

O nosso apelo aos diferentes candidatos é que aceitem ponderar uma destas alternativas.

Uma primeira hipótese apostaria na procura de uma convergência ainda dentro do atual calendário eleitoral. Repetimos, uma convergência que satisfaça as condições atrás enunciadas parece-nos extraordinariamente importante e, cremos, poderia ter um amplo apoio da massa associativa. Nas atuais condições (com os membros do anterior CD suspensos e sem AG até à data das eleições) esta solução deixaria, no entanto, a pairar no ar a dúvida quanto a um eventual recurso para a AG e às consequências políticas que deveriam ser retiradas de uma hipotética reversão pela AG das sanções disciplinares.

Uma segunda hipótese seria o adiamento das eleições, usufruindo, por exemplo, do prazo máximo de seis meses em que pode funcionar a Comissão de Gestão. Tal período ofereceria uma janela temporal suficiente para, pelo menos algumas das diferentes candidaturas atuais, poderem conseguir uma convergência. Seria também suficiente para clarificar a situação disciplinar dos membros do anterior CD. Ainda que nos pareça estatutariamente possível, salvaguardadas certas condições, entendemos que a viabilidade política desta solução exige o acordo de uma maioria dos atuais candidatos às eleições. Obriga também à disponibilidade dos membros da Comissão de Gestão para permanecerem em funções mais alguns meses.

Não cremos, sinceramente, que qualquer liderança resista a um processo eleitoral que acentue as graves fraturas sociais e geracionais que são visíveis neste momento; bem como ao permanente questionar da sua legitimidade, em resultado da incerteza que paira sobre o estatuto dos anteriores membros do CD.

Temos consciência de que o nosso apelo será acolhido por muitos com reservas, em particular a alternativa que contempla, na prática, o prolongamento do período eleitoral. É por esta razão precisamente que o fazemos na forma de um apelo. Um apelo à convergência de sportinguistas, com diferentes competências e sensibilidades. Uma convergência assente num projeto mobilizador e inovador que atravesse gerações e classes sociais. Todos somos necessários ao Sporting no atual contexto.

Este é o nosso apelo.”