“Não foi Centeno que entrou no Eurogrupo, foi o Eurogrupo que entrou em Centeno — ou melhor: nunca saiu de Centeno”. Foi desta forma que Marisa Matias criticou as palavras do presidente do Eurogrupo sobre fim do terceiro programa de resgate à Grécia. A eurodeputada bloquista falava na sessão inaugural do Fórum Socialismo, o evento que marca a rentrée política do Bloco de Esquerda, em Leiria.

Num painel com o tema “A Europa da xenofobia e da austeridade tem futuro?”, e perante uma sala bem composta, Marisa Matias, que foi apresentada como “a melhor candidata à Presidência da República em 2016” pelo moderador, mostrou-se muito crítica das palavras do Ministro das Finanças. “As recentes declarações de Mário Centeno são uma triste imagem”, disse. “O seu programa nunca foi outro a não ser o da austeridade”.

No entanto, confessou não estar surpreendida com as declarações do governante. E aproveitou para puxar dos galões. “Se limites houve à austeridade, eles foram impostos pela esquerda, em particular pelas medidas do Bloco de Esquerda”, regozijou-se. Segundo a eurodeputada, sem os travões da esquerda, Portugal estaria “hoje em ajustamento permanente”, insinuando que essa é a verdadeira natureza de Mário Centeno. Uma crítica que está em linha com as que surgiram nas horas seguintes à divulgação do vídeo entre as figuras de esquerda, um pouco por toda a Europa.

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Mas o ministro das Finanças não foi o único que ficou com as orelhas a arder. “A Europa sem austeridade, de que falou António Costa na quinta-feira em Itália, é uma ficção, mas pelo menos Centeno não tenta fugir”. Um ataque encapotado ao primeiro-ministro, que indiretamente acusa de promover uma imagem para o exterior diferente daquela que impera dentro do seu próprio elenco governativo.

A direita que legitimou o crescimento da extrema-direita

Acompanhada por Luís Fazenda e por Marina Anderson, eurodeputada eleita pelo Sinn Féin — o antigo braço político do IRA, da Irlanda do Norte –, Marisa Matias aproveitou a sua intervenção para deixar alertas sobre os perigos inerentes ao crescimento da extrema-direita.

“A extrema-direita foi sendo alimentada pelo medo e pelas desigualdades”, entende a bloquista. E aponta culpados. “A social-democracia e a democracia-cristã”, que, defende, “ajudaram a normalizar as políticas da extrema-direita”. Tudo porque “a direita preferiu perder a ideologia” do que “perder eleitores”.

“Quando a extrema-direita começou a chegar ao poder na Europa”, resume, ”as suas políticas já lá estavam”. Mas não iliba a esquerda de responsabilidades. E pede mais. “Nós temos de voltar ao essencial”, apela. Para isso, parece ter uma espécie de receita cuja base não pode ser a ladainha económica. “É preciso muito mais do que falar de economia”. É necessário falar para os que “têm medos” mas que, por exemplo, “não são racistas”.

O Fórum Socialismo vai decorrer entre esta sexta-feira e domingo na Escola Superior de Educação e Ciências Sociais, do Instituo Politécnico de Leiria. No sábado o grande destaque será o jornalista angolano Rafael Marques. No domingo, Catarina Martins vai ser a cabeça de cartaz, encerrando a rentrée do Bloco de Esquerda com uma intervenção ao final da tarde.