Há coisas que parecem escritas nas estrelas. Moreirense-Sporting, 69 minutos. Leões empatados, o jogo feito num nó. Entra Jovane Cabral para o lugar de Acuña e, nem um minuto depois, fez o que nem o argentino nem Nani tinham feito numa hora: cerrou os dentes, arrancou área dentro e incomodou de tal maneira a defesa contrária que viria a sofrer a grande penalidade que permitiria a Bas Dost catapultar os verde e brancos para a vitória final (3-1).

Uma semana depois, em Alvalade, de novo o Sporting empatado. Minuto 59 — menos dez do que em Moreira de Cónegos: Jovane entra para o lugar do apagado Misic. Com ele, uma avalanche de velocidade e irreverência. Nem cinco minutos depois, cruzamento com régua e esquadro para a cabeça de Nani, que bisou para um triunfo que parecia impossível até à entrada do luso-caboverdiano.

Pim pam pum. Passam duas jornadas e o Sporting está — adivinhe lá? — empatado a meados da segunda parte. O jogo mastigado, as transições travadas, a bola a chegar lá à frente longa e às três pancadas. Sem acutilância. Minuto 66, sai Jefferson, entra Jovane. Vinte minutos depois, volta a ser decisivo. Mas desta vez, não a cavar penalidades nem a dar a marcar. O jovem de 20 anos vestiu, ele próprio, a camisola de super herói, viu Raphinha a ganhar o corredor direito, Ristovski a entrar para o cruzamento, Castaignos a falhar a emenda, a bola a chegar redondinha para os seus pés e a sair deles em forma de golo. À terceira foi de vez e o avançado, que foi aposta de Peseiro esta temporada, estreou-se a marcar pela equipa principal e logo com aqueles golos que valem três pontos.

Foi o ponto alto de uma carreira de leão ao peito que já vai que na quinta época consecutiva. Jovane nasceu na Assomada, em Santiago (Cabo Verde) e chegou ao Sporting na época de 2014/15 para integrar a formação de juvenis. Rapidamente subiu aos juniores, sob a alçada do técnico Tiago Fernandes e, ainda no primeiro ano no escalão, foi chamado à equipa B — onde, em 2016/17 fez 20 jogos e um golo, o mesmo somado na temporada seguinte, em 14 partidas. Foi na equipa secundária que trabalhou com João de Deus que, uma vez, o descreveu como “um culturista que joga futebol” — dado o “desenvolvimento muscular fora do normal”.

Foi despertando a atenção de Jorge Jesus, que lhe deu dez minutos em campo frente ao Oleiros, para a Taça de Portugal, mas a grande oportunidade chegou pela mão de José Peseiro. Foi amor à primeira vista. O técnico não prescinde do extremo na convocatória e até o utilizou, no final do encontro com o Feirense, para enviar recados a Matheus Pereira — outro produto da formação leonina que acabou por ser emprestado por divergências com o treinador. “É estes jogadores que a formação tem de ter. Não são aqueles que fogem quando não são titulares. Não é falta de respeito quando um jogador não é convocado. É destes que é preciso, que quando vão lá para dentro dão tudo e não escrevem nada. É destes, estes são o caminho do Sporting”.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR