O primeiro-ministro chega segunda-feira a Luanda, sete anos depois da última visita oficial de um chefe de Governo português, com a conjuntura económica inversa, estando Portugal a crescer e Angola ainda a tentar sair da crise.

Em novembro de 2011, ficou célebre a frase de José Eduardo dos Santos oferecendo todo o apoio a Portugal, um país em recessão e debaixo da assistência financeira da ‘troika’, mas desta vez é Portugal que está mais bem posicionado para oferecer ajuda a Angola, um país a sair de dois anos de recessão, a negociar ajuda financeira do FMI e à procura de investimentos e financiamento externo para relançar a economia.

Em 2011, Pedro Passos Coelho aterrou em Luanda para uma visita de 40 horas que foi uma lufada de ar fresco face aos indicadores negativos nacionais, desde a descida do poder de compra, ao aumento do desemprego para 14,6% no final de 2011, e à recessão de 1,6% nesse ano, mas António Costa vai chegar a Luanda com o desemprego em mínimos dos últimos 14 anos e com o FMI a prever um crescimento de 2,3% este ano.

Em Luanda, a comitiva portuguesa vai encontrar uma economia cujo crescimento, no melhor dos cenários, não deve tocar nos 3%, e que é olhada com ceticismo pelos investidores internacionais, que ainda assim continuam atraídos pelas grandes potencialidades do país.

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As trocas comerciais esmoreceram, e Angola deixou de ser o quarto maior destino das exportações em 2011, logo atrás de Espanha, França e Alemanha, para descer para o décimo lugar dos clientes de Portugal, em 2017.

Pela primeira vez em democracia, um líder português vai encontrar-se com um Presidente que não é José Eduardo dos Santos, o histórico Presidente angolano que deu lugar a João Lourenço, em agosto do ano passado. Não será, no entanto, o primeiro encontro entre Lourenço e Costa, já que na Cimeira entre a União Europeia e a União Africana, em dezembro, na Costa do Marfim, os dois reuniram-se, e também, depois, noutros fóruns internacionais.

Nessa altura, o processo da justiça portuguesa contra o vice-Presidente da República, Manuel Vicente, era o único “irritante” nas relações diplomáticas entre os dois países, e o ministro dos Negócios Estrangeiros angolano chegou a dizer, em Abidjan, que enquanto esse problema persistisse, nenhum chefe de Governo português seria convidado para visitar Angola.

Com a transferência do processo para Luanda, por decisão do Tribunal da Relação de Lisboa após recurso da defesa de Manuel Vicente, o “irritante” desapareceu, o convite foi feito, e António Costa visita Luanda de segunda a quarta-feira.

Do ponto de vista dos indicadores económicos, o segundo maior produtor de petróleo na África subsaariana pouco ou nada tem a ver com a Angola de 2011, que terminou o ano a crescer 3,5%, e que no ano seguinte iria acelerar para os 8,5%.

Era o tempo das chamadas ‘vacas gordas’, já na ressaca da crise económica mundial de 2008 e muito antes da queda abrupta dos preços das matérias-primas, no verão de 2014, que afetou significativamente o crescimento económico de Angola.

Hoje, Angola está a recuperar do choque, com um novo Presidente que tem imprimido uma agenda reformadora que agrada aos investidores internacionais e convence os mercados financeiros, que recentemente compraram 3 mil milhões de dólares de dívida pública a 30 anos, num claro sinal de que o mercado crê na capacidade do país honrar os compromissos, embora cobrem juros de 9% ao ano.

O peso do endividamento angolano é tal, que praticamente metade do Orçamento do Estado, desde 2016, é para pagar o serviço da dívida. O aumento do envolvimento com a China, a quem Angola deve cerca de 23 mil milhões de dólares, e que é o principal cliente, responsável por cerca de metade das exportações angolanas, e a subida do endividamento para compensar a quebra nas receitas, é um dos principais pontos de preocupação para o Executivo, apostado na criação de um ambiente de negócios mais favorável que atraia os investidores para financiarem a diversificação económica que, crise após crise, é prometida mas raramente implementada.

É o caso da nova Lei do Investimento Privado, em vigor desde julho, que deixa cair a obrigatoriedade de os sócios angolanos dos projetos internacionais terem uma posição de pelo menos 35% no capital social das empresas, como antes. Na prática, trata-se da liberalização do investimento privado em Angola.

O objetivo é conseguir captar Investimento Direto Estrangeiro (IDE), conforme posição expressa na proposta governamental da nova lei do investimento privado, que substituiu a que vigorava desde 2015, acabando igualmente com limites mínimos ao investimento.

O Presidente angolano apelou em janeiro ao investimento estrangeiro no país, comprometendo-se o Estado com o repatriamento dos dividendos e com a segurança jurídica e dos bens físicos dos empresários que apostarem em Angola.

Garantias que estão na lei, mas que continuam sem sair do papel para centenas de empresas, devido à crise cambial que fez o kwanza desvalorizar-se cerca de 50% face ao dólar desde janeiro, o que limita, por exemplo, o acesso a divisas, necessárias para repatriamento de dividendos.

É que sem o volume de dólares do passado, face à quebra da cotação do barril de crude e das receitas petrolíferas, Angola continua a ver a retoma económica distante.