Naquele dia 17 de dezembro de 2007, Kaká citou a Bíblia. “Diz que podemos ter mais do que pensamos e foi isso que aconteceu comigo”, atirou o médio brasileiro depois de receber o prémio de melhor jogador do mundo pela FIFA das mãos de outro ídolo canarinho, Pelé. Ricardo Izecson dos Santos Leite, assim nascido antes de o futebol o batizar com outro nome, somava 1.047 pontos, contra os 505 de Lionel Messi e os 426 de Cristiano Ronaldo.

Mais do que isso, encerrava com chave de ouro um ano em que carregou o Milan às costas na conquista da Liga dos Campeões — prova onde também foi o melhor marcador. Poucos dias antes de vencer a mais importante distinção da sua carreira, foi também o jogador em destaque na vitória por 4-2 sobre o Boca Juniors, que culminou com a conquista do Mundial de Clubes pelo clube italiano.

Isto foi em 2007. De lá para cá, tudo mudou. O prémio FIFA — hoje chamado The Best — passou a ter total hegemonia de Cristiano Ronaldo e Lionel Messi e mais ninguém foi capaz de se intrometer na discussão. Senão vejamos: nas últimas dez edições (todas desde que Kaká levantou o galardão), foi sempre um dos dois astros do futebol a vencê-lo. E há mais um indicador: em nove desses dez anos, acabaram sempre ambos nos dois primeiros lugares (a exceção foi em 2010, quando Iniesta e Xavi completaram o trio liderado por Messi). Nestes dez anos de polarização entre Messi e Ronaldo, muita coisa aconteceu no mundo do futebol: Portugal foi campeão europeu, o VAR passou a fazer parte do léxico de qualquer adepto da modalidade e o Real Madrid (com CR7 ao leme) foi tricampeão europeu. Quer saber mais? Venha daí.

A introdução do VAR

Com três letrinhas apenas se escreve uma revolução no futebol. Os dez anos em que se desenrolou a hegemonia Ronaldo/Messi foram também os anos em que o videoárbitro deu os primeiros passos no futebol. Depois de alguns projetos pioneiros que deram origem a testes na liga holandesa, o International Board (IFAB), órgão que determina as regras da modalidade, aprovou, em junho de 2016, a utilização do VAR em testes.

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International Board aprovou a utilização do videoárbitro em testes e Portugal foi um dos países pioneiros na introdução da tecnologia. (Marcelo Hernandez/Getty Images)

Portugal, a par da Austrália, Estados Unidos, Alemanha e Holanda entrou no grupo dos seis países pioneiros — e testou a tecnologia em modo offline, ou seja, sem interferência no jogo, na final da Taça de Portugal de 2016/17 — antes de a Federação Portuguesa de Futebol assumir o risco (e a despesa) de introduzir o VAR em 2017/18, uma época antes do que estava previsto, nos jogos do campeonato nacional. Na Europa, também a Bundesliga alemã (2017/18), a Série A italiana (2017/18) e a La Liga espanhola (2018/19) já utilizam a tecnologia. O último campeonato do mundo, na Rússia, também já teve VAR.

Ronaldo mudou duas vezes de clube

Desde que Kaká foi melhor jogador do mundo, Ronaldo já trocou duas vezes de clube. Esta época, trocou o Real Madrid pela Juventus (Emilio Andreoli/Getty Images)

O ano de 2008 trouxe a Cristiano Ronaldo a primeira distinção de melhor do mundo e a temporada seguinte levou-o até ao Real Madrid numa transferência de 93 milhões de euros — à época recorde no futebol mundial. Foi o próprio jogador que pediu ao gigante inglês para abandonar Old Trafford e a mudança trouxe-lhe as principais conquistas da carreira. Venceu quatro Ligas dos Campeões, três Supertaças europeias, três mundiais de clubes, dois campeonatos espanhóis, duas Taças de Espanha e três Supertaças espanholas. Além, claro, de uma parafernália de títulos individuais — em que se destacam as quatro Bolas de Ouro e os três prémios de Jogador do Ano da UEFA — e do rótulo de melhor goleador de sempre do Real, com 451 golos apontados.

O verão de 2018 trouxe a rutura nos nove anos de casamento com os merengues. CR7 considerou ter chegado ao fim o ciclo em Madrid e quis mudar de ares — e de desafios. Fez as malas para Turim, rendendo ao clube espanhol 117 milhões de euros, tendo como grande desafio conquistar a Liga dos Campeões num clube que não levanta o troféu desde 1996, ainda por lá jogava o português Paulo Sousa.

Portugal foi campeão europeu

Portugal foi campeão europeu em 2016, em França, sob o comando de Fernando Santos. (Matthias Hangst/Getty Images)

O dia 10 de julho ficará para sempre marcado (a ouro) no futebol português. Depois de décadas do ‘quase’, do ‘jogámos como nunca e perdemos como sempre’, Portugal sagrou-se campeão europeu. Jogou bem em França? Nem por isso. Era favorito? Não. Mas Fernando Santos, que assumiu o comando técnico da seleção pouco antes, inaugurou uma época de ‘menos ais’ e mais conquistas, trazendo o caneco para Portugal, 12 anos depois da sofrida final perdida com a Grécia, em casa.

E Cristiano Ronaldo, um dos protagonistas deste texto, estava lá — ou quase. O capitão português sofreu uma entrada dura de Payet, logo aos 8 minutos da final com a França, e teve de abandonar, em lágrimas, um dos jogos que mais terá sonhado jogar. Cedeu o lugar a Quaresma e o resto… o resto é a história escrita pela ponta da bota do improvável Éder.

O escândalo de corrupção que ditou a saída de Blatter da FIFA

O ano de 2015 ficou marcado por um escândalo de corrupção na FIFA, que culminou com a saída de Joseph Blatter do comando do organismo. Em causa, uma operação do FBI, em conjunto com a polícia suíça, que trouxe à tona casos de corrupção, extorsão, irregularidades em contratos de direitos de televisão e até o pagamento de subornos no processo de escolha das sedes dos Campeonatos do Mundo de 2018 e 2022.

O caso culminou mesmo com a prisão de sete funcionários da FIFA — entre eles dois vice-presidentes próximos de Blatter — num hotel na Suíça. O então líder do organismo considerou estes como “casos isolados”, mas o Departamento de Justiça dos Estados Unidos falava em práticas “desenfreadas, sistemáticas e enraizadas”. A pressão aumentou sobre Blatter. Várias marcas e patrocinadores ameaçaram retirar o seu apoio, assim como a própria UEFA, que até anunciou a possibilidade de criar um Mundial de 2018 alternativo como forma de pressão. O cerco fechou-se de tal maneira sobre Blatter, que o suíço acabou por renunciar ao cargo, quatro dias de ter sido reeleito pela quinta vez. Assumiu o seu lugar, de forma interina, o camaronês Issa Hayatou, até Gianni Infantino ser eleito, em fevereiro de 2016.

Ronaldo teve quatro filhos

À medida que a carreira de Cristiano Ronaldo ia evoluindo dentro dos relvados, a vida do internacional português ia também mudando fora deles. Em 2010, o avançado, então ao serviço do Real Madrid, anunciou que ia ser pai de Cristiano Júnior — hoje com oito anos. CR7 nunca divulgou o nome da mãe e o menino foi sempre criado por Ronaldo, com quem tem uma relação de grande cumplicidade: acompanha-o em todos os momentos importantes, como entregas de prémios ou finais de grandes competições.

Em junho de 2017 a família cresceu com as chegadas dos gémeos Eva e Mateo. Tal como aconteceu com Cristiano Júnior, CR7 não divulgou o nome da mãe, sabendo-se apenas que terão nascido de uma barriga de aluguer. No mesmo ano, mas em novembro, nasceu Alana Martina, filha do jogador com a companheira Georgina Rodríguez, fixando em quatro o número de filhos do craque português.

Lionel Messi casou

Lionel Messi casou com Antonella Rocuzzo, numa festa com vários jogadores mas que não contou com a presença de Ronaldo. (EITAN ABRAMOVICH/AFP/Getty Images)

Pouco tempo depois do casal de gémeos ter surgido na vida de Cristiano Ronaldo, o rival Messi também deu um passo importante a nível pessoal. O jogador do Barcelona, que já tinha dois filhos (Thiago e Mateo), casou-se com Antonella Rocuzzo, namorada de longa data do jogador.

A cerimónia aconteceu em Rosário (Argentina), terra natal de ambos, e contou com uma festa para 260 convidados — diz-se que Cristiano Ronaldo estava entre eles, mas o craque português acabou por não estar presente no enlace. Mas não faltaram ilustres para assistir ao casamento: Neymar, Luis Suárez, Carles Puyol, Gerard Piqué, Ángel Di María, Marcos Rojo ou Gonzalo Higuaín foram alguns dos presentes, que chegaram a dar entrevistas aos cerca de 150 jornalistas credenciados, já que a festa tinha um tapete vermelho preparado para o efeito.

Os problemas com o fisco espanhol

Desde que Kaká ganhou o prémio de melhor do mundo, o futebol ficou também a conhecer o quão apertada é a malha do fisco em Espanha. Ali caíram Ronaldo e Messi (já lá vamos), mas também José Mourinho, Alexis Sánchez, Di María, Fábio Coentrão, Ricardo Carvalho, Falcao, Adriano ou Samuel Eto’o, para citar alguns.

Comecemos por Cristiano Ronaldo. Tudo começou com a divulgação dos documentos do ‘Football Leaks’, que levaram as autoridades espanholas a abrir processos contra algumas personalidades do mundo do futebol por alegadas práticas de fraude fiscal. CR7 estava nessa lista, sendo acusado de, em quatro casos distintos, ocultar rendimentos provenientes dos dos seus direitos de imagem através da utilização de entidades situadas em paraísos fiscais. Em causa, estavam rendimentos próximos dos 150 milhões de euros e a fraude envolveria 14,7 milhões. O caso foi-se arrastando nos tribunais e só ficou resolvido depois de o jogador ter aceitado uma pena de prisão suspensa de dois anos e o pagamento de 18,8 milhões de euros — entretanto reduzidos a 16,7.

O caso de Messi tem contornos ligeiramente diferentes. Os dados do ‘Football Leaks’ davam conta da possibilidade de parte do salário do jogador estar a ser pago através da sua fundação, com o objetivo de assim fugir aos impostos. As autoridades chegaram a fazer buscas na sede do Barcelona para investigar as doações do clube à fundação. Messi e o seu pai, Horacio, foram mesmo condenados por terem enganado o Estado espanhol em quase 4,2 milhões de euros entre 2007 e 2009, sendo o jogador condenado a uma pena de prisão de 21 meses e o seu pai de 15. Entretanto, o Tribunal Superior de Justiça da Catalunha aceitou substituir a pena por uma multa de 255 mil euros.

O Real Madrid (com Ronaldo) foi tricampeão europeu

O Real Madrid venceu a 13.ª Liga dos Campeões na época passada, vencendo a competição pela terceira vez consecutiva. (LLUIS GENE/AFP/Getty Images)

Foi a última grande conquista de Ronaldo pelo Real Madrid antes de se mudar para Turim. O clube merengue conquistou, em maio deste ano, a terceira Liga dos Campeões consecutiva — feito que não acontecia há mais de 40 anos, desde que o Bayern Munique venceu a então chamada Taça dos Clubes Campeões Europeus, entre 1973/74 e 1975/76.

O feito aconteceu depois da vitória por 3-1 sobre o Liverpool na final, num jogo em que a formação de Madrid soube aproveitar as incidências do jogo — sobretudo a lesão de Mohamed Salah, que teve de abandonar a partida de forma precoce, e a exibição para esquecer de Lorius Karius, que teve interferência direta em dois golos da equipa espanhola. Cristiano Ronaldo passou ao lado do encontro, mas o mesmo não aconteceu ao companheiro de setor Gareth Bale, que marcou dois golos, um deles quase uma réplica da bicicleta de CR7 à Juventus.

O Real repetiu assim o feito do Bayern Munique, do Ajax de Johann Cruyff (que a prova venceu entre 1971 e 1973) e o seu próprio feito, já que o clube merengue até foi ‘penta’, já que venceu as primeiras cinco edições da competição (entre 1955/56 e 1959/60).

Cristiano Ronaldo é o melhor marcador de sempre da Champions

Quando se associa a Liga dos Campeões ao ato de marcar golos, Cristiano Ronaldo é o nome que surge na cabeça. Ou não fosse o internacional português o melhor marcador de sempre da competição. O avançado soma 120 remates certeiros, mais 20 do que Lionel Messi, que surge em segundo lugar na lista. O terceiro posto é ocupado por outro jogador que integrou os quadros dos merengues, Raúl González (71 golos), seguido de Ruud van Nistelrooy (56) e de Karim Benzema (55).

Cristiano é também o jogador que mais vezes foi melhor marcador de uma edição da Liga dos Campeões. Aconteceu por sete vezes (Messi foi cinco, uma delas partilhada com CR7): em 2007/08 (oito golos), 2012/13 (12 golos), 2013/14 (17 golos), 2014/15 (10 golos), 2015/16 (16 golos), 2016/17 (12 golos) e 2017/18 (15 golos).

Neymar tornou-se o jogador mais caro de sempre

O verão de 2017 trouxe para o mundo do futebol três números iguais mas que não deixaram tudo na mesma. 222, mais concretamente os milhões de euros que o Paris Saint-Germain pagou ao Barcelona pelo passe de Neymar. Esta tornou-se (de longe) a maior transferência de sempre do futebol mundial e introduziu valores no mercado que antes pareciam impensáveis.

E pareciam porque, olhando para os restantes nomes (e valores) que compõem a lista, não há paralelo com o desembolsado pelo emblema francês. Kylian Mbappé é o segundo mais caro de sempre e também envolve o PSG, que pagou ao Mónaco 135 milhões de euros — ou seja, menos 87 milhões do que fez pelo avançado brasileiro. Logo depois surge Philippe Coutinho, que se mudou do Liverpool para o Barcelona a troco de 130 milhões de euros, seguido de Dembélé, que rendeu ao Borussia Dortmund 120 milhões na viagem para Camp Nou. A transferência de Cristiano Ronaldo para a Juventus é, imagine-se, a quinta mais cara da história, com o emblema italiano a abrir os cordões à bolsa em exatos 117 milhões de euros.