Os médicos moçambicanos queixam-se de pressão e ameaças por parte das autoridades públicas, disse hoje à Lusa António Zacarias, bastonário da Ordem dos Médicos de Moçambique. “No terreno, esses casos de ameaças pelo exercício da profissão são praticados pelas autoridades públicas”, referiu, a propósito do processo que decorre depois de um incidente ocorrido no mês de agosto, em Maputo.

Na altura, polícias moçambicanos levaram dois técnicos hospitalares à força para um interrogatório que os impediu de observar utentes durante nove horas, depois um familiar de um outro membro da corporação ter morrido no Hospital Central de Maputo. “A Ordem já fez a devida queixa à Procuradoria-Geral da República e o processo está a andar”, referiu António Zacarias.

O bastonário salientou à Lusa que não se trata de um caso isolado, sendo apenas “o mais flagrante”. “De forma velada, os colegas têm-se queixado de pressão”, lamentou.

Numa “carta de repúdio”, a Ordem condenou os acontecimentos de 13 de agosto, quando seis agentes da Polícia da República de Moçambique (PRM) levaram um internista e um médico residente dos serviços de urgência do Hospital Central de Maputo para a esquadra da unidade hospitalar e para uma outra, fora das instalações.

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Os médicos foram interrogados entre as 15:00 e a meia-noite sobre a morte de um familiar de um oficial da polícia, refere-se na carta. Segundo a ordem, a equipa médica foi alvo de um processo-crime, cujo número se desconhece, e foi alvo de violência emocional, psicológica e verbal. “Estes atos de violência ocorreram após o óbito de um paciente, familiar de um suposto oficial da PRM, que padecia de hipertensão arterial, diabetes, insuficiência cardíaca e renal”, acrescenta o documento.

Os médicos foram levados pela polícia dez minutos após a ocorrência do óbito. A organização de classe diz que os familiares do doente falecido proferiram ameaças e insultos e forçaram a equipa médica a deixar de assistir os doentes. “A abertura de um inquérito de responsabilidade médica está devidamente plasmada nos estatutos da Ordem dos Médicos”, sublinha a carta de repúdio, frisando que a polícia não tem competências para lidar com o caso.

A organização exorta as instituições competentes e o público em geral para se unirem contra a atuação, referindo que condutas similares podem impedir a população de receber assistência médica adequada.