É uma “derrota”, não há forma de “dourar a pílula”, reconheceu a própria Angela Merkel. O líder do grupo parlamentar (e aliado muito próximo) de Merkel, Volker Kauder, foi substituído no cargo que ocupou nos últimos 13 anos — e o sucessor, Ralph Brinkhaus, é alguém que já criticou a política da chanceler alemã várias vezes. Brinkhaus garante que a sua candidatura, vencedora, não é um sinal de deslealdade para com Merkel, mas vários analistas estão a especular que este é um primeiro sinal de que a chanceler já não tem o mesmo controlo sobre o partido (e sobre a coligação) que teve no passado.

Foi a primeira vez que Kauder teve alguém a desafiá-lo — e, num voto secreto, foi vencido (112 contra 125 de Brinkhaus) na tarde de terça-feira. Isto apesar de ter contado com o apoio não só de Merkel mas, também, de outros líderes do partido CSU como Horst Seehofer, ministro da Administração Interna, e Alexander Dobrindt.

É assim que funciona a democracia, umas vezes temos derrotas, não há como dourar a pílula”, reconheceu Angela Merkel, citada pela imprensa alemã.

A chanceler alemã não escondeu o desgosto com o resultado mas prometeu trabalhar com Brinkhaus, um consultor fiscal que já teve dois choques com Merkel no passado recente. Brinkhaus criticou os planos, avançados a dada altura por Merkel, para limitar as deduções fiscais às empresas. Além disso, Ralph Brinkhaus escreveu um artigo de opinião em abril de 2018 onde criticava os planos de Emmanuel Macron para o futuro da Europa.

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Dentro do partido, a mensagem oficial passa por elogiar a “renovação das lideranças do partido”, mas nos bastidores os receios dividem-se entre questões sobre a liderança de Merkel e preocupações em relação ao perfil muito financeiro (e pouco político) de Brinkhaus para um cargo como líder parlamentar.

Na oposição, a líder parlamentar do partido Alternativa para a Alemanha (AfD), Alice Weidel, escreveu nas redes sociais que Merkel está “a dar os últimos suspiros. A votação mostra que Merkel está a perder o controlo do partido”.

Em nota enviada aos investidores, os analistas do holandês Rabobank comentam que o facto de Brinkhaus ter desempenhado o cargo de vice do grupo parlamentar pode indicar que a votação “não sinaliza uma mudança imediata na direção do partido”. “Contudo, este resultado pode criar desafios à eficiência da política, limitando o espaço para o governo alemão intervir como bombeiro em algum problema na zona euro, se este existir”.

Já Holger Schmieding, economista do Berenberg, concorda que “após 13 anos ao leme, o poder da chanceler Angela Merkel e a capacidade de moldar a política interna estão a desvanecer-se”. Na opinião do economista, “Merkel está em modo-sobrevivência, forçada a conter crise após crise”, sobretudo desde que ganhou as eleições de há um ano com um resultado “pouco convincente”.

Mas faz sentido pensar em eleições antecipadas? “Provavelmente, não”, diz o economista. “Nenhum dos três partidos que formam a coligação CDU/CSU-SPD teria algo a ganhar caso derrubasse o governo”, defende Holger Schmieding, acrescentando que a turbulência política recente tem penalizado todos os três partidos nas sondagens — em benefício do partido AfD.