Miguel Barreto, que foi diretor-geral da Energia entre 2004 e 2008, recusa ser associado ao movimento de portas giratórias que tem sido associado ao setor da energia, a propósito da circulação de quadros entre governos, reguladores, consultoras e empresas energéticas. “O conceito de portas giratórias não se aplica a mim”, afirmou esta quarta-feira no Parlamento quando confrontado com a criação de uma empresa de certificação energética, após ter abandonado funções, e que vendeu mais tarde à EDP. “Não vim do setor elétrico, nem fui para o setor elétrico”. Miguel Barreto trabalha atualmente como consultor de energia fora de Portugal, atualmente está envolvido num projeto no Nepal, mas em Portugal está a trabalhar no licenciamento de centrais fotovoltaicas.

O conceito de portas giratórias tem-se aplicado a quadros que apoiaram do ponto de vista técnico os governos a tomar decisões políticas e que depois foram parar às empresas visadas por esses diplomas legais. João Conceição e Rui Cartaxo, que foram administradores da REN depois de passarem por gabinetes governamentais, e Ricardo Ferreira, que é diretor da EDP.  Há ainda um ponto de origem comum a vários destes técnicos, a consultora Boston Consulting da qual vieram João Conceição, Ricardo Ferreira, mas também Miguel Barreto.

Durante a audição na comissão parlamentar de inquérito às rendas excessivas da eletricidade, Miguel Barreto começou por sublinhar: “Quero deixar claro que não favoreci interesses particulares, mas sim o interesse do Estado e dos consumidores. Como diretor-geral sempre tive postura técnica”. Para ex-diretor-geral, a certificação energética, atividade que avalia a eficiência dos sistemas de fornecimento de energia em residências e outras instalações, não é do setor elétrico, será mais do imobiliário.

Miguel Barreto recordou que tinha 40% do capital da uma empresa de certificação energética, a Home Energy, na qual o acionista maioritário era a Martifer. Diz que a EDP abordou a Martifer para comprar a empresa, numa altura em que este grupo estava em reestruturação e decide vender. Recordou que havia um acordo parassocial com uma cláusula de “tag along”, ou seja, tinha a opção de vender a sua posição se o maior acionista também o fizesse.

Barreto descreveu a Home Energy como a empresa líder na certificação energética, com uma faturação de oito milhões de euros e mais de 100 colaboradores e garantiu: “Não foi uma negociação fácil”. E contou que o preço de quatro milhões de euros, acabou por baixar para 3,4 milhões de euros. E a EDP ainda conseguiu reduzir mais 150 mil euros. O Observador revelou que o encaixe recebido pelo antigo-diretor geral com esta venda foi transferido para uma conta na Suíça, o que suscitou uma investigação por parte das autoridades daquele país. Isto porque Miguel Barreto é um dos visados na investigação da justiça portuguesa à suspeita de decisões de vários governos que terão favorecido a EDP, em particular relacionadas com os custos de manutenção do equilíbrio contratual (CMEC), que tem sido associados às rendas excessivas do setor elétrico.

O antigo diretor-geral referiu ainda a existência de uma cláusula de não concorrência de cinco anos para si, que o impedia de trabalhar numa empresa concorrente. E até admitiu “Houve uma certa vontade de me tirar do mercado”. E numa resposta posterior admitiu que a EDP pode ter querido comprar a Home Energy para poder fornecer os serviços adicionais de auditoria e certificação energética que estão incluídos nas ofertas no mercado liberalizado.

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