Assim fossem todas as semanas e a Seleção Nacional pouco mais poderia pedir: depois do triunfo por 1-0 com a Itália no mês passado, a equipa de Fernando Santos venceu na Polónia por 3-2 na segunda jornada da Liga das Nações, aproveitou um particular bem conseguido com a Escócia para fazer algumas (boas) experiências em mais um triunfo (3-1) e ficou muito perto de, mesmo não jogando, garantir já a passagem à fase final da nova prova de seleções da UEFA. No entanto, nos descontos, a Itália ganhou em Chorzow por 1-0. Houve uma festa como se fosse a final de uma grande competição. Percebe-se porquê. E com direito a uma homenagem muito particular e emotiva a Davide Astori, central da Fiorentina que faleceu em março.

Recuemos a novembro de 2017: três dias depois de uma inesperada (e injusta, se é que isso existe no futebol) derrota na Suécia com um golo de Johansson, o San Siro encheu para a segunda mão do playoff de qualificação para o Campeonato do Mundo e para aquele que deveria ser um dia de festa. Não foi. Os escandinavos defenderam a sua baliza a todo o custo, naquele típico jogo de superação onde entre carrinhos, bolas salvas in extremis e alguma dose de fortuna à mistura, tudo serviu para agarrar o nulo. 60 anos depois, a Itália estava fora do Mundial. Buffon, um dos grandes símbolos da ex-campeã mundial, saiu em lágrimas.

Buffon chorou, pediu desculpa e disse adeus. Mas antes deixou (mais) dois grandes exemplos

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Após a vitória na Alemanha em 2006, os italianos foram alternando fases finais mais conseguidas (como a do Europeu de 2012, onde só foram goleados na final com a Espanha) com outras menos famosas. A presença nas grandes qualificações, essa, estava sempre garantida. Neste caso, falhou. E atirou a Federação Italiana de Futebol para uma crise que ainda hoje se sente – depois da saída do presidente Carlo Tavecchio, a primeira eleição para encontrar o seu sucessor, com dois candidatos, teve um total de 60% de votos em branco, e subiu à liderança interina uma comissão nomeada pelo Comité Olímpico Italiano. Daqui a uma semana, haverá de novo eleições. Com mais dúvidas do que certezas em relação a um nome suficientemente agregador.

Em termos de seleção A, Giampiero Ventura saiu logo nessa semana do comando da squadra azzurra, Di Biagio foi chamado para orientar dois particulares em março (0-2 com a Argentina, 1-1 com Inglaterra) e, em maio, Roberto Mancini, ex-treinador do Zenit, foi chamado para o início de uma nova era pelo menos dentro dos relvados. Uma era que continuava adiada: depois da vitória por 2-1 com a Arábia Saudita, a Itália somou um total de cinco encontros consecutivos sem triunfos entre Liga das Nações e amigáveis. Mal menor, conseguiu evitar o pior registo de sempre, que aconteceu há quase 100 anos (1923 e 1924).

Mancini estreou-se com um triunfo com a Arábia Saudita antes de uma série de cinco jogos sem vencer (Claudio Villa/Getty Images)

É certo que a Serie A tem vindo a crescer – e a contratação de Cristiano Ronaldo este ano pela Juventus foi uma espécie de cereja no topo do bolo na revitalização do campeonato contra as dominadores Premier League, La Liga e Bundesliga – e que os resultados nas competições europeias são bons para o ranking da UEFA (ainda em 2017/18 entraram duas equipas nos quatros e uma nas meias da Champions, mais uma nos quartos da Liga Europa) mas tudo o resto, em termos nacionais, constitui uma verdadeira incógnita, ao ponto de Bonucci, uma das principais referências da equipa e da Juve, ter pedido “uma reforma séria”: “Estávamos no zero há um ano mas, desde aí, nada mudou. Acho que agora está pior. Dou um exemplo: estamos a meio de outubro e a equipa da minha cidade, o Viterbese, não fez um único jogo. Não é normal. É preciso uma reforma total”.

Falta de vontade dos jogadores ou da equipa técnica parece não haver, como se percebeu na Polónia. Aliás, no limite a grande diferença em relação ao conjunto transalpino que nos habituámos a conhecer e o atual tinha mesmo a ver com a falta daquele avançado que, tocando mais ou menos na bola ao longo do encontro, surgia de forma decisiva quando era preciso para garantir vitórias pela margem mínima quando a exibição não chegava para mais. Esta noite, jogou-se muito e marcou-se quase nada. Até ao momento caído do céu em que, após canto, Lasagna desviou ao primeiro poste e o lateral Biraghi marcou.

Federico Chiesa assistiu, rematou e jogou mas nunca conseguiu chegar ao golo até ao “milagre” de Biraghi (Claudio Villa/Getty Images)

Jorginho, após uma combinação com Verratti e Insigne, acertou na trave logo no primeiro minuto. Pouco depois, após mais uma boa jogada coletiva, o chapéu de Insigne já dentro da área saiu demasiado por cima da trave do conjunto polaco (8′). A equipa de Mancini explorou tanto ou mais do que Portugal os erros de uma Polónia em renovação que, enquanto não se reencontra com uma matriz de jogo, continua a deixar isolado na frente um dos melhores avançados da atualidade (Lewandowski). Conseguiu até ser mais pressionante, rápida e incisiva no último terço. Faltava o golo, entre a pontaria a mais e Szczęsny.

Insigne, a grande referência da equipa no ataque, voltou a acertar na trave após mais uma assistência de Chiesa (mais uma grande exibição do filho de Enrico Chiesa) à passagem da meia hora, antes de começar o festival do guarda-redes polaco da Juventus com intervenções providenciais a remates de Jorginho no seguimento de uma grande jogada individual; de Chiellini, na sequência de uma bola parada; e de Florenzi, depois de mais uma grande combinação já na área. Ao intervalo, o nulo era um castigo pesado para a melhor equipa em campo perante uma Polónia que pouco ou nada fez no ataque.

Quando Portugal joga o que sabe, todos os Silvas são felizes (a crónica da vitória da Seleção na Polónia)

As entradas de Grosicki e Błaszczykowski no início da segunda parte melhoraram de forma ligeira o rendimento dos polacos, que conseguiram chegar por duas/três ocasiões com perigo à baliza de Donnarumma. Todavia, foi a Itália que continuou a dominar, a tentar o golo através de Chiesa, Bernardeschi e Insigne, mesmo com uma quebra de discernimento com o passar dos minutos e das oportunidades falhadas até que, nos descontos, Biraghi conseguiu mesmo quebrar a “malapata” e fazer o 1-0 final. Foi a loucura entre os jogadores que estavam em campo, houve invasão de todos os elementos que estavam no banco, incluindo Roberto Mancini que festejou bem à frente da sua zona técnica. Este era apenas mais um jogo da Liga das Nações mas, no atual contexto, percebe-se que tenha sido celebrado como se de uma final de uma grande prova se tratasse.

Mais do que um triunfo, esta foi também uma oportunidade para Biraghi dedicar o golo a Davide Astori, antigo companheiro da Fiorentina que faleceu em março, fazendo o número 13 com os dedos em sua memória. “Se estou aqui também é graças a ele, às palavras dele. É uma parte de mim e de todos os que tivemos sorte de jogar com ele”, comentou.

Morreu Davide Astori, capitão da Fiorentina. Foi encontrado morto no quarto de hotel