Aproveitando a deslocação do FC Porto a Trás-os-Montes, Pinto da Costa, presidente dos dragões, foi recebido na Câmara de Vila Real. Não deixou de enviar uma mensagem que pode ou não ser interpretada como uma “farpa” para a realidade dos rivais mais diretos, Benfica e Sporting, a propósito do local onde se disputam os jogos da terceira eliminatória da Taça de Portugal (“Jogar em Guimarães ou em Penafiel já não era uma festa, era apenas um jogo de futebol. Entendemos que estes jogos devem ser uma festa em casa do nosso companheiro de jogo. Ninguém faz uma festa se for fora de casa, não tem o mesmo significado do que receber os amigos em casa”, destacou), mas sublinhou sobretudo uma ideia – hoje era um dia de festa.

Era um dia de festa para as gentes de Vila Real, mesmo que muitas estivessem de coração dividido como se percebeu nos diretos que os canais televisivos iam fazendo e onde até familiares dos visitados assumiam que tinha sido uma semana especial e que iam apoiar a equipa da casa apesar do sentimento estranho de, com isso, torcerem contra o “outro” clube do coração. Era um dia de festa para os adeptos azuis e brancos em Trás-os-Montes, que esgotaram num ápice os cerca de 4.200 bilhetes do pequeno Complexo Desportivo do Monte da Forca. Era um dia de festa para uma das figuras mais simbólicas do universo do FC Porto, Maria Amélia Canossa, a “Princesa da Rádio” que deu voz ao hino do clube, que recentemente marcou presença na festa que juntou cerca de 200 mil pessoas na Invicta após a conquista do Campeonato e que fez hoje anos. E era um dia de festa, claro está, para os dirigentes do clube da casa. Que também tiveram as suas (boas) dores de cabeça.

FC Porto goleia em Vila Real (6-0) no arranque da Taça de Portugal com poker de Adrián López

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Depois do sorteio, o FC Porto manifestou total abertura para realizar o jogo no Monte da Forca e alguns técnicos foram mesmo ajudar para que o relvado estivesse nas melhores condições possíveis. Em paralelo, os dragões abdicaram da percentagem de receita a que teriam direito por regulamento da competição. Ah, e ainda havia os 50 mil euros pelos direitos televisivos. Mas ao mesmo tempo seriam necessários geradores e seis torres de iluminação para garantir a realização do jogo à noite. E um reforço do dispositivo policial, que por norma costuma cingir-se ao mínimos dos mínimos (150 euros). Deve ser receita recorde mas ninguém sabia ao certo quanto face ao aumento das despesas para o que é habitual. E também ninguém estava muito preocupado com isso – era dia de festa e histórico, com a primeira transmissão em direto de um jogo do Vila Real.

Na entrada das equipas, Patrick Canto, técnico do Vila Real, aproveitou para dar um forte abraço a Sérgio Conceição, um dos homólogos com quem mais se identifica, enquanto os jogadores do conjunto visitado fizeram questão de ir junto à bancada onde estava o capitão Fred, ausente por castigo, mostrar o apoio a alguém que, tanto ou mais do que eles, gostava de estar no relvado. Como dizia o treinador dos transmontanos ao longo da semana, “o futebol ensina-nos a sonhar” e, por mais que houvesse noção das distâncias entre o atual campeão e uma formação dos Distritais, existe sempre aquela esperança de quebrar o favoritismo do mais forte. Um sonho que, em 15 minutos, esfumou-se e virou um pesadelo. Mas também houve um pesadelo que, em 15 minutos, se tornou quase um sonho. E, quem sabe, poderá mesmo ter feito Pinto da Costa repensar a palavra “nunca”.

Pinto da Costa recandidata-se à presidência do FC Porto. E diz que Peseiro ficará mesmo que não seja campeão

Ficha de jogo

Mostrar Esconder

Vila Real-FC Porto, 0-6

3.ª eliminatória da Taça de Portugal

Complexo Desportivo do Monte da Forca, em Vila Real

Árbitro: António Nobre (AF Leiria)

Vila Real: Murta; Zé Diogo, Raul Babo, Edu, Solas; Mika, Dioguinho, Zé Pedro; André Sampaio (Zé Carvalho, 55′), Diogo Paixão (Tiago Mourão, 55′) e Rui Sampaio (Gil Pinto, 67′)

Suplentes não utilizados: Francisco Miranda, Luisinho, Rodrigo e Fábio Carvalho

Treinador: Patrick Canto

FC Porto: Fabiano; João Pedro, Felipe, Militão, Jorge; Herrera (Corona, 63′), Bazoer, Óliver Torres; Adrián López (Sérgio Oliveira, 72′), André Pereira (Marius, 63′) e Soares

Suplentes não utilizados: Vaná, Alex Telles, Diogo Leite e Brahimi

Treinador: Sérgio Conceição

Golos: Adrián López (7′, 14′, 45′ e 66′), Soares (49′) e André Pereira (61′)

Ação disciplinar: cartão amarelo a Óliver Torres (42′); cartão vermelho direto a Raul Babo (44′)

Expliquemos: numa entrevista ao Porto Canal duas semanas depois da saída de Julen Lepetegui, em janeiro de 2016, o presidente dos dragões contou alguns detalhes da chegada do antigo avançado do Atl. Madrid (que na época anterior tinha ido à final da Liga dos Campeões, depois de ter sido campeão) e deixou críticas ao que na realidade viria a acontecer. “Quando o treinador veio, compreendo que, não conhecendo bem o futebol português, tentasse basear-se em jogadores espanhóis, que conhecia bem. Entrei em contacto com o Atl. Madrid, era um preço exorbitante e disse-lhe que não. Entretanto, o empresário apresentou uma solução que foi a seguinte: aceitámos letras dos 11 milhões de euros todas para um ano depois e disse-me que não tivéssemos problemas que mesmo que não quiséssemos pagá-lo, ele colocava o jogador. Não tínhamos nenhum risco só que o tempo foi passando, o empresário não o colocou e quando vieram as letras nós é que as tivemos de pagar. Negócios destes nunca mais faço”, destacou. Em 29 jogos de azul e branco entre empréstimos ao Villarreal e ao Deportivo, Adrián López apontou apenas um golo; esta noite, mesmo saindo aos 72′, marcou um poker. E deu razão a Sérgio Conceição.

“O Adrián López tem feito com que seja uma aposta porque trabalha de forma muito séria e dá-nos coisas diferentes dos outros avançados que temos. Fiquei triste por não ter feito golo, acho que merecia. Conhecia-o de outros clubes, agora tenho o prazer de o treinar. Da forma como está a trabalhar agora, tem lugar no plantel. Sem dúvida nenhuma”, disse o técnico em agosto, quando foi suplente utilizado no encontro da primeira jornada do Campeonato com o Desp. Chaves (5-0). Depois, só voltou a jogar na receção aos flavienses para a Taça da Liga; na estreia na Taça de Portugal, brilhou em Trás-os-Montes.

Com alterações em todos os setores mas a manutenção de alguns habituais titulares como Felipe, Éder Militão ou Herrera (que manteve a braçadeira de capitão), o encontro acabou por ficar escrito em menos de 15 minutos, o tempo suficiente para Adrián López, nos dois primeiros remates que fez, apontar outros tantos golos: aos 7′, André Pereira recuperou uma bola na primeira fase de construção do Vila Real, deixou em Óliver Torres que fez a assistência e o avançado, de primeira, rematou em arco para o 1-0; aos 14′, na sequência de um cruzamento de João Pedro que viu o corte da defesa transmontana bater em André Pereira, o espanhol aproveitou uma bola a pingar na área e rematou de primeira para o 2-0. Os visitados tiveram sempre uma atitude positiva no jogo, procurando jogar com bola, mas dois erros acabaram por deitar qualquer sonho por terra.

Soares também andava de forma desenfreada à procura do golo, mas as intenções do brasileiro iam sendo paradas por Murta, que esteve em destaque aos 17′ e sobretudo aos 42′, com uma defesa milagrosa para canto numa situação de 1×1. Com o FC Porto a dominar por completo, por vezes com a unidade mais recuada (Felipe) a meio do meio-campo adversário, Bazoer foi tentando brilhar nas movimentações de fora para dentro começando na ala direita e proporcionando a subida pelo corredor de João Pedro (Jorge esteve mais discreto nesse particular) mas a noite era mesmo de Adrián López, que num livre direto que tinha valido um vermelho direto ao central Raul Babo – por derrubar Bazoer quando ia isolado para a baliza –, apontou o 3-0 aos 45′.

No segundo tempo, o jogo que tinha pouca ou nenhuma história acrescentou ainda mais três golos às contas finais: primeiro foi Soares, no seguimento de uma fantástica jogada de Óliver Torres a deixar pelo caminho vários adversários antes de isolar o brasileiro na área para o remate cruzado (49′); depois foi André Pereira, a desviar ao primeiro poste um cruzamento rasteiro de João Pedro após ganhar a linha pela direita (61′); por fim foi de novo Adrián López, a fazer a recarga na pequena área depois de um primeiro cabeceamento de Soares para defesa de Murta (66′). O brasileiro teria ainda uma bola no poste entre muitas outras oportunidades para os dragões, mas o momento da noite seria mesmo o da substituição do avançado espanhol (que pareceu apresentar algumas queixas na perna), com todo o banco de pé a aplaudir a prestação do jogador de 30 anos. Mesmo sendo uma partida contra um adversário dos Distritais, o FC Porto foi humilde, teve respeito, manteve a atitude e chegou com facilidade ao 6-0 final no dia em que, mais do que um jogo, pode também ter ganho (ou recuperado) um jogador.