Leonardo Da Vinci podia ser estrábico. A conclusão é de um estudo de Christopher Tyler, especialista em neuro-ciência visual e professor na Universidade City de Londres e no Smith-Kettlewell Eye Research Institute em São Francisco, publicado esta quinta-feira no JAMA Ophthalmology, um jornal especialista na área da medicina.

Através da análise pormenorizada de seis retratos e autorretratos pintados pelo renascentista (duas esculturas, duas pinturas a óleo e dois desenhos), tendo em conta a posição dos olhos de cada pintura e medindo as suas posições, o neurocientista britânico chegou à conclusão de que o artista italiano sofreria de estrabismo divergente. O desvio, segundo Tyler, seria no olho esquerdo e teria um ângulo de -10,3º.  Os quadros onde é mais evidente esse desvio são o de São João Batista (pintado em 1508-1513) e o de Salvador Mundi, que há pouco tempo se tornou a obra mais cara da história.

A doença, que afeta apenas 1% da população mundial, associa-se geralmente a uma boa visão estereoscópica quando os olhos estão alinhados, mas é perdida quando o olho se desvia. As pessoas que sofrem deste distúrbio caracterizam-se pela incapacidade parcial ou total de manter o alinhamento do olho no objeto – alvo de fixação –  e, consequentemente, possuem uma visão monocular bidimensional.  Esse facto poderia fazê-lo desenvolver uma forte compreensão dos objetos tridimensionais, facilitando a representação de profundidade nas superfícies planas. Podia também influenciar o sombreamento preciso pelo qual o artista é conhecido.

De acordo com as conclusões publicadas, ”o peso da evidência leva a sugerir que Da Vinci tinha exotropia intermitente, resultando na capacidade de mudar a visão ocular, o que talvez explicaria a sua grande facilidade em descrever a solidez tridimensional de faces e objetos no mundo e a profundidade distante”.

Contudo, para muitos cientistas é precipitado tirar conclusões. Michael F. Marmor, professor de oftalmologia e biologia humana na Universidade de Stanford, nos Estados Unidos, afirma que ”este tipo de diagnóstico retrospetivo é arriscado”, conta ao jornal El País.  ”Primeiro é duvidoso que estas obras representem Da Vinci. A relação entre estes trabalhos é muito circunstancial e duvidosa e todas as caras parecem diferentes”, acrescenta.

O professor descarta também a hipótese do estrabismo fornecer características especiais a Da Vinci. ”Nós que temos uma visão normal não temos problemas em ver as imagens em duas dimensões e os artistas com uma boa perceção da profundidade tão pouco as têm para pintar. Os artistas estrábicos que se conhecem, como Durero, Barbieri, Il Guercino, pintaram obras maravilhosas com uma perspetiva fina”, explica ao mesmo jornal.

À CNN, Julius Oatts, professor assistente no Departamento de Oftalmologia da Universidade da Califórnia, considera que ”há inúmeras incertezas se as imagens realmente descrevem o próprio Da Vinci ou se elas [as imagens] retratam os olhos de uma forma realista”, aludindo à teoria de Tyler de que apesar de nem todos os trabalhos do pintor italiano serem autorretratos, todos refletem a aparência do pintor.

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