O atual primeiro-ministro são-tomense, Patrice Trovoada, considerou esta sexta-feira que o Tribunal Constitucional apreciou os votos das legislativas de 07 de outubro sob “uma pressão jamais vista”, mas garantiu que o seu partido, vencedor das eleições, não vai contestar os resultados.

“Consideramos que este processo foi particular. As coisas começaram bem e acabaram mal”, comentou, em entrevista à Lusa, em Lisboa, o governante e líder da Ação Democrática Independente (ADI), que venceu as eleições com maioria simples (25 em 55 deputados).

Dois dias após as eleições, o ADI acusou a oposição de ter praticado “fraude eleitoral” e pediu ao Tribunal Constitucional a verificação dos mais de 2.000 votos nulos e brancos, superior à diferença de votos expressos (cerca de 1.200) entre a ADI e o líder da oposição, Movimento de Libertação de São Tomé e Príncipe – Partido Social Democrata (MLSTP-PSD).

“O Tribunal Constitucional, os magistrados, a partir do momento em que começámos o apuramento geral, estiveram debaixo de uma pressão jamais vista, muita violência, muitas ameaças, uma atitude que tirou tranquilidade e credibilidade ao trabalho dos juízes-conselheiros, que, no caso dos votos nulos é um trabalho de apreciação”, considerou Patrice Trovoada.

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Os juízes, disse, “estavam a trabalhar debaixo de ameaças e insultos, pneus que estavam lá prontos a serem incendiados, caixotes de lixo, grupos organizados de delinquentes, e com uma grande promiscuidade, com a presença de líderes políticos da oposição”, referiu.

Nos últimos dias, dezenas de pessoas mantiveram-se junto ao edifício do Tribunal Constitucional, na capital são-tomense, num ato que, para o chefe do Governo, “a oposição fomentou, organizou, responsabilizou-se”.

“Não se pode falar de um apuramento que foi feito em condições ideais, de liberdade, de transparência”, referiu.

No entanto, o ADI não vai contestar os resultados: “O país tem de seguir para a frente”, justificou.

No dia seguinte às eleições, uma concentração contra a alegada recontagem de votos na comissão eleitoral do distrito de Água Grande originou tumultos e obrigou à intervenção da Polícia de Estado (‘ninjas’), que recorreu a tiros, granadas de fumo e gás lacrimogéneo para dispersar os manifestantes, que responderam atirando pedras e garrafas de vidro. Na altura, a ADI e o Governo responsabilizaram a oposição sobre os incidentes.

“Ao longo dos dias, estivemos a observar as pessoas que estavam a participar nesses atos de violência. O país é pequeno. Notámos distintamente dois grupos: um grupo de delinquentes, que nós todos conhecemos, e depois pessoas ligadas à cúpula da direção dos partidos [da oposição] e os seus amigos e familiares. Não sentimos o povo na rua. [Eram] sobretudo, militantes muito próximos da cúpula, não militantes de base”, afirmou hoje Patrice Trovoada à Lusa.

Para o líder da ADI, trata-se da “manifestação de um grupo de pessoas que, por uma razão ou outra, se sentiram excluídas do poder, e reclamam, de facto, o poder”.

“O ADI tem uma preocupação de governar São Tomé e Príncipe, a oposição tem uma preocupação de chegar ao poder”, criticou.

Patrice Trovoada considerou que “se o ADI tivesse perseguido o povo são-tomense, veríamos o povo na rua”, mas “não há”.

“Isso é o fruto de um país em que tudo e todos dependem extremamente do aparelho público, do Estado, e quando se perde o poder, se perdem as posições no Estado, não se tem muito por onde virar, então essa necessidade de se ter o poder”, comentou.

O governante instou os políticos a “olhar para a realidade”.

“Não temos uma população na rua, temos uma população que votou, mandou um sinal e está a observar a classe política. Não se envolveu nas violências, ficou surpreendida, e olha para aquilo como sendo um confronto entre os políticos”, disse.

Patrice Trovoada deixa ainda um aviso: “Uma vez passado o confronto entre os políticos, o povo quer pão, água, luz, salários pagos. Se [os políticos] não compreenderem isso, aí sim, o povo irá manifestar-se, de uma maneira ou de outra”.