Na teoria, aquilo que deveria acontecer era emoção até à última volta. E foi isso mesmo que aconteceu. No entanto, chegou a dar a ideia de que poderia ter ficado resumido à primeira. Porque se é verdade que Lewis Hamilton, que conquistara a pole position no Grande Prémio dos Estados Unidos, acabou por ser surpreendido com a saída de Kimi Räikkönen, Vettel acabou por cair para a 14.ª posição quando tentava subir a quarto. Pelo meio, ainda houve um super Verstappen para baralhar ainda mais as contas. No final, as decisões do título ficaram adiadas pelo menos mais uma semana, para o México. Mas houve mais.

O alemão da Ferrari começou melhor com dois triunfos na Austrália e no Bahrein, mas com o passar das provas o Mercedes de Lewis Hamilton voltou a subir, passou para a liderança e solidificou esse posto com seis vitórias nas últimas sete corridas antes dos Estados Unidos (ganhou na Alemanha, na Hungria, em Itália, em Singapura, na Rússia e no Japão, com um segundo lugar na Bélgica pelo meio). Como em qualquer título, a equipa, o carro e o diretor também têm uma quota parte grande do sucesso mas o britânico que dava nas vistas pelas ultrapassagens arriscadas nos primeiros tempos de Fórmula 1 amadureceu. Não aconteceu, por exemplo, o que tinha ocorrido no México no ano passado, quando garantiu o tetracampeonato.

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Quando Räikkönen arriscou tudo para ultrapassar pela esquerda, Hamilton ainda pareceu ter a tentação de fechar a intenção mas acabou por alargar ligeiramente a trajetória para evitar qualquer tipo de toque que pudesse condicionar as 56 voltas que teria pela frente. E por outra razão: por muito que tivesse elogiado o desempenho dos Ferrari neste fim de semana, o britânico sabia que podia ter o andamento suficiente para ultrapassar o finlandês, em pista ou na guerra das boxes.

Ao invés, Vettel, que partira da quinta posição depois de ter sido sancionado com uma penalização de três lugares por redução insuficiente de velocidade em situação de bandeira vermelha na primeira sessão de treinos livres nos Estados Unidos, quis forçar a ultrapassagem ao Red Bull de Daniel Riccardo para poder iniciar o mais cedo possível o duelo com Valtteri Bottas, número 2 da Mercedes. Conseguiu subir à quarta posição, foi de novo surpreendido pelo australiano e arriscou em demasia numa nova investida. Resultado? Fez um pião, baixou para o 15.º posto atrás do Toro Rosso e andou a “desgatar-se” durante metade da corrida para chegar de novo à luta pelos lugares do pódio que pudessem adiar a questão do título.

À nona volta, Daniel Ricciardo abandonou mesmo a corrida; à 12.ª volta, Hamilton quis antecipar-se às táticas que se poderiam seguir e foi às boxes colocar pneus macios numa opção que o tempo mostrou ser acertada (também porque Bottas cedeu de novo a sua posição para poder aproximar-se do Ferrari na frente); à 17.ª volta, estava tudo em aberto mas o britânico, ao ocupar o segundo lugar, chegava aos oito pontos de vantagem necessários para ser campeão devido ao quinto posto de Vettel, que rodava a cerca de cinco segundos do Red Bull de Max Verstappen, o grande beneficiado de toda a confusão que se gerou na primeira volta e que levou também à desistência de Romain Grosjean e Fernando Alonso (além do hipotecar completo da corrida por parte de mais dois pilotos, Charles Leclerc e Lance Stroll).

Durante duas voltas e até Räikkönen sair para as boxes, o britânico ainda se foi mostrando ao finlandês, que se foi defendendo da melhor forma, mas com risco quase nulo de poder haver qualquer colisão que lhe hipotecasse a corrida. Quando assumiu por fim o primeiro lugar, Hamilton tinha cerca de dois segundos e meio de vantagem sobre o companheiro Bottas, que ainda não tinha realizado qualquer paragem. Pelos tempos, sabia que a segunda metade da corrida teria os Ferrari por perto. Quando acabou a dança das passagens pelas boxes, Vettel voltava ao quinto lugar com uma única surpresa – Verstappen não só passara Bottas como mantinha um ritmo de corrida que tornava complicado o piloto da Mercedes “encostar”.

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Entre a 37.ª e a 38.ª volta, Hamilton voltou a ir às boxes, conforme esperado. Foi uma paragem supersónica mas que abriu de novo a emoção em torno da questão do título já nos Estados Unidos porque Räikkönen e Verstappen estavam na frente. Daí para a frente, emoção até ao fim: o holandês aproximava-se do finlandês, o britânico aproximava-se do holandês e, um pouco atrás, Vettel continuava a ganhar tempo a Bottas para um ataque final. As decisões ficaram para as últimas voltas e tiveram o final oposto ao que era necessário para haver campeão já este fim de semana: Hamilton ainda passou Verstappen mas teve uma saída de curva mais larga e acabou mesmo no terceiro lugar; Vettel encostou em Bottas e viu o finlandês alargar a trajetória, saltando para o quarto lugar. A questão do título ficava definitivamente adiada pelo menos mais uma semana.

Assim, e num dia em que todas as atenções estavam centradas em Hamilton e Vettel, o palco principal pertenceu aos artistas secundários (com todo o mérito, acrescente-se): por um lado, Kimi Räikkönen voltou a vencer um Grande Prémio 113 provas depois (o último triunfo tinha sido na Austrália, em 2013) com a virtude de ter não só arrancado uma fantástica largada mas também de adotar a estratégia de paragens mais acertada; por outro, Max Verstappen saltou do 18.º lugar para segundo com uma corrida quase perfeita, mostrando-se intransponível quando o britânico deu tudo a duas voltas do fim.