Foi no verão de 1888, há 130 anos, que a Livraria Chardron (que depois se veio a chamar Livraria Lello) do Porto publicou, em dois volumes, o romance que tornaria Eça de Queiroz célebre: Os Maias. De modo a assinalar a data, têm sido levadas a cabo várias iniciativas, às quais se vai juntar no próximo mês de novembro uma exposição organizada na Fundação Calouste Gulbenkian, em Lisboa — “Tudo o que tenho no saco”. Eça e Os Maias.
O nome foi retirado de uma carta enviada por Eça a Ramalho Ortigão, a 20 de fevereiro de 1881, a partir de Bristol. Nesta, o escritor anunciava que Os Maias estavam praticamente concluídos e que tinha decidido “fazer não só um ‘romance’, mas um romance em que pusesse tudo o que” tinha “no saco”.
A exposição será composta por sete núcleos, com uma secção principal dedicada à “vasta máquina” que são Os Maias, como lhes chamou o próprio Eça de Queiroz. O segundo núcleo irá percorrer a vida e as aprendizagens do escritor antes da publicação do romance “com proporções enfadonhamente monumentais de pintura a fresco”, desde a passagem pela universidade de Coimbra, até à viagem de turista pelo Oriente, passando pelas suas estadias em Lisboa — fundamentais na sua formação literária e ideológica –, pela sua experiência jornalística em Évora e como funcionário em Leiria.
“Guerra ao romantismo” é o mote para o terceiro núcleo, que irá explicar como um autor educado no culto do Romantismo se converteu ao Realismo, dando-lhe corpo em Os Maias através da personagem de Alencar, poeta de valores românticos, que se torna alvo de toda a ironia de Eça. No quarto núcleo, onde irão ficar expostas algumas das pinturas que Paula Rego fez para uma série dedicada a O Crime do Padre Amaro”, irá fazer-se um apelo à reflexão e ao caráter moralizador da obra de Eça, cujos livros foram acusados de serem imorais.
“Olhares cruzados” é o quinto núcleo da exposição, e explora a forma como Eça fugia da objetividade do Realismo para apresentar vários olhares sobre a mesma realidade: ironia, sonho, caricatura e excesso. A busca permanente do autor pela perfeição na arte, que o levou a proclamar “a arte é tudo — tudo o resto é nada”, e que se espelha nas toilettes dândi de muitas das suas personagens, é mote para o penúltimo núcleo da mostra. O último espaço irá percorrer a geografia biográfica e ficcional de Eça de Queirós, da América do Norte ao Próximo Oriente, do Douro ao Alentejo, deixando, contudo, claro que Portugal era o lugar que estava no seu coração e no centro das suas preocupações.
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A mostra, que irá abordar a vida e também as restantes obras do autor, terá um pouco de tudo, desde fotografias a desenhos, passando por gravuras, caricatura, pintura, escultura, fotogramas e excertos de filmes, contos, romances, cartas e documentos bibliográficos, revelou ao Observador fonte oficial da fundação.
Entre as peças pessoais de Eça de Queiroz, que poderão ser vistas pelo público, irão contar-se a secretária pessoal do escritor, o tinteiro em latão, a palmatória de iluminação, a estante giratória e a cabaia chinesa (vestuário de mangas largas usado na China), que lhe foi oferecida pelo Conde de Arnoso. Além das pinturas de Paula Rego, a mostra irá ter obras de Júlio Pomar, João Abel Manta, Raphael Bordallo Pinheiro, Raquel Roque Gameiro, Bernardo Marques, Manoel de Oliveira, João Botelho, entre outras, alusivas ao autor.
“Tudo o que tenho no saco”. Eça e Os Maias abrirá portas no dia 30 de novembro, mantendo-se na Gulbenkian até 18 de fevereiro de 2019.
Artigo atualizado a 23 de novembro com uma descrição mais pormenorizada da exposição