Uma das medidas propostas no Orçamento do Estado para 2019 (OE2019) prevê um novo regime para os ex-residentes que queiram voltar a Portugal e que isenta 50% dos seus rendimentos em sede de IRS. O ‘Programa Regressar’, assim se chama o regime proposto, foi pensado para incentivar o regresso de emigrantes ao país (e que tenham saído forçados pelo período de crise) reduzindo a tributação de IRS de que são alvo a partir de 2019 ou 2020.

A medida, contudo, parece levantar dúvidas sobre a sua constitucionalidade. De acordo com vários especialistas ouvidos pelo Jornal de Negócios, pode estar em causa o princípio da igualdade. É o que questiona, por exemplo, Maria d’Oliveira Martins, professora de Direito Constitucional na Universidade Católica, para quem que este benefício fiscal pode violar o princípio da igualdade quando quase não existe um fundamento relevante para o justificar.

“O legislador devia ser prudente na fundamentação das medidas. Não se impede que haja discriminações. O que se exige é que haja fundamentação razoável, atendível, para eu dizer que essa [distinção] não é arbitrária. Neste caso não encontro razão suficiente e por isso só posso dizer que é arbitrária”, explica. 

A alternativa, sugere a constitucionalista, seria o regime aplicar-se a quem não viveu no país entre 2011 e 2014 (período mais agudo da crise económica) e não nos três anos anteriores ao regresso. A proposta, recorde-se, exclui de tributação de IRS 50% dos rendimentos de todos os sujeitos passivos que se tornem fiscalmente residentes em Portugal em 2019 ou 2020, desde que não tenham sido residentes em território português nos três anos anteriores, mas que tenham vivido no país antes de 31 de Dezembro de 2015.

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Também o constitucionalista Rodrigo Esteves de Oliveira questiona a constitucionalidade deste bónus. “A capacidade contributiva de residentes e ex-residentes, que é o critério nuclear da igualdade para efeitos fiscais, é igual num caso e noutro”, e por isso não devia existir diferença, considera o professor da Universidade de Coimbra.”

Além disso, a isenção de 50% é uma diferença substancial entre contribuintes, o que também pode ser difícil de enquadrar a nível constitucional”, defende Rodrigo Esteves de Oliveira.

Outro constitucionalista, Luís Pereira Coutinho, acredita que esta distinção entre cidadãos (os que ficaram em Portugal no período de crise e os que saíram) pode ser inconstitucional à luz do princípio da igualdade, que estabelece que todos os cidadãos são iguais perante a lei. E também não encontra “fundamento relevante” para a diferenciação fiscal.

“É certo que há uma série de distinções, como benefícios fiscais para pessoas portadoras de deficiência, mas aquelas que conhecemos atendem a necessidades especiais”, afirmou.

Noutra perspetiva, o constitucionalista Jorge Reis Novais, da Universidade de Lisboa, defende que o regime de benesse fiscal , “em termos do objectivo que o Estado tem em vista, é legítimo, compreensível e aceitável, desde que aplicado a todas as pessoas que estejam na mesma situação”.não ver “grande fundamento para considerar a medida inconstitucional”.