Os recentes desenvolvimentos do caso Tancos serviram de pano de fundo para a passagem de Marcelo Rebelo de Sousa pelas instalações do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) em Lisboa. Ao longo da visita, esteve sempre acompanhado pela nova Procuradora-Geral da República e pela Ministra da Justiça. À saída, não fugiu às perguntas dos jornalistas e falou do processo que investiga o desaparecimento de material militar dos paióis de Tancos.

“Não comento processos que estão a correr na Justiça, neste caso sob investigação criminal. O que desejo é que se apure de alto a baixo toda a verdade, doa a quem doer. Pensava isso há um ano e meio e penso exatamente o mesmo agora. Os contornos jurídicos podem ter maior ou menor relevância política, mas os contornos de Direito são fundamentais: perceber o que se passou e perceber quem esteve envolvido”, sintetizou Marcelo Rebelo de Sousa.

Questionado sobre estas suspeitas e sobre o conhecimento que alegadamente teria sobre o caso, Marcelo Rebelo de Sousa foi perentório. “Não sabia e não sei quem furtou, não sabia e não sei o que foi e o que não foi, não sabia e não sei com que destino… Não sabia e não sei”, afirmou. “É evidente que se tivesse sabido alguma coisa sobre estes factos tê-lo-ia comunicado na oportunidade que tive para o fazer quando falei com a Procuradora-Geral da República ou com o Governo”, completou.

Esta quinta-feira ficou a saber-se que o ex-chefe de gabinete de Azeredo Lopes garante que o antigo Ministro da Defesa teve conhecimento do alegado encobrimento do roubo das armas. Voltando a recusar comentar o tema, o Presidente da República repetiu a frase que vem proferindo desde que soube do desaparecimento do material militar. “Quero que se apurem todas as responsabilidades, doa a quem doer“.

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A teia sobre quem sabia o quê tem vindo a adensar-se e as suspeitas já recaem sobre as mais altas instâncias governamentais. Ainda esta quinta-feira o CDS admitiu chamar o primeiro-ministro à Comissão Parlamentar de Inquérito sobre o caso. Já Rui Rio recusou essa hipótese, para já, apesar de admitir a possibilidade de António Costa poder ter tido conhecimento do caso.

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Ladeado por Francisca Van Dunem, exigiu ainda que não se esquecessem as várias fases do processo. “É necessário saber o que se passou nesta fase de que tanto se fala agora como na fase inicial, a do desaparecimento das armas, não vá haver uma ligação entre uma coisa e outra. Não se pode esquecer que houve um princípio e que houve um fim. Não se pode falar só do fim. Tudo o que tem de ser esclarecido deve sê-lo”, apelou.

O Chefe de Estado repetiu sucessivamente que não pode comentar o caso mas avisou que “assim que tiver a oportunidade” para se pronunciar não vai faltar ao compromisso. Mas é preciso esperar que a investigação apresente resultados. “Espero vir a saber um dia como é que foi o desaparecimento das armas e o seu reaparecimento. Os portugueses têm de saber o que se passou. Temos de saber todos, não apenas o Presidente da República”, exigiu.

O caso tem marcado a agenda mediática e política há várias semanas, mas o Chefe de Estado não adianta se já debateu o tema com António Costa. “Não é só em termos de memórias que não tenciono estar a contar as conversas que mantenho com o primeiro-ministro“, respondeu aproveitando para mandar uma farpa a Cavaco Silva, que ontem lançou o segundo volume das suas memórias – Quinta-feira e outros dias. “Seria, aliás, uma narrativa muito longa”, ironizou.

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Sobre a visita em si, Marcelo Rebelo de Sousa sintetizou que serviu para demonstrar que “o Presidente da República continua a apoiar o trabalho que tem sido feito pelo DCIAP”. E deixou ainda a garantia de que Amadeu Guerra, diretor deste departamento judicial, conta com o apoio de Lucília Gago, como a PGR afirmou na sua tomada de posse.

Esta foi a segunda visita de Marcelo Rebelo de Sousa às instalações do DCIAP desde que chegou ao Palácio de Belém. O Chefe de Estado recordou recentemente a primeira visita, que aconteceu em 2016. Há duas semanas, na tomada de posse de Lucília Gago, o Presidente da República recordou essa visita. “Recordarei sempre a imagem que retive da visita ao DCIAP logo em 2016, para testemunhar apoio institucional à missão do MP, imagem essa de salas cheias até ao teto de volumes, milhares e milhares de páginas, como que esmagando os magistrados e especialistas afanosamente trabalhando em processos de maior envergadura”, afirmou.